Educação
Tabata Amaral: “Futuro não será promissor sem mudança drástica no MEC”
“Ele defende o Escola Sem Partido, mas tudo o que ele faz é partidário”, declara a deputada, que cobra mais ação e planejamento do MEC
Coordenadora da Comissão Externa de acompanhamento do Ministério da Educação (MEC) na Câmara (Comex), a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) não poupa críticas ao atual ministro Abraham Weintraub e defende sua saída da pasta.
“Eu diria que a saída de um ministro da Educação é ruim porque as políticas educacionais podem perder continuidade. Mas, no caso do atual, não há o que ser descontinuado porque não houve implementação efetiva de nenhum programa”, disse ela, em entrevista exclusiva à CartaCapital.
O documento produzido pela comissão, que teve relatoria do deputado Felipe Rigoni (PSB-ES), cravou que o MEC encerra o ano com planejamento e gestão abaixo do esperado, além de baixa execução orçamentária. Em 296 páginas, o relatório detalha os principais pontos em que a pasta sucumbiu e lista 12 recomendações para o Legislativo e 53 para o Executivo.
Entre os pontos destacados pelo documento estão a falta de implementação da Política Nacional de Alfabetização, apontada pelo governo como prioridade; a indefinição em torno da Base Nacional Comum Curricular (BNCC); a ausência de uma política de formação de docentes e a inexperiência técnica de agentes em cargos de confiança.
Em entrevista à CartaCapital, Tabata detalha o diagnóstico de paralisação do MEC sob o comando de Weintraub e critica sua postura frente ao principal ministério do governo. “Ele já deixou claro que sua principal preocupação é combater a esquerda, e depois cuidar da educação. Ele defende o Escola Sem Partido, mas tudo o que ele faz é partidário”. Confira a entrevista completa:
CartaCapital: De maneira geral, qual a análise da Comissão Externa sobre o Ministério da Educação?
Tabata Amaral: A Comex teve uma abordagem muito técnica. Não nos preocupamos em debater ideologia, mas sim em verificar se o governo teria de fato implementado aquilo que prometeu. Foi, sem dúvida, um ano perdido para a educação. O governo age com força no discurso, mas pouco fez para melhorar a educação no país do ponto de vista prático, que chega aos alunos e professores.
CC: Algum ponto observado pelo relatório pode ser considerado mais grave? Qual?
TA: Há falhas em todas as áreas observadas pelo relatório, algumas em maior ou menor medida, mas que juntas consolidam um diagnóstico de grande paralisação. O caso da alfabetização é especialmente grave porque a Política Nacional de Alfabetização foi a única política de educação incorporada nas metas de 100 dias de governo e, no entanto, não chegou a ser implementada até hoje. O ministério sequer apresentou um plano de ação para articular e informar os entes federativos sobre a aplicação das ações de alfabetização.
CC: Ainda que seja a primeira vez que uma comissão externa avalie o MEC, é possível dizer que, sob a gestão de Bolsonaro, a pasta tem o pior desempenho ou execução de políticas educacionais?
TA: Sim. Em comparação com os últimos dois governos, a atual gestão apresenta o menor número de agentes em cargos de confiança com experiência em instituições acadêmicas, na educação, ou em governo. Além disso, o número de exoneração nos cargos de confiança, flagrantemente superior à gestão anterior, demonstra instabilidade e falta de continuidade na gestão atual.
Enquanto o padrão dos governos anteriores foi de um pico de desonerações no início do governo, voltando à estabilidade em aproximadamente cinco meses, a atual administração direta manteve um alto número de exonerações até o último mês analisado.
Por fim, o percentual da verba descontingenciada executada pelo atual governo foi menor do que o percentual executado pelos governos anteriores. Por exemplo, o governo atual executou somente 4% da sua verba de investimento, enquanto o governo anterior no mesmo período executou 11%.
CC: Como você avalia a conduta do ministro da educação, Abraham Weintraub, frente ao MEC?
TA: Weintraub não se sente responsável pelo que está acontecendo. Ele já deixou claro que sua principal preocupação é combater a esquerda, e depois cuidar da educação. Está mais preocupado em fazer palanque nas redes sociais e causar polêmicas do que fazer a educação avançar. Temos nossas divergências ideológicas e visões de mundo completamente diferentes, mas o mais frustrante é que ele não consegue implementar nada de concreto, mesmo que eu discorde com a solução. Ele defende o Escola Sem Partido, mas tudo o que ele faz é partidário.
CC: Como recebe possíveis rumores sobre a saída de Weintraub do MEC, considerando que seria o segundo ministro da gestão Bolsonaro a deixar o cargo? O que isso significaria para o país?
TA: Eu diria que a saída de um ministro da Educação é ruim porque as políticas educacionais podem perder continuidade. Mas no caso do atual ministro, não há o que ser descontinuado porque não houve implementação efetiva de nenhum programa.
CC: Quais sãos os maiores desafios educacionais que o MEC precisa enfrentar em 2020?
TA: O relatório da Comex faz 12 recomendações para o Legislativo, de propostas legislativas que podem ser aprovadas na Câmara para melhorar a educação, assim como 53 recomendações para o Executivo. Um primeiro grande passo que o MEC precisa dar, que está com um atraso inexplicável, é apresentar seu plano estratégico para os próximos anos, e os planos de ação de todas as secretarias com metas, prazos e responsáveis. Isso não foi realizado até hoje.
Temos algumas urgências na educação para serem enfrentadas no ano que vem: implementar uma Política Nacional de Alfabetização, em um país com mais de 11 milhões de analfabetos, e voltar a respeitar a autonomia de universidades e institutos federais, para que possam retomar seu protagonismo. As escolhas e nomeações de reitores e a distribuição de recursos não podem mais ser feitas de forma arbitrária e ideológica.
CC: Quais são os riscos para o país – pensando em estudantes, professores e comunidades escolares – se o MEC não avançar em suas propostas?
TA: Fomos um dos últimos países no Pisa, temos mais de 11 milhões de analfabetos no Brasil e taxas altíssimas de evasão e abandono escolar. Não temos tempo a perder com a educação e não podemos deixar de acreditar que a educação é a saída para o Brasil.
Com a permanência da atual forma de gestão no MEC, o risco de não implementação das políticas educacionais é enorme, deixando professores e gestores sem diretrizes mínimas para atuarem em seus estados e municípios. Se já tínhamos metas do Plano Nacional de Educação com risco de não cumprimento antes dessa gestão, o futuro não parece muito promissor se não tivermos uma mudança drástica de rota no MEC.
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