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O futuro perde a esperança

O eleitor latino, que em poucos anos será maioria, desconfia de Obama

Ainda sonhadores? Os jovens de origem hispânica tiveram seus direitos negados. Foto: Justin Sullivan/Getty Images/AFP
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Um microcosmo do quebra-cabeça eleitoral americano pode ser encontrado em uma escola secundária localizada na maior cidade da Califórnia. A Academia Centennial, no bairro de Huntington Park, é um colégio interno bancado pelo poder público e por doações privadas, voltado para a comunidade de origem latino-americana da cidade. Parte da rede Aspire, que conta com perto de 12 mil estudantes matriculados em 34 institutos de educação no estado mais populoso dos Estados Unidos, seus alunos serão, com poucas exceções, os primeiros em suas famílias a chegar à universidade.

Boa parte de seus pais sequer completou o segundo grau nos países em que nasceram e jamais puderam ajudar a escolher o presidente dos EUA. Com seus filhos, a situação é radicalmente diferente. “Todos os anos, cerca de meio milhão de americanos de origem latina completam 18 anos e ganham o direito de voto. Hoje, 10 milhões de latinos podem ajudar a decidir quem ocupará a Casa Branca nos próximos quatro anos. Nas eleições de 2010, quase 7 milhões foram às urnas. Queremos aumentar esse número em novembro”, diz Julian Teixeira, diretor de comunicação do Conselho Nacional La Raza (NCLR, em inglês), o mais tradicional e ativo grupo de defesa dos direitos civis das chamadas populações hispânicas.

Organização sem filiação partidária, a La Raza realiza em Las Vegas, de 7 a 10 de julho, sua convenção anual. Na edição de 2008, em San Diego, Califórnia, o então senador Barack Obama convidou os hispânicos a “fazer parte oficialmente do sonho americano” e criticou seu adversário John McCain por enfatizar políticas de punição aos imigrantes não documentados. Obama oferecia um “olhar para o futuro”, com uma “urgente e necessária” reforma nas leis de imigração, passo fundamental para os cerca de 12 milhões de trabalhadores sem documentos, em sua maioria hispânicos, se tornarem cidadãos americanos.

Os quatro anos da administração Obama foram marcados por um aumento recorde no número de deportações de não documentados, para 400 mil/ano, e em uma redução considerável da entrada de imigrantes. “Há uma decepção com o governo Obama entre os latinos. A reforma na imigração simplesmente não saiu do papel. Por outro lado, ele nomeou a primeira ministra de origem hispânica para a Suprema Corte e a reforma da Saúde é especialmente popular na comunidade”, diz Teixeira.





A principal ponte
da Casa Branca com os movimentos sociais latinos, a diretora do Conselho de Política Doméstica, Cecília Muñoz, tem viajado o país e comandado desde o início do ano reuniões com lideranças locais. A mais recente aconteceu em Arlington, na Virgínia, e os temas centrais foram emprego, educação, saúde, e, claro, imigração. O discurso do governo, nestes encontros, é o de culpar exclusivamente os republicanos, com maioria no Congresso, pela impossibilidade de uma reforma do sistema de imigração e a não aprovação do Dream Act, que possibilitaria o acesso à educação superior a milhares de jovens nascidos na América Latina e moradores dos EUA desde a infância.

Os “sonhadores” são hoje a face mais humanitária do movimento dos direitos civis dos latinos: jovens que cresceram nos EUA, desfrutaram da educação gratuita em escolas públicas ou em Parcerias Público-Privadas como a Academia Centennial, são aceitos por universidades por conta de seu excepcional desempenho acadêmico, mas, por alcançarem a maioridade e não portarem documentação legal, acabam impedidos de seguirem suas carreiras. No início de junho, um grupo de “sonhadores” iniciou um protesto permanente na frente da sede da campanha de Obama em Denver (capital do Colorado), outro estado decisivo na disputa de novembro e que, depois de décadas nas mãos republicanas, voltou aos democratas por conta do voto maciço de hispânicos em Obama em 2008.

De acordo com números elaborados pela La Raza, Obama precisa de ao menos 60% dos votos dos hispânicos para seguir na Casa Branca. Mitt Romney não pode ficar abaixo de 40%. Nas eleições de 2008, o democrata conseguiu 67%, um número ainda mais importante quando se sabe que os eleitores de origem latino-americana se concentram em estados decisivos para a batalha de novembro, os chamados “swing states”, que ora votam com a direita, ora com a esquerda. Entre eles estão Nevada, Novo México e Flórida.

O chamado “voto hispânico” também tem garantido nos últimos anos a maioria democrata em estados como New Jersey e Pensilvânia, de forte movimento conservador impulsionado pelo Tea Party. E foi um fator crucial nas vitórias em 2008 na Virgínia e na Carolina do Norte, estados tradicionalmente mais alinhados com o ideário republicano.

As mais recentes pesquisas mostram grande vantagem dos democratas em âmbito nacional. O Gallup, com entrevistas realizadas entre 14 de maio e 3 de junho, aponta 67% pró-Obama e 26% pró-Romney. Mas há problemas em estados cruciais, como a Carolina do Norte, onde o apoio dos eleitores latinos e até mesmo dos negros, de acordo com pesquisa do Public Policy Polling (PPP), diminuiu em cerca de 20%. O resultado é a liderança de Romney no estado, 46% a 44% das intenções de voto, abocanhando 35% do voto de hispânicos e asiáticos e 20% dos negros. Analistas interpretam os números como uma reação ao apoio de Obama ao casamento gay, o que teria desagradado às minorias étnicas mais ligadas a instituições religiosas cristãs.

O voto católico e a maioria dos hispânicos se identifica como tal, é outro grupo fundamental para a vitória democrata. Ao contrário de 2008, quando Obama conseguiu 54% desse eleitorado, todas as pesquisas indicam no momento um empate técnico entre os dois candidatos.

Ao contrário de Romney, Obama precisa abrir uma vantagem significativa entre os latinos por causa de sua desvantagem entre os eleitores caucasianos, a maioria do eleitorado. Daí a importância da iniciativa apartidária de campanhas como a Mobilizar Para o Voto (M2V, na sigla americana), da La Raza, cujo objetivo é garantir a voz dos hispânicos em novembro. Somente na Flórida, 34 voluntários trabalham dia e noite para oficializar os registros de voto, e o objetivo é levar ao menos mais 180 mil hispânicos às urnas em novembro. “Mas é importante lembrar que o voto hispânico não é diferente dos demais grupos. Também estamos atentos à economia, aos índices de desemprego, à educação. A única diferença é o peso que damos à reforma da imigração. Mais do que qualquer outro, por uma questão demográfica, é o voto do futuro nos EUA”, diz Teixeira.

Um microcosmo do quebra-cabeça eleitoral americano pode ser encontrado em uma escola secundária localizada na maior cidade da Califórnia. A Academia Centennial, no bairro de Huntington Park, é um colégio interno bancado pelo poder público e por doações privadas, voltado para a comunidade de origem latino-americana da cidade. Parte da rede Aspire, que conta com perto de 12 mil estudantes matriculados em 34 institutos de educação no estado mais populoso dos Estados Unidos, seus alunos serão, com poucas exceções, os primeiros em suas famílias a chegar à universidade.

Boa parte de seus pais sequer completou o segundo grau nos países em que nasceram e jamais puderam ajudar a escolher o presidente dos EUA. Com seus filhos, a situação é radicalmente diferente. “Todos os anos, cerca de meio milhão de americanos de origem latina completam 18 anos e ganham o direito de voto. Hoje, 10 milhões de latinos podem ajudar a decidir quem ocupará a Casa Branca nos próximos quatro anos. Nas eleições de 2010, quase 7 milhões foram às urnas. Queremos aumentar esse número em novembro”, diz Julian Teixeira, diretor de comunicação do Conselho Nacional La Raza (NCLR, em inglês), o mais tradicional e ativo grupo de defesa dos direitos civis das chamadas populações hispânicas.

Organização sem filiação partidária, a La Raza realiza em Las Vegas, de 7 a 10 de julho, sua convenção anual. Na edição de 2008, em San Diego, Califórnia, o então senador Barack Obama convidou os hispânicos a “fazer parte oficialmente do sonho americano” e criticou seu adversário John McCain por enfatizar políticas de punição aos imigrantes não documentados. Obama oferecia um “olhar para o futuro”, com uma “urgente e necessária” reforma nas leis de imigração, passo fundamental para os cerca de 12 milhões de trabalhadores sem documentos, em sua maioria hispânicos, se tornarem cidadãos americanos.

Os quatro anos da administração Obama foram marcados por um aumento recorde no número de deportações de não documentados, para 400 mil/ano, e em uma redução considerável da entrada de imigrantes. “Há uma decepção com o governo Obama entre os latinos. A reforma na imigração simplesmente não saiu do papel. Por outro lado, ele nomeou a primeira ministra de origem hispânica para a Suprema Corte e a reforma da Saúde é especialmente popular na comunidade”, diz Teixeira.





A principal ponte
da Casa Branca com os movimentos sociais latinos, a diretora do Conselho de Política Doméstica, Cecília Muñoz, tem viajado o país e comandado desde o início do ano reuniões com lideranças locais. A mais recente aconteceu em Arlington, na Virgínia, e os temas centrais foram emprego, educação, saúde, e, claro, imigração. O discurso do governo, nestes encontros, é o de culpar exclusivamente os republicanos, com maioria no Congresso, pela impossibilidade de uma reforma do sistema de imigração e a não aprovação do Dream Act, que possibilitaria o acesso à educação superior a milhares de jovens nascidos na América Latina e moradores dos EUA desde a infância.

Os “sonhadores” são hoje a face mais humanitária do movimento dos direitos civis dos latinos: jovens que cresceram nos EUA, desfrutaram da educação gratuita em escolas públicas ou em Parcerias Público-Privadas como a Academia Centennial, são aceitos por universidades por conta de seu excepcional desempenho acadêmico, mas, por alcançarem a maioridade e não portarem documentação legal, acabam impedidos de seguirem suas carreiras. No início de junho, um grupo de “sonhadores” iniciou um protesto permanente na frente da sede da campanha de Obama em Denver (capital do Colorado), outro estado decisivo na disputa de novembro e que, depois de décadas nas mãos republicanas, voltou aos democratas por conta do voto maciço de hispânicos em Obama em 2008.

De acordo com números elaborados pela La Raza, Obama precisa de ao menos 60% dos votos dos hispânicos para seguir na Casa Branca. Mitt Romney não pode ficar abaixo de 40%. Nas eleições de 2008, o democrata conseguiu 67%, um número ainda mais importante quando se sabe que os eleitores de origem latino-americana se concentram em estados decisivos para a batalha de novembro, os chamados “swing states”, que ora votam com a direita, ora com a esquerda. Entre eles estão Nevada, Novo México e Flórida.

O chamado “voto hispânico” também tem garantido nos últimos anos a maioria democrata em estados como New Jersey e Pensilvânia, de forte movimento conservador impulsionado pelo Tea Party. E foi um fator crucial nas vitórias em 2008 na Virgínia e na Carolina do Norte, estados tradicionalmente mais alinhados com o ideário republicano.

As mais recentes pesquisas mostram grande vantagem dos democratas em âmbito nacional. O Gallup, com entrevistas realizadas entre 14 de maio e 3 de junho, aponta 67% pró-Obama e 26% pró-Romney. Mas há problemas em estados cruciais, como a Carolina do Norte, onde o apoio dos eleitores latinos e até mesmo dos negros, de acordo com pesquisa do Public Policy Polling (PPP), diminuiu em cerca de 20%. O resultado é a liderança de Romney no estado, 46% a 44% das intenções de voto, abocanhando 35% do voto de hispânicos e asiáticos e 20% dos negros. Analistas interpretam os números como uma reação ao apoio de Obama ao casamento gay, o que teria desagradado às minorias étnicas mais ligadas a instituições religiosas cristãs.

O voto católico e a maioria dos hispânicos se identifica como tal, é outro grupo fundamental para a vitória democrata. Ao contrário de 2008, quando Obama conseguiu 54% desse eleitorado, todas as pesquisas indicam no momento um empate técnico entre os dois candidatos.

Ao contrário de Romney, Obama precisa abrir uma vantagem significativa entre os latinos por causa de sua desvantagem entre os eleitores caucasianos, a maioria do eleitorado. Daí a importância da iniciativa apartidária de campanhas como a Mobilizar Para o Voto (M2V, na sigla americana), da La Raza, cujo objetivo é garantir a voz dos hispânicos em novembro. Somente na Flórida, 34 voluntários trabalham dia e noite para oficializar os registros de voto, e o objetivo é levar ao menos mais 180 mil hispânicos às urnas em novembro. “Mas é importante lembrar que o voto hispânico não é diferente dos demais grupos. Também estamos atentos à economia, aos índices de desemprego, à educação. A única diferença é o peso que damos à reforma da imigração. Mais do que qualquer outro, por uma questão demográfica, é o voto do futuro nos EUA”, diz Teixeira.

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