Economia

A ditadura do PIB

Por quanto tempo seria possível sustentar metas de crescimento infinitas aqui e no mundo?

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Ex-Secretário do Tesouro no governo de Bill Clinton e ex-conselheiro econômico de Barack Obama, Larry Summers, afirmou recentemente que o mundo vive um período de permanent low growth. Em português claro: baixo crescimento constante. Veículos importantes como BBC e Bloomberg se dedicaram a analisar o fato.

No Brasil, a notícia não chegou. Talvez venha de navio. Tanto que, por aqui, jornais anunciam todo dia medidas de impacto do governo interino de Michel Temer para “destravar o crescimento”. Todas, por coincidência, lesivas aos trabalhadores. Sem falar nos cortes somente em gastos sociais, como o Ministério da Cultura (medida revogada depois) e o Fundo Soberano, uma “poupança” criada há oito anos para se usada em medidas anticíclicas e poderia, eventualmente, receber recursos dos royalties do pré-sal.

É pouco provável que, com a desaceleração da China e os problemas enfrentados pela Europa, o Brasil sozinho consiga ter margens de crescimento exorbitantes. Não é impossível, mas bastante difícil. No entanto, turbinar a área econômica virou uma obsessão de Temer e parte da imprensa.

Como tal retomada parece uma tarefa inglória, caberia aos representantes em Brasília, assim como no New Deal, criar formas de amenizar o impacto da recessão mundial, com projetos de renda mínima, mais investimentos em saúde e educação públicas e outras iniciativas visando o bem-estar da população. Mas não é o que acontece. Pelo contrário. A meta é cortar todo os direitos, chamados de “privilégios” pelo governo interino.

Ainda que o diagnóstico de Summers (também professor de Harvard) esteja errado, cabe uma pergunta: por quanto tempo será possível sustentar metas de crescimento infinitas aqui e no mundo? Aos poucos, elas vêm entrando em conflito com a realidade.

Um exemplo claro se dava dentro do próprio PT: enquanto o prefeito Fernando Haddad estimula o uso do transporte público, Dilma e Lula distribuíram subsídios para a indústria automobilística.

O papel comporta tudo. É sempre possível aumentar a produtividade, o consumo e o lucro em planilhas. Mas será viável no mundo real, com poluição, violência, desmatamento, crise hídrica, lama tóxica da Samarco e esse esgotamento do planeta que insiste em ficar no caminho da economia?

Para termos uma ideia, se toda a população mundial tivesse o padrão de consumo norte-americano, teríamos que dispor de uns três ou quatro planetas semelhantes. O capitalismo para todos não é apenas uma utopia. É uma impossibilidade natural. E incluir também economicamente é imperativo em um mundo que dá passos importantes na igualdade racial e de gêneros. A solução está em repartir o bolo já, e não em ficar insistindo no fermento.

James Carville, marqueteiro de Bill Clinton (aquele do “É a economia, estúpido!”) ensinou a seus pupilos que ganha a disputa política quem define a agenda. E a nossa é definida pelo mercado e os financiadores de campanha. Com isso, o debate fica travado em um só ponto de vista. Mas por que nós aceitamos que o PIB seja a única métrica possível para definir o sucesso do Brasil?

Faz um tempo, alguns países começaram a dar mais valor ao IDH do que a outros indicadores. Para justificar, costumam citar a China: foram mais de dez anos de economia aceleradíssima. Mas e daí? Os chineses são mais felizes do que cidadãos de países com menor produtividade, mas com mais liberdade e qualidade de vida?

Vai demorar para essa discussão desembarcar no Brasil. Mas esperamos que, um dia, desembarque.

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