Cultura

Os penicos e as panelas de Naná Vasconcelos

O percussionista Naná Vasconcelos encara o desafio de tirar sons de objetos do cotidiano, não poucas vezes com o auxílio de crianças

Naná Vasconcelos toca o pinipan em Belo Horizonte
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Sempre que os visitava, o percussionista Naná Vasconcelos roubava as panelas no apartamento de Lô e Márcio Borges para batucar. Eram o início dos anos 70 e a fase de gestação do Clube da Esquina, que os irmãos Borges formariam com Milton Nascimento, Fernando Brant e outros músicos. “Dona Maricota, que é a mãe deles, falava: ‘cadê as caçarolas para eu cozinhar? Toda vez que esse Naná vem aqui as caçarolas desaparecem’ ”, relembra Naná, rindo.

Experiências como essa o ajudaram a criar o pinipan, instrumento que combina panelas e penicos pendurados. “Para fazer isso, eu também me lembrei da minha infância, quando eu não tinha instrumentos. Eu batia muitos nas caçarolas lá de casa”, recorda Naná.

O instrumento e o show de Naná com o pinipan foram criados para o Fito (Festival Internacional de Teatro de Objetos), evento onde o percussionista se apresentou no último final de semana em Belo Horizonte. O percussionista faz solos em sua invenção enquanto duas mulheres fazem a base em panelas e outro músico comanda sintetizadores e a reprodução de gravações.

Naná conta ter feito o instrumento a pedido do festival e ter gostado do “desafio” de usar objetos cotidianos no novo show. “Eu tenho pavor de ficar na mesmice. Estou sempre experimentando as coisas, estou sempre procurando, buscando. Eu nunca fiz parte de grupo nenhum por isso” diz o percussionista, que já tocou com Hermeto Pascoal, Caetano Veloso, Egberto Gismonti, Herbie Hancock e outros grandes jazzistas norte-americanos.

Sem saudosismos, Naná diz ter sido muito difícil se desamarrar das tradições e inovar no começo da carreira. Ele lembra que em seu pequeno apartamento não cabia uma bateria, o que o fez tocar outros ritmos além da capoeira no berimbau.

“Fui tocar berimbau fora do Brasil porque eu tinha medo. Aqui diziam que eu estava deturpando as tradições porque eu não tocava capoeira nele”, conta. “Quando você começa a pensar em prender alguém às tradições, eu acho que isso é doente, uma burrice intelectual de uma arrogante ignorância”.

Lições de crianças


Em uma de suas apresentações no festival, Naná foi acompanhado por uma criança de 4 anos. Ela subiu ao palco e não foi impedida de usar os instrumentos durante o show.

O percussionista lembra que seu trabalho com crianças começou quando foi morar na França no começo da década de 70. Ele parou sua turnê para trabalhar com crianças portadoras de necessidades especiais, mesmo sem saber falar francês.

“Eu fiquei fascinado. Tive que mostrar a importância da natureza para elas. Mostrar que quando você corta uma cabaça ela serve de caixa de ressonância para várias coisas: cítara, tambor, berimbau, maraca. Foi fascinante, porque aí eu comecei a fabricar meus próprios instrumentos”, lembra Naná.

Nos últimos anos, Naná fez um show em que regia 120 crianças brasileiras, africanas e europeias, chamado “Língua mãe”.

A voz de Naná é acrescida de vários sons pré-gravados durante o show. Seus últimos álbuns também usam colagens e cortes de sons orgânicos posteriormente trabalhados no computador. O percussionista grava batuques na água e chinelos arrastando no chão para depois trabalha-los digitalmente.

Naná despertou para a música eletrônica influenciado por crianças de Nova York, quando o hip-hop ganhava força no começo da década de 80.

Ele estava passando num parque quando viu jovens entre 8 e 16 anos dançando break. Naná pediu para tocar com elas e foi convidado a ir a uma casa no Bronx, bairro que é o berço do rap. “Lá, eu comecei a tocar e eles começaram a dançar, meio assim, devagar. Daqui a pouco vem um pivete de oito anos e me diz: sem ofensas, mas eu não quero ouvir essa merda de jazz”, conta Naná. Em seguida, as crianças colocaram o hip-hop e voltaram a dançar. “Eu fiquei puto, fui desmoralizado por uma criança. Eu era o melhor percussionista do mundo, pensava essas besteiras. Aí esfriei, passou dois dias e eu disse: entendi, é a eletrônica”.

Depois disso, Naná foi a uma loja e comprou um Oberheim DMX, a bateria eletrônica que ajudou a popularizar a batida seca do hip-hop e da música eletrônica. “Eu tive que aprender a tocar com a máquina. Ela não ia aprender a tocar comigo. Então foi maravilhoso, porque ela não tem nuances. Eu aprendi a tocar simples e tocar igual máquina”.

*Piero Locatelli viajou a convite do Festival Internacional de Teatro de Objetos

Sempre que os visitava, o percussionista Naná Vasconcelos roubava as panelas no apartamento de Lô e Márcio Borges para batucar. Eram o início dos anos 70 e a fase de gestação do Clube da Esquina, que os irmãos Borges formariam com Milton Nascimento, Fernando Brant e outros músicos. “Dona Maricota, que é a mãe deles, falava: ‘cadê as caçarolas para eu cozinhar? Toda vez que esse Naná vem aqui as caçarolas desaparecem’ ”, relembra Naná, rindo.

Experiências como essa o ajudaram a criar o pinipan, instrumento que combina panelas e penicos pendurados. “Para fazer isso, eu também me lembrei da minha infância, quando eu não tinha instrumentos. Eu batia muitos nas caçarolas lá de casa”, recorda Naná.

O instrumento e o show de Naná com o pinipan foram criados para o Fito (Festival Internacional de Teatro de Objetos), evento onde o percussionista se apresentou no último final de semana em Belo Horizonte. O percussionista faz solos em sua invenção enquanto duas mulheres fazem a base em panelas e outro músico comanda sintetizadores e a reprodução de gravações.

Naná conta ter feito o instrumento a pedido do festival e ter gostado do “desafio” de usar objetos cotidianos no novo show. “Eu tenho pavor de ficar na mesmice. Estou sempre experimentando as coisas, estou sempre procurando, buscando. Eu nunca fiz parte de grupo nenhum por isso” diz o percussionista, que já tocou com Hermeto Pascoal, Caetano Veloso, Egberto Gismonti, Herbie Hancock e outros grandes jazzistas norte-americanos.

Sem saudosismos, Naná diz ter sido muito difícil se desamarrar das tradições e inovar no começo da carreira. Ele lembra que em seu pequeno apartamento não cabia uma bateria, o que o fez tocar outros ritmos além da capoeira no berimbau.

“Fui tocar berimbau fora do Brasil porque eu tinha medo. Aqui diziam que eu estava deturpando as tradições porque eu não tocava capoeira nele”, conta. “Quando você começa a pensar em prender alguém às tradições, eu acho que isso é doente, uma burrice intelectual de uma arrogante ignorância”.

Lições de crianças


Em uma de suas apresentações no festival, Naná foi acompanhado por uma criança de 4 anos. Ela subiu ao palco e não foi impedida de usar os instrumentos durante o show.

O percussionista lembra que seu trabalho com crianças começou quando foi morar na França no começo da década de 70. Ele parou sua turnê para trabalhar com crianças portadoras de necessidades especiais, mesmo sem saber falar francês.

“Eu fiquei fascinado. Tive que mostrar a importância da natureza para elas. Mostrar que quando você corta uma cabaça ela serve de caixa de ressonância para várias coisas: cítara, tambor, berimbau, maraca. Foi fascinante, porque aí eu comecei a fabricar meus próprios instrumentos”, lembra Naná.

Nos últimos anos, Naná fez um show em que regia 120 crianças brasileiras, africanas e europeias, chamado “Língua mãe”.

A voz de Naná é acrescida de vários sons pré-gravados durante o show. Seus últimos álbuns também usam colagens e cortes de sons orgânicos posteriormente trabalhados no computador. O percussionista grava batuques na água e chinelos arrastando no chão para depois trabalha-los digitalmente.

Naná despertou para a música eletrônica influenciado por crianças de Nova York, quando o hip-hop ganhava força no começo da década de 80.

Ele estava passando num parque quando viu jovens entre 8 e 16 anos dançando break. Naná pediu para tocar com elas e foi convidado a ir a uma casa no Bronx, bairro que é o berço do rap. “Lá, eu comecei a tocar e eles começaram a dançar, meio assim, devagar. Daqui a pouco vem um pivete de oito anos e me diz: sem ofensas, mas eu não quero ouvir essa merda de jazz”, conta Naná. Em seguida, as crianças colocaram o hip-hop e voltaram a dançar. “Eu fiquei puto, fui desmoralizado por uma criança. Eu era o melhor percussionista do mundo, pensava essas besteiras. Aí esfriei, passou dois dias e eu disse: entendi, é a eletrônica”.

Depois disso, Naná foi a uma loja e comprou um Oberheim DMX, a bateria eletrônica que ajudou a popularizar a batida seca do hip-hop e da música eletrônica. “Eu tive que aprender a tocar com a máquina. Ela não ia aprender a tocar comigo. Então foi maravilhoso, porque ela não tem nuances. Eu aprendi a tocar simples e tocar igual máquina”.

*Piero Locatelli viajou a convite do Festival Internacional de Teatro de Objetos

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