Cultura
Ao vivo da casa dos mortos
Em Diário da Tranca, José Diniz Junior faz relatos sensíveis do amargo retrato da atual geração do crime
Diário da Tranca
José Diniz Junior
Digital Publish & Print
Editora, 320 págs.
O goleiro absoluto do pavilhão 8 é Foguinho, negro alto, pobre e analfabeto funcional. Sua sina é a cadeia, vaticina com efeito retroativo. Garante que não sabe fazer outra coisa que não roubar. Mesmo se a almejada liberdade um dia chegar, voltará para detrás das grades. É inevitável.
Foguinho é um entre os perto de 1,7 mil detentos a se esbarrar no Presídio Edgar Magalhães Noronha, o Pemano, em Tremembé, São Paulo. Foi nesse depósito de gente desesperançada e desassistida a ver o crime como saída cronicamente viável que o jornalista mineiro José Diniz Júnior viveu quase 200 dias. Seu crime: denunciar falcatruas no tabloide Matéria-Prima, semanário satírico fundado por ele em Taubaté, interior de São Paulo, em 1998.
O primeiro dos dois períodos na mansão dos quase mortos se deu em dezembro de 2007. Um ano antes, Matéria-Prima publicara denúncia de conduta suspeita de um advogado da área imobiliária acusado de fazer jogo duplo com a concorrência. Tempos depois de confirmar tudo diante da OAB, a testemunha negou o que havia dito. Com base na extinta Lei de Imprensa, o advogado conseguiu a condenação de Diniz.
Em abril de 2011, o jornalista voltou à cadeia, a “tranca” a que se refere o título do livro, acusado de calúnia e difamação por denunciar contas irregulares no Taubaté Country Club.
De dentro do depósito de presos, Diniz conheceu os códigos e as histórias de um mundo a esboroar, povoado por fantasmas desconsolados. Pânico é um deles. No domingo em que fez 20 anos recebeu a visita do pai. No refeitório, à noite, exibia olhar baldio. “Fui até meu ‘escritório’ – beliche 33, altos –, peguei uma barra de chocolate e dei a ele. Foi como se eu falasse com uma pedra. Não fossem seus olhos cheios de lágrimas.”
Em relatos sensíveis, o autor faz o amargo retrato da atual geração do crime, garotos com pouco mais de 20 anos desprovidos de quase tudo. Como o pernambucano subnutrido que só fala em “oitão e baseado”. Voz fina, um dia desabafou a sua que é a história de sabe-se lá quantos por ali: “Minha mãe me trocou por uma garrafa de cachaça…”
Diário da Tranca
José Diniz Junior
Digital Publish & Print
Editora, 320 págs.
O goleiro absoluto do pavilhão 8 é Foguinho, negro alto, pobre e analfabeto funcional. Sua sina é a cadeia, vaticina com efeito retroativo. Garante que não sabe fazer outra coisa que não roubar. Mesmo se a almejada liberdade um dia chegar, voltará para detrás das grades. É inevitável.
Foguinho é um entre os perto de 1,7 mil detentos a se esbarrar no Presídio Edgar Magalhães Noronha, o Pemano, em Tremembé, São Paulo. Foi nesse depósito de gente desesperançada e desassistida a ver o crime como saída cronicamente viável que o jornalista mineiro José Diniz Júnior viveu quase 200 dias. Seu crime: denunciar falcatruas no tabloide Matéria-Prima, semanário satírico fundado por ele em Taubaté, interior de São Paulo, em 1998.
O primeiro dos dois períodos na mansão dos quase mortos se deu em dezembro de 2007. Um ano antes, Matéria-Prima publicara denúncia de conduta suspeita de um advogado da área imobiliária acusado de fazer jogo duplo com a concorrência. Tempos depois de confirmar tudo diante da OAB, a testemunha negou o que havia dito. Com base na extinta Lei de Imprensa, o advogado conseguiu a condenação de Diniz.
Em abril de 2011, o jornalista voltou à cadeia, a “tranca” a que se refere o título do livro, acusado de calúnia e difamação por denunciar contas irregulares no Taubaté Country Club.
De dentro do depósito de presos, Diniz conheceu os códigos e as histórias de um mundo a esboroar, povoado por fantasmas desconsolados. Pânico é um deles. No domingo em que fez 20 anos recebeu a visita do pai. No refeitório, à noite, exibia olhar baldio. “Fui até meu ‘escritório’ – beliche 33, altos –, peguei uma barra de chocolate e dei a ele. Foi como se eu falasse com uma pedra. Não fossem seus olhos cheios de lágrimas.”
Em relatos sensíveis, o autor faz o amargo retrato da atual geração do crime, garotos com pouco mais de 20 anos desprovidos de quase tudo. Como o pernambucano subnutrido que só fala em “oitão e baseado”. Voz fina, um dia desabafou a sua que é a história de sabe-se lá quantos por ali: “Minha mãe me trocou por uma garrafa de cachaça…”
Um minuto, por favor…
O bolsonarismo perdeu a batalha das urnas, mas não está morto.
Diante de um país tão dividido e arrasado, é preciso centrar esforços em uma reconstrução.
Seu apoio, leitor, será ainda mais fundamental.
Se você valoriza o bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando por um novo Brasil.
Assine a edição semanal da revista;
Ou contribua, com o quanto puder.