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Na visita de Dilma, manifestantes relembram mártires da Amazônia

Marcha em Washington se solidariza com movimentos sociais brasileiros e protesta contra política ambiental do governo

Irmã de Dorothy Stang carrega cartaz em homenagem aos mártires da floresta. Foto: Felipe Milanez
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Por Felipe Milanez, em Washington

 

A Embaixada do Brasil em Washington, um edifício modernista que contrasta com o classicismo dos imóveis da bela Embassy Row, o setor de embaixadas da capital americana, foi palco nesta segunda-feira 9 de uma marcha que reuniu cerca de cem pessoas, entre estudantes, ativistas e brasileiros que moram na região, que se manifestaram durante a visita da presidenta Dilma Rousseff à cidade.

O protesto, segundo os organizadores, tinha quatro motivos: a violência no campo, principalmente na Amazônia; a impunidade dos mandantes e executores desses crimes; as mudanças no Código Florestal brasileiro; a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia.

Em meio a bandeiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, cartazes estampavam imagens do casal José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, assassinados em 24 de maio de 2011. Estavam ao lado de fotos de Dorothy Stang, Chico Mendes e uma cena do enterro de 19 trabalhadores rurais sem terra mortos no massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996.

“A Amazônia e seus povos querem viver. Chega da violência!”. Esta era a frase estampada em uma das faixas.

O tema faz referência a uma situação dramática na Amazônia: o assassinato de lideranças políticas na região. Fotos de Laisa Santos Sampaio e de Nilcilene Miguel de Lima vieram acompanhadas da seguinte frase, pronunciada recentemente pelas ativistas: “Eu quero viver”.

A mesma frase dita por Chico Mendes pouco antes de morrer. Nilcilene está sob proteção da Força Nacional (cujo prazo encerra-se em breve). Laisa, também ameaçada de morte, segue sem qualquer tipo de proteção oficial.

Marguerite Hohm, irmã da missionária Dorothy Stang, assassinada no Pará em 2005, prestou solidariedade aos ativistas ameaçados de morte na região. “Basta de violência na Amazônia”, disse ela.

Após cumprirem parte da pena, alguns dos envolvidos na morte de Dorothy, como Bida, um dos mandantes, e Fogoió, um dos executores, já estão em liberdade.

Os lemas da mobilização incluíam palavras de ordem socioambiental, contrárias à barragem de Belo Monte (“Stop Belo Monte”), ao Código Florestal em votação na Câmara (“Veta, Dilma!”), assim como “Sem medo de dizer não à bancada ruralista”, e em defesa das populações tradicionais da floresta: “índios, extrativistas e camponeses: doutores da ecologia”.

Miguel Carter, professor na American University, afirmou que o momento atual precisa de uma reflexão. “Não se sabe até quanto tempo poderemos levar essa vida no planeta da forma como levamos hoje. E é preciso ouvir os índios, os povos da Amazônia, os camponeses, pessoas que sabem muito mais de ecologia do que os políticos que estão negociando  os acordos internacionais.”

Segundo ele, os povos tradicionais “são verdadeiros doutores da ecologia. Precisamos ter humildade para reconhecer a sabedoria deles, pois temos muito a aprender”.

Zé Cláudio e Maria, homenageados em maio pela ONU como “Heróis da Floresta”, foram destacados por Carter como “heróis pelo movimento de direitos humanos e meio ambiente”.

“Esta é uma marcha de solidariedade com os movimentos sociais brasileiros, defensores de direitos humanos, ativistas ambientais, povos indígenas, movimentos camponeses. E também de protesto contra a política ambiental do governo”, disse Andrew Miller, da organização AmazonWatch, no alto falante.

“Dilma Rousseff está mostrando o Brasil como um país progressista com relação ao meio ambiente, visando a Rio + 20. Mas a situação em campo mostra uma outra realidade, com a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, como Belo Monte; o Código Florestal, caso Dilma venha a ratificar a lei; e, principalmente, com a grave situação de violência na região”, afirmou Miller.

O discurso aconteceu com faixas ao fundo questionando: “Rio-20: cadê os direitos humanos no ‘capitalismo verde’?”.

As organizações presentes lembraram que “o desmatamento triplicou no primeiro trimestre desse ano”. “Junto da floresta, as pessoas da Amazônia estão sendo mortas”, havia dito Laisa em seu discurso na ONU, ao receber o prêmio em homenagem a sua irmã e seu cunhado.

A violência é um dos fatores mais assustadores na Amazônia. A morte do casal de ambientalistas no Pará, menos de um ano atrás, foi seguida pela morte de Adelino Ramos, o Dinho, em Rondônia, na mesma semana. Nessa mesma região onde Dinho denunciava a extração ilegal de madeiras, no dia 30 de março, menos de duas semanas antes da marcha em Washington, Dinhana Nink foi morta por igual razão: denunciar madeireiros ilegais. Nilcilene Lima, líder extrativista, teme ter o mesmo destino.

“Nossa solidariedade, para que essas pessoas que estão longe saibam que estamos junto deles. O governo brasileiro não pode ficar omisso”, diz Carter.

A marcha aconteceu em um lindo dia de primavera na capital americana, com o caminho colorido por flores, especialmente pelas famosas cerejeiras que florescem nessa época do ano.

Os cartazes, desenhados pelo artista plástico Cesar Maxit, compunham uma paisagem poética e, ao mesmo tempo, perturbadora. Menos de um ano depois de serem assassinados, Zé Cláudio e Maria tiveram seus rostos dispostos ao lado de figuras emblemáticas da destruição da Amazônia, como Chico Mendes e Dorothy Stang.

Tornaram-se justamente o que, em vida, temiam: mártires da Amazônia. “A mesma coisa que fizeram com Chico Mendes, a mesma coisa que fizeram com a irmã Dorothy, querem fazer comigo”, havia declarado Zé Cláudio, no evento TEDXAmazonia, alguns meses antes de sua morte.

Os cartazes com os clamores de vida de Laisa e Nilcilene, “Eu quero viver”, podem representar as centenas de pessoas que estão ameaçadas de morte, em listas discutidas por movimentos sociais com o governo.

A incapacidade do governo de dar a estas pessoas condições de sobrevivência, em um ambiente dominado por medo e terror, faz temer pelo pior.

 

Por Felipe Milanez, em Washington

 

A Embaixada do Brasil em Washington, um edifício modernista que contrasta com o classicismo dos imóveis da bela Embassy Row, o setor de embaixadas da capital americana, foi palco nesta segunda-feira 9 de uma marcha que reuniu cerca de cem pessoas, entre estudantes, ativistas e brasileiros que moram na região, que se manifestaram durante a visita da presidenta Dilma Rousseff à cidade.

O protesto, segundo os organizadores, tinha quatro motivos: a violência no campo, principalmente na Amazônia; a impunidade dos mandantes e executores desses crimes; as mudanças no Código Florestal brasileiro; a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia.

Em meio a bandeiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, cartazes estampavam imagens do casal José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, assassinados em 24 de maio de 2011. Estavam ao lado de fotos de Dorothy Stang, Chico Mendes e uma cena do enterro de 19 trabalhadores rurais sem terra mortos no massacre de Eldorado dos Carajás, em 1996.

“A Amazônia e seus povos querem viver. Chega da violência!”. Esta era a frase estampada em uma das faixas.

O tema faz referência a uma situação dramática na Amazônia: o assassinato de lideranças políticas na região. Fotos de Laisa Santos Sampaio e de Nilcilene Miguel de Lima vieram acompanhadas da seguinte frase, pronunciada recentemente pelas ativistas: “Eu quero viver”.

A mesma frase dita por Chico Mendes pouco antes de morrer. Nilcilene está sob proteção da Força Nacional (cujo prazo encerra-se em breve). Laisa, também ameaçada de morte, segue sem qualquer tipo de proteção oficial.

Marguerite Hohm, irmã da missionária Dorothy Stang, assassinada no Pará em 2005, prestou solidariedade aos ativistas ameaçados de morte na região. “Basta de violência na Amazônia”, disse ela.

Após cumprirem parte da pena, alguns dos envolvidos na morte de Dorothy, como Bida, um dos mandantes, e Fogoió, um dos executores, já estão em liberdade.

Os lemas da mobilização incluíam palavras de ordem socioambiental, contrárias à barragem de Belo Monte (“Stop Belo Monte”), ao Código Florestal em votação na Câmara (“Veta, Dilma!”), assim como “Sem medo de dizer não à bancada ruralista”, e em defesa das populações tradicionais da floresta: “índios, extrativistas e camponeses: doutores da ecologia”.

Miguel Carter, professor na American University, afirmou que o momento atual precisa de uma reflexão. “Não se sabe até quanto tempo poderemos levar essa vida no planeta da forma como levamos hoje. E é preciso ouvir os índios, os povos da Amazônia, os camponeses, pessoas que sabem muito mais de ecologia do que os políticos que estão negociando  os acordos internacionais.”

Segundo ele, os povos tradicionais “são verdadeiros doutores da ecologia. Precisamos ter humildade para reconhecer a sabedoria deles, pois temos muito a aprender”.

Zé Cláudio e Maria, homenageados em maio pela ONU como “Heróis da Floresta”, foram destacados por Carter como “heróis pelo movimento de direitos humanos e meio ambiente”.

“Esta é uma marcha de solidariedade com os movimentos sociais brasileiros, defensores de direitos humanos, ativistas ambientais, povos indígenas, movimentos camponeses. E também de protesto contra a política ambiental do governo”, disse Andrew Miller, da organização AmazonWatch, no alto falante.

“Dilma Rousseff está mostrando o Brasil como um país progressista com relação ao meio ambiente, visando a Rio + 20. Mas a situação em campo mostra uma outra realidade, com a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, como Belo Monte; o Código Florestal, caso Dilma venha a ratificar a lei; e, principalmente, com a grave situação de violência na região”, afirmou Miller.

O discurso aconteceu com faixas ao fundo questionando: “Rio-20: cadê os direitos humanos no ‘capitalismo verde’?”.

As organizações presentes lembraram que “o desmatamento triplicou no primeiro trimestre desse ano”. “Junto da floresta, as pessoas da Amazônia estão sendo mortas”, havia dito Laisa em seu discurso na ONU, ao receber o prêmio em homenagem a sua irmã e seu cunhado.

A violência é um dos fatores mais assustadores na Amazônia. A morte do casal de ambientalistas no Pará, menos de um ano atrás, foi seguida pela morte de Adelino Ramos, o Dinho, em Rondônia, na mesma semana. Nessa mesma região onde Dinho denunciava a extração ilegal de madeiras, no dia 30 de março, menos de duas semanas antes da marcha em Washington, Dinhana Nink foi morta por igual razão: denunciar madeireiros ilegais. Nilcilene Lima, líder extrativista, teme ter o mesmo destino.

“Nossa solidariedade, para que essas pessoas que estão longe saibam que estamos junto deles. O governo brasileiro não pode ficar omisso”, diz Carter.

A marcha aconteceu em um lindo dia de primavera na capital americana, com o caminho colorido por flores, especialmente pelas famosas cerejeiras que florescem nessa época do ano.

Os cartazes, desenhados pelo artista plástico Cesar Maxit, compunham uma paisagem poética e, ao mesmo tempo, perturbadora. Menos de um ano depois de serem assassinados, Zé Cláudio e Maria tiveram seus rostos dispostos ao lado de figuras emblemáticas da destruição da Amazônia, como Chico Mendes e Dorothy Stang.

Tornaram-se justamente o que, em vida, temiam: mártires da Amazônia. “A mesma coisa que fizeram com Chico Mendes, a mesma coisa que fizeram com a irmã Dorothy, querem fazer comigo”, havia declarado Zé Cláudio, no evento TEDXAmazonia, alguns meses antes de sua morte.

Os cartazes com os clamores de vida de Laisa e Nilcilene, “Eu quero viver”, podem representar as centenas de pessoas que estão ameaçadas de morte, em listas discutidas por movimentos sociais com o governo.

A incapacidade do governo de dar a estas pessoas condições de sobrevivência, em um ambiente dominado por medo e terror, faz temer pelo pior.

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