Sociedade

Governo federal dará tratamento psicológico a vítimas da ditadura

Brasil seguirá exemplo de Argentina e Uruguai com projeto gratuito em quatro cidades, que pode se estender a outros tipos de violência do Estado

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Em meio às apurações da Comissão Nacional da Verdade, buscar no passado as lembranças de uma tortura ou violência sofrida por um agente do Estado pode ser uma situação dolorosa. Em muitos casos, reprimi-las é ainda mais problemático. Por isso, a  Comissão de Anistia do Ministério da Justiça vai investir 2,4 milhões de reais em um projeto de tratamento psicológico gratuito para pessoas que passaram por violências do Estado durante a ditadura.

Quatro entidades foram selecionadas para comandar o projeto-piloto “Clínicas do Testemunho”, que visa ampliar as reparações do Estado e construir uma política pública de saúde mental que possa ser usada em outras vítimas deste tipo de violência.“Esse projeto é muito importante, porque o Estado reconhece sua responsabilidade na prática de violência na ditadura e também o dano subjetivo causado às vítimas destes atos”, diz Moisés Rodrigues da Silva Júnior, presidente do Instituto Projetos Terapêuticos e coordenador voluntário do projeto.

As clínicas terão psiquiatras, psicólogos e psicanalistas para realizar um trabalho já desenvolvido em outros países da América Latina, como Argentina e Uruguai. Duas unidades ficarão em São Paulo, uma no Rio de Janeiro e outra em Porto Alegre. Há ainda um centro em Recife, patrocinado pelo governo de Pernambuco.

As entidades selecionadas darão apoio às vítimas e seus familiares, além de capacitar profissionais e colher informações que possam ser usadas como referência em outros projetos. Ao todo, serão 702 vagas para atendimento individual e em grupos. Em São Paulo, serão 332 vagas, no Rio, 200, em Porto Alegre, 70, e no Recife, 100.

Segundo o MJ, qualquer anistiado político e seus familiares podem se inscrever no programa preenchendo uma ficha (acesse aqui) e enviando-a para o email até 06 de abril.

        

O lançamento do programa ocorre em São Paulo, em 15 de abril, com eventos nos dias seguintes nas demais cidades.

Caso haja procura maior que as vagas, critérios de seleção como a gravidade da violação aos direitos humanos e a idade avançada do candidato serão avaliados. Os selecionados receberão, então, um número de inscrição por email.

O projeto pode trazer ao debate casos de vítimas da ditadura sufocados pelo tempo e também evitar tragédias como a de Carlos Azevedo, filho do cientista político Dermi Azevedo, opositor do regime militar. Torturado com um ano e oito meses de idade por agentes da ditadura, ele desenvolveu fobia social, doença da qual nunca se recuperou. Recentemente, aos 37 anos, se suicidou.

“A tortura era para fazer falar e também calar pelo medo. E esse tipo de esquecimento forçado leva ao sofrimento”, conta Silva Júnior. “A possibilidade de levantar o problema após tantos anos traz um benefício direto, porque atendemos também as famílias, que sofrem com a transmissão deste trauma silenciado. Poder abordar isso é colocar uma sociedade de pé.”

Os selecionados poderão escolher uma das clínicas na lista (veja o quadro com nomes e endereços abaixo). Eles serão avaliados e encaminhados ao atendimento individual ou em grupo. Os núcleos funcionarão por até 24 meses.

A intenção é que a experiência se torne uma política pública e possa ser estendida a outros tipos de violência do Estado nos dias atuais. “Há populações imensas em periferias onde ocorrem genocídios de jovens pobres e negros, que são populações vulneráveis e vítimas de uma violência dirigida. O Estado e seu aparelho repressivo são violentos e a expectativa é responsabilizá-lo por estes atos.”

Veja o edital do projeto aqui.

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