Sociedade

Em um ano, apoio à democracia no Brasil cai de 54% para 32%

Na América Latina, situação brasileira só é melhor do que a da Guatemala. Na região, índice caiu de 61% para 54% desde 2010

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O apoio à democracia na América Latina caiu para um nível histórico. E o Brasil – onde Dilma Rousseff acaba de ser destituída do cargo de presidente – é o país em que mais se verifica essa tendência.

“O passado não conta, e como governante é preciso reconquistar (a aprovação dos eleitores) a cada dia”, afirma uma das conclusões de uma pesquisa de opinião divulgada no início de setembro pela Corporación Latinobarómetro.

Desde 1995, a renomada organização não governamental avalia a cada ano o apoio dos latino-americanos à democracia como forma de governo. A instituição é apoiada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e pela Transparência Internacional.

A atual análise é resultado de uma sondagem realizada com 20 mil pessoas em 18 países da América Latina. O resultado: desde 2010, o índice de apoio à democracia na região caiu de 61% para 54%.

No Brasil, o índice caiu de 54% para 32% em apenas um ano. Somente na Guatemala – onde, em 2015, o presidente Otto Pérez Molina teve que renunciar por causa de acusações de corrupção – o índice de apoio à democracia é menor: 30%.

Em novembro de 1889, o marechal liderou o golpe das Forças Armadas que derrubou dom Pedro 2º. Ele governou provisoriamente até fevereiro de 1891, quando foi eleito indiretamente pelo Congresso, com um mandato até 1894. Devido à crise econômica e política, que teve seu auge com a dissolução do Congresso, o vice Floriano Peixoto teve a ajuda da Marinha para forçar a saída de Deodoro, que renunciou.

As consequências da situação no Brasil são especialmente grandes. “O Brasil não é somente o maior e mais poderoso, mas também o único país da América Latina que está lado a lado com as potências mundiais”, diz o estudo.

Por isso, o estado da democracia brasileira tem fundamental importância para toda a América Latina. “A recuperação política do Brasil está vinculada à capacidade do governo de mostrar progressos na luta contra a corrupção”, conclui o texto.

Os resultados atuais da pesquisa estão alinhados com uma tendência mundial de ceticismo em relação à democracia abordada pelo pesquisador americano Marc F. Plattner no ano passado, em seu livro Democracy in decline? (“Democracia em declínio?”, em tradução livre).

Herança do passado

Na América Latina, muitos países voltaram à democracia há não mais de 30 anos. A análise das consequências das ditaduras militares dos anos 1970 e 1980 ainda não foi concluída.

Segundo o estudo, o aumento da indiferença política na região é particularmente grave. Do total de entrevistados, 23% da população não se importam se o governo foi eleito democraticamente ou não. Em 2010, esse índice era de somente 16%.

“A perda de confiança se manifesta num momento em que as perspectivas sombrias para a região se misturam com as altas exigências dos cidadãos em relação aos seus representantes no governo”, afirma Marta Lagos, fundadora e diretora da Corporación Latinobarómetro. Esta é a primeira vez que a combinação desses fatores foi verificada na pesquisa.

Recessão e corrupção

Perspectivas econômicas negativas dificilmente são os fatores decisivos para a crescente desilusão com a democracia. Isso porque, justamente durante a crise mundial de 2008 e 2009, o índice de aprovação alcançou, respectivamente, 57% e 59%. Um ano depois, em 2010, ele chegou a 61%.

“A sociedade mudou”, constata Marta Lagos. “O que ainda era tolerado há cinco anos, não é mais aceitável hoje.” As pessoas exigem soluções concretas que precisam ser implementadas imediatamente contra problemas também concretos. “Eles não estão mais dispostos a esperar para depois”, opina.

À primeira vista, o resultado da pesquisa na Venezuela é surpreendente. Embora o país esteja em colapso político e econômico, a democracia tem 77% de aprovação. Uma possível explicação é que muitos venezuelanos não consideram mais o governo do presidente Nicolás Maduro democrático e desejam que a Constituição volte a ser respeitada.

No Chile, Uruguai, Nicarágua e El Salvador, o apoio à democracia também caiu. No Chile, não diminuiu somente o apoio à democracia, mas também à presidente Michelle Bachelet.

Embora ela tenha terminado seu primeiro mandato em 2010 com um índice de aprovação de cerca de 80%, seu segundo mandato, iniciado em 2014, registra números bem menores.

A razão para a queda não foi somente a crise econômica provocada pela diminuição dos preços de exportação no mercado internacional da principal matéria-prima do país – o cobre –, mas um escândalo de corrupção no qual o filho de Bachelet estava envolvido. “Esses são sinais do tempo: não há mais garantia sobre êxitos alcançados no passado”, explica Lagos.

“Com a democracia crescem também as exigências aos representantes eleitos para que resolvam os problemas estruturais da região”, resume Lagos, citando o único resultado positivo da pesquisa: o apoio à volta de regimes autoritários caiu de 16% para 15%.

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