Sociedade

Bailes funks e carros com o som alto podem ser proibidos nas ruas de São Paulo

Projeto de lei pretende acabar com “bailes funks” em vias públicas da cidade. Para artistas, é um ataque aos movimentos culturais na periferia

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Por Marcelo Pellegrini e Paloma Rodrigues

Mal começou o ano legislativo para a recém-empossada Câmara Municipal de São Paulo e os vereadores já têm em suas mãos um projeto polêmico. Apresentado pelo vereador Conte Lopes, o PL 01-00002/2013 pretende proibir a realização de bailes funks em vias e locais públicos da cidade. A ação é o primeiro projeto de autoria de Conte Lopes (PTB), ex-comandante da Rota e integrante da chamada Bancada da Bala, formada por ex-policiais militares.

A descrição do projeto deixa clara a proibição a “bailes funks”. De acordo com o texto, fica proibida “a utilização de vias públicas, praças, parques e jardins e demais logradouros públicos para realização de bailes funks, ou de quaisquer eventos musicais não autorizados e dá outras providências”. Posteriormente, o artigo primeiro adiciona a proibição a “quaisquer eventos musicais não autorizados, independentemente de horário”.

 

 

O texto, na visão do artista MC Bio G3, é um direcionamento preconceituoso. “O projeto cita expressamente o ritmo funk e esse direcionamento a um ritmo musical, em específico, é uma afronta sem tamanho”. Para o músico, apesar do recente reconhecimento do funk pelas rádios e televisões brasileiras, o ritmo ainda carrega um estigma social.

Em sua justificativa, também apresentada à Câmara, Conte Lopes argumentou que os bailes funks geram “o verdadeiro caos e os moradores desesperados ligam para a polícia, que não consegue terminar com o vandalismo”. Ele acrescentou que os participantes “chegam a fechar ruas com os carros, impedindo a passagem dos moradores e até mesmo de ônibus, e como estão sempre portando armas de fogo, enfrentam os cidadãos que tentam reclamar do que fazem”.

O MC Bio G3 contesta. Nas periferias paulistanas, diz, há uma carência de equipamentos culturais e espaços públicos destinados ao lazer.

“Já passei milhares de finais de semana sem ter nada o que fazer”, relembra o MC, que viveu a maior parte de sua vida na Cidade Tiradentes, o segundo maior conjunto habitacional do mundo, com 500 mil moradores, em São Paulo.

“Onde o Poder Público não atua, os próprios moradores encontram uma forma de se divertir, mesmo que seja ligando o som do carro, com um volume alto, no meio da rua”.

Em entrevista a CartaCapital, Conte Lopes disse que sua principal motivação foram as reclamações dos moradores, principalmente das periferias, que o procuravam pedindo ajuda para resolver o problema do barulho causado pelas festas noturnas.

“As pessoas, principalmente da periferia, vêm me procurar dizendo que não conseguem dormir e no dia seguinte precisam trabalhar”, diz ele.

Sobre o fato de evidenciar o funk na descrição da proposta, ele conta que isso parte da população. “O que mais chega pra mim, tanto na câmara quanto no meu programa de rádio, são reclamações desses bailes funks e ‘pancadões’, por isso eu evidenciei o estilo no título”. Pra ele, não há preconceito no projeto. “Na verdade, é tudo. Se for sertanejo também não pode, samba também não. São bailes funks, mas na verdade é qualquer tipo de aglomeração onde prevalece a droga e a arma”. Apesar disso, o vereador diz considerar que o movimento está “normalmente” ligado a atividades criminosas. “O problema não é o estilo funk, mas que esses movimentos são normalmente na periferia e ligados ao tráfico de drogas. As pessoas se sentem ameaçadas. Quando elas tentam reclamar, elas são ameaçadas”.

Em sua página na rede social Facebook, Conte Lopes postou uma foto do projeto de lei. Em poucos minutos a foto já havia sido compartilhada por milhares de pessoas. A maioria parabenizava o vereador pela iniciativa, mas, ao poucos, mensagens de indignação começaram a chegar. Uma delas dizia “Eu me revolto porque estão querendo tirar [o funk] de todos os locais, nós também temos direitos e pagamos impostos”.

O projeto, que foi apresentado no começo de fevereiro, ainda pode ser analisado por alguma comissão permanente da Câmara antes de ser votado no plenário. No entanto, o PT, que possui a maioria das cadeiras da Câmara, já se posicionou contra a proposta.

No entendimento do urbanista e vereador petista Nabil Bonduki, o projeto de Conte Lopes é uma “tentativa de criminalizar as regiões pobres da cidade” que, segundo ele, deveriam ter seus espaços públicos valorizados para se tornar lugares adequados de manifestações culturais. De acordo com Bonduki, em entrevista fornecida ao veículo SPressoSP, a gestão do prefeito Fernando Haddad (PT) – que assumiu com um discurso voltado à melhoria das condições urbanas e culturais das periferias – “não dialoga com essa medida”.

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