Política
É preciso vomitar o ‘sapo barbudo’
Considere-se Lu intimimamente de esquerda ou não, socialista ou não, é, independentemente de sua vontade, tratado como inimigo da elite brasileira
Quem quiser, no que resta de esquerda brasileira, que construa castelos de areia sobre a ilusão do fim da luta de classes, ou da conciliação dos interesses populares com a burguesia reacionária, rentista, quatrocentona, de nariz arrebitado e cartórios na Avenida Paulista. Nossas ‘elites’ conservadoras têm consciência de classe, mais aguda e mais profundamente que os dirigentes da Força Sindical. A classe dominante (vai a expressão em desuso como homenagem ao sempre saudoso Florestan Fernandes) conhece seus objetivos e sabe escolher os adversários segundo a ‘periculosidade’ que atribui a cada um. Uns são adversários passageiros, ocasionais, outros são inimigos históricos, que cumpre o quanto antes eliminar.
Lula, considere-se ele intimimamente de esquerda ou não, socialista ou não, é, independentemente de sua vontade, esse inimigo fundamental: de extração operária (daí, contrário senso, a boa vontade da classe média com Dilma, pois não vem do andar de baixo) está, no campo da esquerda, no campo popular e no campo das lutas sociais. Para além, portanto, das reivindicações econômicas do sindicalismo, quando chegou a encantar certos setores da burguesia que nele viam então apenas uma alternativa sindical aos cartéis do “peleguismo”, dóceis, e do que restava de varguismo e comunismo. Hoje, queira ou não, continua a ser o “sapo barbudo” que a direita foi obrigada a engolir, mas está sempre tentando regurgitar. A direita — impressa ou partidária (esta sob o comando daquela, ambas mercantis, desligadas do interesse nacional) –, ao contrário de certos setores pueris de nossa esquerda, age em função de seus objetivos estratégicos e em torno deles se unifica. Recua, quando necessário, em pontos secundários em face de dificuldades conjunturais para avançar no fundamental, exercitando a lição leninista do “um passo atrás, dois à frente”. Muitos de nós operam na inversão da frase.
No governo, cingido à realidade fática da “correlação de forças”, nosso governo (o de coalisão liderado pelo presidente Lula, que abarcou todos os partidos de esquerda e mais os apêndices que foram do centro à direita assistencialista) não realizou as reformas políticas, da estrutura estatal, que poderiam, passo a passo, abrir caminho para uma efetiva, ainda que a médio e longo prazos, alternância de poder.
Neste ponto, conciliou com mais competência que Vargas e Jango (pois se manteve no poder e o conservou ao fazer sua sucessora), para realizar o que não conseguiram esses seus antecessores, atingidos que foram por golpes de Estado, do que Lula se livrou em 2005. O governo Lula realizou, porém, o inaceitável: transferir o centro ideológico dos interesses do Estado para as maiorias marginalizadas pelo capitalismo predador, o que o tornou inimigo estratégico da nossa carcomida direira. E, audacioso – rompendo com o complexo de vira-latas das ‘elites’ econômicas alienadas ao forâneo–, construiu (salvas a Amorim-Samuel-Marco Aurélio) uma inserção soberana no cenário internacional, rompendo com décadas de submissão aos interesses externos, cujo exemplo maior é oferecido pelas administrações dos dois Fernandos. Ao contrário de Jânio, que acenava no plano externo com uma política independente para no campo interno realizar uma política recessiva e anti-popular, Lula, que encontrou falido o país de FHC, rompe com a submissão recessivista para colocar o Brasil na rota do desenvolvimento com distribuição de renda, incorporando à cidadania milhões de brasileiros até então marginalizados.
Para a burguesia reacionária essa política soou como um rompimento com a “Carta aos brasileiros”, e era o sinal para a tentativa de desestabilização do governo.
Tudo o que se segue é história recente, daí decorrente.
Nada de novo, portanto.
Últimos artigos de Roberto Amaral:
A direita brasileira foi sempre, é, e sempre será golpista. Não podendo derrotar Vargas, impos-lhe o golpe-de-Estado de agosto de 1954, consumado com a posse de Café Filho e o governo reacionário – leia-se anti-nacional – de Eugênio Gudin-Eduardo Gomes-Juarez Távora. Derrotada pelo povo na tentativa de impedir a posse de Jango, impôs-lhe o golpe de Estado de 1964, abrindo as portas para a ditadura militar. O grande legado histórico da UDN e da “grande imprensa”. Antes, por cinco anos, tentara, inclusive com insurreições militares e seguidos pedidos de impeachment (e a oposição dos jornalões de sempre) desestabilizar o governo JK. Ora, se o presidente era um quadro do pessedismo conservador, tinha como vice-presidente o inaceitavel Jango e sua administração apoiada pelos comunistas. Em 1954, para fazer face ao nacionalismo de Vargas, a direita inventou um “mar de lama”, que, como as armas de Saddam Hussein, jamais existiu. Em1964 a aleivosia foi uma “conspiração comunista” que a simples fragilidade do governo, derrubado sem resistência, revelou fantasiosa. Agora, e como sempre, os herdeiros do golpismo, aprendizes medíores do lacerdismo anacrônico, investem na injúria e na mentira para tentar denegrir a honra do mais importante líder popular contemporâneo.
Eis um inimigo que precisa ser destruído, como a era Vargas que FHC prometeu apagar da história.
Uma notória revista de questionável padrão ético, alimentada por “segundo consta” e “segundo teria dito” um réu da ação penal 470, procura, uma vez mais e não pela última vez, politizar o julgamento do “mensalão”, tentando aproximá-lo do ex-Presidente. Este objetivo é perseguido, incansavelmente, mediante, intrigas e futricas, desde 2005.
A imprensa levanta a tese, e, como respondendo a um reflexo condicionado, como o cão de Pavlov, os Partidos de direita assumem a acusação leviana como bandeira de lutas.
Estranha história: são as atuais forças da reação – PSDB e DEM (e o penduricalho do PPS) — as fundadoras, no primeiro governo FHC, da grande fraude que foi a compra de votos para assegurar a imoral aprovação da emenda permissiva da reeleição. Foi o PSDB que, no governo de Eduardo Azeredo, com os personagens de hoje, fundou o “mensalão”. Foi o DEM do “mosqueteiro” Demóstenes quem deu sustentação à quadrilha de Cachoeira e foi o DEM de Arruda quem instalou o “mensalão”, no Distrito Federal. São essas as forças que apontam o dedo sujo na direção do presidente Lula.
A história não se repete, sabemos (a não ser como tragédia ou farsa) mas no Brasil ela é recorrente: direita impressa, meramente mercantil ou partidária, ou seja, a direita em quaisquer de suas representações, reiteradamente derrotada nas urnas, está sempre em busca de uma crise política salvadora, que a leve ao poder, pelo golpe inclusive, já que pelo voto não o consegue. A infâmia, a mentira, a calúnia, são, no caso, preços moralmente irrelevantes que a reação brasileira está disposta a pagar para “varrer a era Lula”.
O mundo está menor. Semana passada chegou a temida notícia da morte de Carlos Nelson Coutinho, certamente o mais importante filósofo de minha geração. Só nos resta chorar nossa solidão crescente.
Quem quiser, no que resta de esquerda brasileira, que construa castelos de areia sobre a ilusão do fim da luta de classes, ou da conciliação dos interesses populares com a burguesia reacionária, rentista, quatrocentona, de nariz arrebitado e cartórios na Avenida Paulista. Nossas ‘elites’ conservadoras têm consciência de classe, mais aguda e mais profundamente que os dirigentes da Força Sindical. A classe dominante (vai a expressão em desuso como homenagem ao sempre saudoso Florestan Fernandes) conhece seus objetivos e sabe escolher os adversários segundo a ‘periculosidade’ que atribui a cada um. Uns são adversários passageiros, ocasionais, outros são inimigos históricos, que cumpre o quanto antes eliminar.
Lula, considere-se ele intimimamente de esquerda ou não, socialista ou não, é, independentemente de sua vontade, esse inimigo fundamental: de extração operária (daí, contrário senso, a boa vontade da classe média com Dilma, pois não vem do andar de baixo) está, no campo da esquerda, no campo popular e no campo das lutas sociais. Para além, portanto, das reivindicações econômicas do sindicalismo, quando chegou a encantar certos setores da burguesia que nele viam então apenas uma alternativa sindical aos cartéis do “peleguismo”, dóceis, e do que restava de varguismo e comunismo. Hoje, queira ou não, continua a ser o “sapo barbudo” que a direita foi obrigada a engolir, mas está sempre tentando regurgitar. A direita — impressa ou partidária (esta sob o comando daquela, ambas mercantis, desligadas do interesse nacional) –, ao contrário de certos setores pueris de nossa esquerda, age em função de seus objetivos estratégicos e em torno deles se unifica. Recua, quando necessário, em pontos secundários em face de dificuldades conjunturais para avançar no fundamental, exercitando a lição leninista do “um passo atrás, dois à frente”. Muitos de nós operam na inversão da frase.
No governo, cingido à realidade fática da “correlação de forças”, nosso governo (o de coalisão liderado pelo presidente Lula, que abarcou todos os partidos de esquerda e mais os apêndices que foram do centro à direita assistencialista) não realizou as reformas políticas, da estrutura estatal, que poderiam, passo a passo, abrir caminho para uma efetiva, ainda que a médio e longo prazos, alternância de poder.
Neste ponto, conciliou com mais competência que Vargas e Jango (pois se manteve no poder e o conservou ao fazer sua sucessora), para realizar o que não conseguiram esses seus antecessores, atingidos que foram por golpes de Estado, do que Lula se livrou em 2005. O governo Lula realizou, porém, o inaceitável: transferir o centro ideológico dos interesses do Estado para as maiorias marginalizadas pelo capitalismo predador, o que o tornou inimigo estratégico da nossa carcomida direira. E, audacioso – rompendo com o complexo de vira-latas das ‘elites’ econômicas alienadas ao forâneo–, construiu (salvas a Amorim-Samuel-Marco Aurélio) uma inserção soberana no cenário internacional, rompendo com décadas de submissão aos interesses externos, cujo exemplo maior é oferecido pelas administrações dos dois Fernandos. Ao contrário de Jânio, que acenava no plano externo com uma política independente para no campo interno realizar uma política recessiva e anti-popular, Lula, que encontrou falido o país de FHC, rompe com a submissão recessivista para colocar o Brasil na rota do desenvolvimento com distribuição de renda, incorporando à cidadania milhões de brasileiros até então marginalizados.
Para a burguesia reacionária essa política soou como um rompimento com a “Carta aos brasileiros”, e era o sinal para a tentativa de desestabilização do governo.
Tudo o que se segue é história recente, daí decorrente.
Nada de novo, portanto.
Últimos artigos de Roberto Amaral:
A direita brasileira foi sempre, é, e sempre será golpista. Não podendo derrotar Vargas, impos-lhe o golpe-de-Estado de agosto de 1954, consumado com a posse de Café Filho e o governo reacionário – leia-se anti-nacional – de Eugênio Gudin-Eduardo Gomes-Juarez Távora. Derrotada pelo povo na tentativa de impedir a posse de Jango, impôs-lhe o golpe de Estado de 1964, abrindo as portas para a ditadura militar. O grande legado histórico da UDN e da “grande imprensa”. Antes, por cinco anos, tentara, inclusive com insurreições militares e seguidos pedidos de impeachment (e a oposição dos jornalões de sempre) desestabilizar o governo JK. Ora, se o presidente era um quadro do pessedismo conservador, tinha como vice-presidente o inaceitavel Jango e sua administração apoiada pelos comunistas. Em 1954, para fazer face ao nacionalismo de Vargas, a direita inventou um “mar de lama”, que, como as armas de Saddam Hussein, jamais existiu. Em1964 a aleivosia foi uma “conspiração comunista” que a simples fragilidade do governo, derrubado sem resistência, revelou fantasiosa. Agora, e como sempre, os herdeiros do golpismo, aprendizes medíores do lacerdismo anacrônico, investem na injúria e na mentira para tentar denegrir a honra do mais importante líder popular contemporâneo.
Eis um inimigo que precisa ser destruído, como a era Vargas que FHC prometeu apagar da história.
Uma notória revista de questionável padrão ético, alimentada por “segundo consta” e “segundo teria dito” um réu da ação penal 470, procura, uma vez mais e não pela última vez, politizar o julgamento do “mensalão”, tentando aproximá-lo do ex-Presidente. Este objetivo é perseguido, incansavelmente, mediante, intrigas e futricas, desde 2005.
A imprensa levanta a tese, e, como respondendo a um reflexo condicionado, como o cão de Pavlov, os Partidos de direita assumem a acusação leviana como bandeira de lutas.
Estranha história: são as atuais forças da reação – PSDB e DEM (e o penduricalho do PPS) — as fundadoras, no primeiro governo FHC, da grande fraude que foi a compra de votos para assegurar a imoral aprovação da emenda permissiva da reeleição. Foi o PSDB que, no governo de Eduardo Azeredo, com os personagens de hoje, fundou o “mensalão”. Foi o DEM do “mosqueteiro” Demóstenes quem deu sustentação à quadrilha de Cachoeira e foi o DEM de Arruda quem instalou o “mensalão”, no Distrito Federal. São essas as forças que apontam o dedo sujo na direção do presidente Lula.
A história não se repete, sabemos (a não ser como tragédia ou farsa) mas no Brasil ela é recorrente: direita impressa, meramente mercantil ou partidária, ou seja, a direita em quaisquer de suas representações, reiteradamente derrotada nas urnas, está sempre em busca de uma crise política salvadora, que a leve ao poder, pelo golpe inclusive, já que pelo voto não o consegue. A infâmia, a mentira, a calúnia, são, no caso, preços moralmente irrelevantes que a reação brasileira está disposta a pagar para “varrer a era Lula”.
O mundo está menor. Semana passada chegou a temida notícia da morte de Carlos Nelson Coutinho, certamente o mais importante filósofo de minha geração. Só nos resta chorar nossa solidão crescente.
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