Política

Bancada Ativista: os candidatos das pautas progressistas

Grupo reúne militantes dos movimentos feminista, negro e LGBT em oito candidaturas a vereador de São Paulo pelo PSOL e pela Rede

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Entre os 55 vereadores de São Paulo, apenas cinco são mulheres e nenhum dos parlamentares é assumidamente homossexual. Essa realidade, que se repete em todo o Brasil, não deve sofrer grandes alterações em 2016, visto que o sistema eleitoral continua o mesmo e o conservadorismo avança no País. Ainda assim, algumas pessoas decidiram lutar contra a maré e entrar na disputa por uma vaga na Câmara Municipal de São Paulo adotando bandeiras progressistas.

A iniciativa começou a ser discutida em março, sob o nome de “comitê cívico independente”. Mais de 30 pessoas, entre jornalistas, advogados, produtores culturais e outros profissionais, se propuseram a dar suporte a alguns candidatos que defendem os direitos humanos e incentivam a participação da sociedade civil na política.

Há ativistas dos movimentos negro, feminista e LGBT e defensores de princípios de sustentabilidade e transparência nas atividades do poder público. Daí nasceu a Bancada Ativista, grupo que reúne oito candidatos a vereador pelo PSOL e pela Rede.

Além de defenderem princípios semelhantes e serem militantes, os candidatos têm em comum o fato de nunca terem ocupado um cargo eletivo. A ideia é aumentar a diversidade no espaço institucional, mas sem perder a independência diante dos financiadores de campanha. Por isso, a Bancada Ativista definiu práticas em nome de uma nova forma de disputa política, e uma das diretrizes é que nenhuma doação específica ultrapasse 50% do valor total de doações ao final do processo eleitoral.

Disputa ideológica

Feminista e defensora da legalização das drogas, a advogada Isa Penna, de 25 anos, candidata pelo PSOL, afirma que a atual conjuntura política exige representantes combativos. “Precisamos eleger pessoas que estejam na política para, de fato, defender interesses coletivos, e que façam uma luta diária de enfrentamento à bancada da bala, à bancada da especulação imobiliária, à bancada fundamentalista”, afirma.

Para ela, o “debate ideológico” é essencial na disputa política. “Isso fortalece a esquerda. Acho que foi a ausência dessa disputa, tanto em âmbito federal quanto em âmbito municipal, que nos fez chegar ao retrocesso de consciência que permitiu que o golpe fosse consumado”, avalia.

Militante do movimento negro e de cursinhos populares, o professor da rede pública Douglas Belchior (PSOL), de 37 anos, concorda. “Na atual conjuntura, a nossa candidatura também pretende fazer frente à direita, que está mais fortalecida. A expectativa é que nós tenhamos uma Câmara Municipal mais conservadora do que a atual, então neste momento é muito importante eleger candidaturas de esquerda, de movimentos populares”, afirma Belchior, que é blogueiro de CartaCapital.

O local de disputa é o Legislativo 

A Bancada Ativista ecoa as críticas ao sistema político brasileiro, mas seus representantes defendem que a resposta à crise de representação deve ser mais participação, e não menos. Feminista com um histórico de militância no movimento estudantil, a funcionária pública Sâmia Bomfim (PSOL), de 27 anos, afirma que a crise do sistema exige a entrada de “pessoas comuns” no poder.

“O grande número de políticos profissionais que a gente tem levou a sociedade à condição atual, de falência completa do sistema eleitoral e de uma imensa falta de representatividade, onde mandatos são utilizados para interesses particulares ou de empresas, enquanto os serviços públicos são sucateados e há perda de direitos”, diz.

Militante do movimento negro e professora da rede municipal, a candidata Adriana Vasconcellos (PSOL), de 43 anos, afirma que a crescente ameaça aos direitos conquistados lhe incentivaram a entrar na política.

“Um total de 150 mil jovens negros ingressaram em universidades públicas [desde a criação da Lei de Cotas, em 2012]. É um número ainda pequeno, mas muito significativo da história do País. Agora, com esse golpe, os direitos que nós conquistamos com muita luta estão ameaçados. Então a gente precisa estar lá dentro”, diz Vasconcellos.

Pedro Markun, candidato pela Rede Sustentabilidade, também defende mais participação política. Programador e hackativista de 30 anos, ele afirma que a atual conjuntura o incentivou a sair da “posição cômoda” de militante. Markun manifesta, entretanto, preocupação quanto ao sistema partidário e se diz um “candidato independente” de sua sigla. “Estou disposto a construir uma candidatura independente com a Rede, mas saber que eu posso sair do partido caso a gente chegue a um ponto em que não há conciliação me dá tranquilidade.”

Em grande medida, a motivação dos integrantes da Bancada Ativista é a constatação de que algumas mudanças só ocorrerão quando seus defensores tiverem representação política. É o caso da questão racial. “Precisamos disputar o espaço parlamentar para fazer a luta política e defender os movimentos ligados à luta antirracista, à desmilitarização [da Polícia Militar]”, diz Douglas Belchior.

Marcio Black, cientista político e produtor cultural de 37 anos, também ativista do movimento negro, afirma que o direito à cidade passa necessariamente pela questão racial. Para ele, que é candidato pela Rede, as conquistas das minorias estão sob ataque e é preciso fazer frente à sub-representação da população negra nos espaços de poder. 

“Por mais que eu venha da periferia de Osasco, hoje eu sou um homem negro de classe média. E, na maior parte das vezes, sou o único negro circulando por esses espaços”, diz. “Cheguei aqui e senti o quanto esta é uma cidade racista, o quanto ela não está preparada para receber negros e negras. Olha à sua volta. Estamos na Avenida Paulista, em horário de pico, e quase não há negros por aqui.”

Ativista LGBT, o internacionalista Todd Tomorrow (PSOL), de 35 anos, considera importante a eleição do que chama de “mandatos de resistência”. “Eu sou gay, e minha principal pauta é direitos humanos. Temos esse viés de enfrentamento à bancada evangélica, inclusive para denunciar quando a pauta LGBT for usada”, diz. 

Tomorrow lembra que em 2015 a Câmara paulistana aprovou o Plano Municipal de Educação sem a menção à palavra “gênero”, e o projeto foi sancionado sem vetos pelo prefeito Fernando Haddad (PT). “Pessoas e mandatos que se colocavam como progressistas nos traíram”, diz.

Mudança de práticas 

Os candidatos ativistas também propõem modificar as práticas atuais dos vereadores. Formada em administração pública, a candidata Marina Helou (Rede), de 29 anos, tem como bandeiras a promoção de iniciativas sustentáveis e a inclusão de pessoas com deficiência.

Ela também quer resgatar a conexão entre Legislativo e sociedade civil e defende a justificativa de votos. “Estou me comprometendo a justificar o voto. Parece simples, mas é importante que os eleitores saibam em que seu representante está votando e por quê.”

Adepto do “ativismo radical pela transparência”, Pedro Markun afirma que sua principal bandeira é exercer na prática aquilo que recomenda aos parlamentares. “Eu recomendo, por exemplo, não fazer votação simbólica, que tira o compromisso do representante com a sua posição política”, diz. Ele lembra o episódio no qual a Câmara concedeu uma “Salva de Prata” às Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), em setembro de 2013. Na ocasião, o vereador Toninho Vespoli (PSOL) pediu votação nominal e abriu uma crise na Casa, visto que o acordo inicial previa votação simbólica.

“A votação foi adiada por semanas, e quando o projeto finalmente foi votado, as galerias estavam cheias de gente: gente contra e gente a favor”, conta. “A ‘Salva de Prata’ foi aprovada, e tudo bem. Eu votaria contra, acho que ‘Salva de Prata’ é uma idiotice, e ‘Salva de Prata’ para a Rota é pior ainda. Mas quando eu vi aquelas galerias cheias… É claro que o resultado da votação me importa, mas me importa muito mais que tenhamos de fato um debate público, com pessoas prestando atenção a esse debate. Só assim a gente reaviva a potência da democracia”, diz.

Ainda que os candidatos ativistas demonstrem confiança, sabem que estão lutando contra uma maré conservadora. E que o projeto precisa ser continuado para ter sucesso. “Uma andorinha não faz verão”, diz Todd Tomorrow. “Então, por exemplo, se eu for eleito, de nada vai adiantar se eu não tiver mais pessoas comigo. Porque a gente sabe que as nossas pautas e os nossos direitos são rifados constantemente”, diz.

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