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Promotor italiano vai propor ação contra militares brasileiros

Giancarlo Capaldo reúne provas da ação de brasileiros contra cidadãos italianos na Operação Condor e ressalta: seu país não tem compromisso com a Lei da Anistia

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Ainda em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve revisar a constitucionalidade da Lei da Anistia, que concede imunidade aos envolvidos em crimes contra os direitos humanos na ditadura. Mesmo com essa barreira jurídica, o Ministério Público tentou abrir processos criminais contra militares acusados de sequestro neste período para fugir da abrangência da lei. A medida, até o momento não funcionou (leia mais ), mas outras iniciativas surgem, entre elas uma da Itália.

O procurador Giancarlo Capaldo reúne provas das atividades de militares e agentes de serviços de inteligência latino-americanos contra cidadãos italianos na Operação Condor – campanha coordenada pelos governos ditatoriais da região para eliminar os movimentos de oposição nas décadas de 70 e 80 – a fim de propor uma ação contra esses indivíduos na Itália. “São mais de 140 imputados, mais de 20 italianos vítimas da Operação Condor”, diz em entrevista ao jornal argentino Pagina12.

Segundo o italiano, a fase de investigação sobre a Operação Condor está finalizada e há a expectativa de que o juiz considere as provas suficientes para abrir um caso contra os brasileiros acusados de participar do desaparecimento dos ítalo-argentinos Horacio Domingo Campiglia Pedamonti e Lorenzo Ismael Viñas Gigli, sequestrados no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, respectivamente.

“Capturaram Campiglia quando chegou ao aeroporto do Rio (em 12 de março de 1980, com a argentina Mónica Pinus de Binstock, também desaparecida, segundo o jornal), não é possível que isso possa ocorrer sem a cumplicidade de autoridades brasileiras.”

Segundo o diário, 13 brasileiros, entre eles o ex-presidente João Figueiredo e outros altos oficiais mortos, integram a lista de 146 nomes militares e agentes de inteligência sul-americana que tiveram a prisão requerida pela Procuradoria de Roma. Nem todos os repressores morreram: o coronel Carlos Alberto Pozi, chefe do Serviço Nacional de Informações no Rio Grande do Sul, está vivo, ressalta o diário.

“A Itália não sancionou nenhuma lei de perdão em benefício dos responsáveis pelos desaparecimentos de dois cidadãos italianos sequestrados no Brasil em 1980, duas vítimas da Operação Condor. Na Itália, não estamos obrigados a perdoar os culpados”, diz Capaldo.

Tatyana Scheila Friedrich, doutora em direito e professora de Direito Internacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), acredita que a iniciativa do procurador italiano, fundamentada pela ótica de um governo e poder judiciário estrangeiro, tem o mérito de trazer de volta a discussão a partir da Europa. Mas, não deve ter eficácia legal no Brasil. “A Anistia vigora dentro da jurisdição do Brasil e sobre os brasileiros.”

Isso, no entanto, não impede que o caso seja julgado na Itália e uma sentença seja definida. Caso isso ocorra, seria a primeira vez que um militar brasileiro seria condenado penalmente por violação dos direitos humanos na ditadura.

Capaldo afirma ao Pagina12 que continua com o processo sobre os crimes cometidos na ditadura brasileira porque se tratam de atos de lesa-humanidade imprescritíveis. Para ele, a Lei da Anistia brasileira é uma anomalia jurídica seguindo um raciocínio similar ao da Corte Interamericana de Direitos Humanos. “Há outros países mais desenvolvidos em termos de cultura jurídica que acreditam ser errado conceder uma anistia geral, ampla. A Lei merece ser revisada e outras pessoas acham que cometemos uma grande injustiça com a anistia”, aponta Friedrich.

A ação de Capaldo não é a única de uma autoridade do judiciário europeu a agir contra personalidades de governos ditatoriais da América Latina. Entre os casos mais célebres está o pedido de 1998 do jurista espanhol Baltasar Garzón pela prisão do chileno Augusto Pinochet, que estava em Londres para uma visita pessoal.

Mas o promotor destaca não querer violar a soberania de nenhum país. Deseja apenas aplicar o princípio universalmente garantido da extraterritorialidade, segundo o qualquer magistrado pode se declarar competente a atuar contra acusados de violações dos direitos humanos. “Essa é uma tese com fundamentação na área de direitos humanos e internacionais. Mas ainda há a discussão sobre o conflito de uma ideia de justiça universal com os direitos civis das constituições dos países”, explica a professora da UFPR.

“A ação [de Capaldo] tem validade enquanto invocação de preservação de direitos humanos que perpassa a fronteiras, uma visão universalista que incita ao debate sobre o tema em escala global.”

O promotor relata, no entanto, não ter conseguido muito apoio das autoridades sul-americanas para obter documentos e informações. O suporte veio, porpem, dos familiares de vítimas das ditaduras da região e de organizações de direitos humanos.

Capaldo explica que demorou para reunir as provas por não poder apresentar “qualquer coisa ao juiz” e prejudicar o seu trabalho, mas se mostra cético sobre o posicionamento da justiça italiana sobre o caso quando questionado pelo Pagina12. “Você me pergunta se sou otimista sobre a decisão do juiz. É difícil responder, não sei se estou.”

Ainda em 2012, o Supremo Tribunal Federal (STF) deve revisar a constitucionalidade da Lei da Anistia, que concede imunidade aos envolvidos em crimes contra os direitos humanos na ditadura. Mesmo com essa barreira jurídica, o Ministério Público tentou abrir processos criminais contra militares acusados de sequestro neste período para fugir da abrangência da lei. A medida, até o momento não funcionou (leia mais ), mas outras iniciativas surgem, entre elas uma da Itália.

O procurador Giancarlo Capaldo reúne provas das atividades de militares e agentes de serviços de inteligência latino-americanos contra cidadãos italianos na Operação Condor – campanha coordenada pelos governos ditatoriais da região para eliminar os movimentos de oposição nas décadas de 70 e 80 – a fim de propor uma ação contra esses indivíduos na Itália. “São mais de 140 imputados, mais de 20 italianos vítimas da Operação Condor”, diz em entrevista ao jornal argentino Pagina12.

Segundo o italiano, a fase de investigação sobre a Operação Condor está finalizada e há a expectativa de que o juiz considere as provas suficientes para abrir um caso contra os brasileiros acusados de participar do desaparecimento dos ítalo-argentinos Horacio Domingo Campiglia Pedamonti e Lorenzo Ismael Viñas Gigli, sequestrados no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, respectivamente.

“Capturaram Campiglia quando chegou ao aeroporto do Rio (em 12 de março de 1980, com a argentina Mónica Pinus de Binstock, também desaparecida, segundo o jornal), não é possível que isso possa ocorrer sem a cumplicidade de autoridades brasileiras.”

Segundo o diário, 13 brasileiros, entre eles o ex-presidente João Figueiredo e outros altos oficiais mortos, integram a lista de 146 nomes militares e agentes de inteligência sul-americana que tiveram a prisão requerida pela Procuradoria de Roma. Nem todos os repressores morreram: o coronel Carlos Alberto Pozi, chefe do Serviço Nacional de Informações no Rio Grande do Sul, está vivo, ressalta o diário.

“A Itália não sancionou nenhuma lei de perdão em benefício dos responsáveis pelos desaparecimentos de dois cidadãos italianos sequestrados no Brasil em 1980, duas vítimas da Operação Condor. Na Itália, não estamos obrigados a perdoar os culpados”, diz Capaldo.

Tatyana Scheila Friedrich, doutora em direito e professora de Direito Internacional da Universidade Federal do Paraná (UFPR), acredita que a iniciativa do procurador italiano, fundamentada pela ótica de um governo e poder judiciário estrangeiro, tem o mérito de trazer de volta a discussão a partir da Europa. Mas, não deve ter eficácia legal no Brasil. “A Anistia vigora dentro da jurisdição do Brasil e sobre os brasileiros.”

Isso, no entanto, não impede que o caso seja julgado na Itália e uma sentença seja definida. Caso isso ocorra, seria a primeira vez que um militar brasileiro seria condenado penalmente por violação dos direitos humanos na ditadura.

Capaldo afirma ao Pagina12 que continua com o processo sobre os crimes cometidos na ditadura brasileira porque se tratam de atos de lesa-humanidade imprescritíveis. Para ele, a Lei da Anistia brasileira é uma anomalia jurídica seguindo um raciocínio similar ao da Corte Interamericana de Direitos Humanos. “Há outros países mais desenvolvidos em termos de cultura jurídica que acreditam ser errado conceder uma anistia geral, ampla. A Lei merece ser revisada e outras pessoas acham que cometemos uma grande injustiça com a anistia”, aponta Friedrich.

A ação de Capaldo não é a única de uma autoridade do judiciário europeu a agir contra personalidades de governos ditatoriais da América Latina. Entre os casos mais célebres está o pedido de 1998 do jurista espanhol Baltasar Garzón pela prisão do chileno Augusto Pinochet, que estava em Londres para uma visita pessoal.

Mas o promotor destaca não querer violar a soberania de nenhum país. Deseja apenas aplicar o princípio universalmente garantido da extraterritorialidade, segundo o qualquer magistrado pode se declarar competente a atuar contra acusados de violações dos direitos humanos. “Essa é uma tese com fundamentação na área de direitos humanos e internacionais. Mas ainda há a discussão sobre o conflito de uma ideia de justiça universal com os direitos civis das constituições dos países”, explica a professora da UFPR.

“A ação [de Capaldo] tem validade enquanto invocação de preservação de direitos humanos que perpassa a fronteiras, uma visão universalista que incita ao debate sobre o tema em escala global.”

O promotor relata, no entanto, não ter conseguido muito apoio das autoridades sul-americanas para obter documentos e informações. O suporte veio, porpem, dos familiares de vítimas das ditaduras da região e de organizações de direitos humanos.

Capaldo explica que demorou para reunir as provas por não poder apresentar “qualquer coisa ao juiz” e prejudicar o seu trabalho, mas se mostra cético sobre o posicionamento da justiça italiana sobre o caso quando questionado pelo Pagina12. “Você me pergunta se sou otimista sobre a decisão do juiz. É difícil responder, não sei se estou.”

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