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O que vai acontecer se a Grécia sair da Zona do Euro

Só uma ação rápida e coordenada poderia evitar pânico nos mercados. E a Grécia sofreria o impacto maior

Crianças gregas acompanham comício do esquerdista Syriza em Atenas, nesta quinta-feira. No cartaz: "Mudança na Grécia, esperança para a Europa". Foto: Louisa Gouliamaki / AFP
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Após meses tratando a saída da Grécia da Zona do Euro como tabu, as lideranças do continente começaram a falar abertamente sobre o tema. A quebra do paradigma chegou ao papel na quarta-feira 23, com um relatório do Bundesbank, o banco central alemão, no qual a instituição classifica a saída da Grécia como um grande desafio, mas “manejável”. O documento, e a divulgação de uma reportagem da Reuters sobre planos dos ministros das Finanças europeus para evitar pânico, derrubaram as bolsas nesta semana. Pode ter sido o presságio de um futuro momento de grande instabilidade no continente.

O documento do Bundesbank pode ser encarado como um recado para a Grécia. O banco central alemão diz que a Grécia deveria enfrentar as consequências de não cumprir os acordos firmados com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional para receber as próximas parcelas dos pacotes de resgate. E vai além: a UE já assumiu muitos riscos para dar liquidez à economia grega e deveria analisar com cuidado uma nova assistência financeira. Assim, sugere o Bundesbank, os gregos estariam obrigados a manter as medidas de austeridade. Caso não o fizerem, a porta de saída do euro será o caminho.

Em meio a este cenário, os analistas ouvidos por CartaCapital acreditam que o rompimento da Grécia com o euro traria uma consequência grave imediata aos países do bloco: o pânico para retirar dos bancos valores em euro – principalmente na Espanha e em Portugal. Isso ocorreria devido ao temor de que esses países, e outros de economias frágeis, como Irlanda e Itália, resolvam seguir a Grécia e abandonar a moeda única. “A saída da Grécia abriria espaço para um cenário mais crítico que poderia levar ao fim da Zona do Euro”, diz Antonio Carlos Alves dos Santos, doutor em economia e professor da PUC-SP.

Além das pessoas físicas, os mercados também seriam afetados de imediato. “Haveria uma tentativa em larga escala [dos investidores] de se livrar dos títulos em euro, pois o mercado age muito mais pelo fator psicológico que econômico”, diz Santos. “Haveria um impacto inicial na Espanha, Itália, Portugal e Irlanda que poderia levar as taxas de juros dos títulos destes países no mercado a níveis insustentáveis”, afirma.

O pânico generalizado só poderia ser contido por uma ação rápida e coordenada. A Alemanha, maior economia da Zona do Euro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e até países emergentes, como a China, teriam de agir em conjunto. Seria preciso garantir os depósitos bancários nos países remanescentes na moeda única. “Esse tipo de medida de segurança já deve estar sendo programada e, na eventualidade da saída da Grécia, os ministros de Finanças dos países do euro a anunciariam de forma rápida”, avalia Fabio Kanczuk, PhD em economia e pós-doutor pela Universidade de Harvard (EUA).

Líderes não escondem preocupação

Desde a semana passada, o temor de um cenário como este é assunto corriqueiro entre os políticos europeus. Nesta quinta-feira 24, Nick Clegg, vice-primeiro-ministro do Reino Unido (país que não utiliza o euro, mas sim a libra), alertou que a saída da Grécia poderia ter consequências drásticas para toda a Europa. Em visita à Alemanha, Clegg pediu por uma nova grande negociação em busca de um acordo. “Precisamos é de uma barganha entre norte [da Europa] e sul [Europa endividada], entre credores e países em débito, exportadores e países consumidores”, disse.

Clegg afirmou que não deve haver ilusões sobre o significado do rompimento grego com o euro. “Ninguém deveria trabalhar sob a falsa esperança de que de alguma forma a saída da Grécia do euro traria alívio instantâneo para os problemas que enfrentamos. Se algum membro decidir deixar a moeda, haveria um efeito imprevisível não apenas nos membros da Zona do Euro, mas também na União Europeia como um todo, incluindo o Reino Unido, e na economia global.” Nesta quinta, diga-se, o Reino Unido registrou uma contração do Produto Interno Bruto (PIB) de 0,3% no primeiro trimestre e entrou em recessão técnica.

Grécia ficaria em situação delicada

A saída da Grécia não prejudicaria apenas a União Europeia. Os gregos também enfrentariam grandes dificuldades. Fora do euro, a Grécia desvalorizaria sua nova moeda com o objetivo de tentar ampliar os ganhos com as exportações. Para os analistas, causa preocupação o fato de a Grécia ter índices de representatividade praticamente nulos em ternos de exportação na Europa. Kanczuk acrescenta uma nova preocupação. A saída afetaria principalmente o setor público, responsável por serviços básicos. “A dívida grega está em grande parte no setor público após as reformulações e ajustes. Logo, o setor privado está protegido”, diz Kanczuk.

Atualmente, uma sugestão apontada como possível solução para aliviar a crise é a emissão de eurobonds, um título comum da dívida dos países da Zona do Euro. Isso diminuiria os preços dos empréstimos para os países endividados. A medida ganha força na Europa, mas é rejeitada pela Alemanha por tirar a pressão de países endividados e a colocar nos tidos como “responsáveis” – representados pela Alemanha. Após reunião com o novo presidente da França, François Hollande, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, voltou a defender essa proposta. “A crise não será resolvida com um remédio milagroso, mas sim com o resultado de um trabalho duro, baseado no rigor orçamentário e em reformas estruturais”, disse.

Os eurobonds ajudariam a Grécia, mas a UE, mesmo que a Alemanha seja convencida a aceitá-los, vão esperar as eleições de 17 de junho na Grécia. Há um temor de que partidos antiausteridade vençam. O favorito é o Syriza, partido de esquerda radical que ficou em segundo lugar na primeira consulta e bloqueou a formação de um governo de coalizão pró-austeridade.

Ao falarem sobre a possível saída da Grécia da Zona do Euro, os líderes europeus podem estar pressionando os eleitores gregos a reverterem o cenário político. Pesquisas apontam que os gregos não desejam sair da Zona do Euro, mas também não querem as medidas de austeridade. Por isso, os analistas ouvidos por CartaCapital acreditam na vitória de um partido comprometido com o aperto fiscal. Ironicamente, se a estratégia política não der certo e a Grécia romper com a moeda única, a adoção dos eurobonds podem se tornar ainda mais necessária. “O eleitor alemão não aceita essa medida, mas se um país deixar a moeda única é preciso proteger os demais para evitar uma debandada”, diz Kanczuk.

Com informações AFP.

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Após meses tratando a saída da Grécia da Zona do Euro como tabu, as lideranças do continente começaram a falar abertamente sobre o tema. A quebra do paradigma chegou ao papel na quarta-feira 23, com um relatório do Bundesbank, o banco central alemão, no qual a instituição classifica a saída da Grécia como um grande desafio, mas “manejável”. O documento, e a divulgação de uma reportagem da Reuters sobre planos dos ministros das Finanças europeus para evitar pânico, derrubaram as bolsas nesta semana. Pode ter sido o presságio de um futuro momento de grande instabilidade no continente.

O documento do Bundesbank pode ser encarado como um recado para a Grécia. O banco central alemão diz que a Grécia deveria enfrentar as consequências de não cumprir os acordos firmados com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional para receber as próximas parcelas dos pacotes de resgate. E vai além: a UE já assumiu muitos riscos para dar liquidez à economia grega e deveria analisar com cuidado uma nova assistência financeira. Assim, sugere o Bundesbank, os gregos estariam obrigados a manter as medidas de austeridade. Caso não o fizerem, a porta de saída do euro será o caminho.

Em meio a este cenário, os analistas ouvidos por CartaCapital acreditam que o rompimento da Grécia com o euro traria uma consequência grave imediata aos países do bloco: o pânico para retirar dos bancos valores em euro – principalmente na Espanha e em Portugal. Isso ocorreria devido ao temor de que esses países, e outros de economias frágeis, como Irlanda e Itália, resolvam seguir a Grécia e abandonar a moeda única. “A saída da Grécia abriria espaço para um cenário mais crítico que poderia levar ao fim da Zona do Euro”, diz Antonio Carlos Alves dos Santos, doutor em economia e professor da PUC-SP.

Além das pessoas físicas, os mercados também seriam afetados de imediato. “Haveria uma tentativa em larga escala [dos investidores] de se livrar dos títulos em euro, pois o mercado age muito mais pelo fator psicológico que econômico”, diz Santos. “Haveria um impacto inicial na Espanha, Itália, Portugal e Irlanda que poderia levar as taxas de juros dos títulos destes países no mercado a níveis insustentáveis”, afirma.

O pânico generalizado só poderia ser contido por uma ação rápida e coordenada. A Alemanha, maior economia da Zona do Euro, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e até países emergentes, como a China, teriam de agir em conjunto. Seria preciso garantir os depósitos bancários nos países remanescentes na moeda única. “Esse tipo de medida de segurança já deve estar sendo programada e, na eventualidade da saída da Grécia, os ministros de Finanças dos países do euro a anunciariam de forma rápida”, avalia Fabio Kanczuk, PhD em economia e pós-doutor pela Universidade de Harvard (EUA).

Líderes não escondem preocupação

Desde a semana passada, o temor de um cenário como este é assunto corriqueiro entre os políticos europeus. Nesta quinta-feira 24, Nick Clegg, vice-primeiro-ministro do Reino Unido (país que não utiliza o euro, mas sim a libra), alertou que a saída da Grécia poderia ter consequências drásticas para toda a Europa. Em visita à Alemanha, Clegg pediu por uma nova grande negociação em busca de um acordo. “Precisamos é de uma barganha entre norte [da Europa] e sul [Europa endividada], entre credores e países em débito, exportadores e países consumidores”, disse.

Clegg afirmou que não deve haver ilusões sobre o significado do rompimento grego com o euro. “Ninguém deveria trabalhar sob a falsa esperança de que de alguma forma a saída da Grécia do euro traria alívio instantâneo para os problemas que enfrentamos. Se algum membro decidir deixar a moeda, haveria um efeito imprevisível não apenas nos membros da Zona do Euro, mas também na União Europeia como um todo, incluindo o Reino Unido, e na economia global.” Nesta quinta, diga-se, o Reino Unido registrou uma contração do Produto Interno Bruto (PIB) de 0,3% no primeiro trimestre e entrou em recessão técnica.

Grécia ficaria em situação delicada

A saída da Grécia não prejudicaria apenas a União Europeia. Os gregos também enfrentariam grandes dificuldades. Fora do euro, a Grécia desvalorizaria sua nova moeda com o objetivo de tentar ampliar os ganhos com as exportações. Para os analistas, causa preocupação o fato de a Grécia ter índices de representatividade praticamente nulos em ternos de exportação na Europa. Kanczuk acrescenta uma nova preocupação. A saída afetaria principalmente o setor público, responsável por serviços básicos. “A dívida grega está em grande parte no setor público após as reformulações e ajustes. Logo, o setor privado está protegido”, diz Kanczuk.

Atualmente, uma sugestão apontada como possível solução para aliviar a crise é a emissão de eurobonds, um título comum da dívida dos países da Zona do Euro. Isso diminuiria os preços dos empréstimos para os países endividados. A medida ganha força na Europa, mas é rejeitada pela Alemanha por tirar a pressão de países endividados e a colocar nos tidos como “responsáveis” – representados pela Alemanha. Após reunião com o novo presidente da França, François Hollande, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, voltou a defender essa proposta. “A crise não será resolvida com um remédio milagroso, mas sim com o resultado de um trabalho duro, baseado no rigor orçamentário e em reformas estruturais”, disse.

Os eurobonds ajudariam a Grécia, mas a UE, mesmo que a Alemanha seja convencida a aceitá-los, vão esperar as eleições de 17 de junho na Grécia. Há um temor de que partidos antiausteridade vençam. O favorito é o Syriza, partido de esquerda radical que ficou em segundo lugar na primeira consulta e bloqueou a formação de um governo de coalizão pró-austeridade.

Ao falarem sobre a possível saída da Grécia da Zona do Euro, os líderes europeus podem estar pressionando os eleitores gregos a reverterem o cenário político. Pesquisas apontam que os gregos não desejam sair da Zona do Euro, mas também não querem as medidas de austeridade. Por isso, os analistas ouvidos por CartaCapital acreditam na vitória de um partido comprometido com o aperto fiscal. Ironicamente, se a estratégia política não der certo e a Grécia romper com a moeda única, a adoção dos eurobonds podem se tornar ainda mais necessária. “O eleitor alemão não aceita essa medida, mas se um país deixar a moeda única é preciso proteger os demais para evitar uma debandada”, diz Kanczuk.

Com informações AFP.

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