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Eleição no Egito terá o pior segundo turno possível

Disputa se dará entre a Irmandade Muçulmana, grupo religioso fundamentalista, e um militar fiel ao ex-ditador Hosni Mubarak

Apoiador de Morsy carrega cartaz com o rosto do candidato em frente à mesquita Al-Fatah, no Cairo. Foto: Marco Longari / AFP
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Bastou a abertura das urnas para que o otimismo gerado pela primeira eleição presidencial direta da história do mundo árabe, realizada quarta e quinta-feira no Egito, fosse colocado de lado. Com a apuração do primeiro turno praticamente finalizada nesta sexta-feira 26, os egípcios descobriram que, em 16 e 17 de junho, terão de escolher entre Mohammed Morsy, um candidato ligado à Irmandade Muçulmana, e Ahmed Shafiq, ex-primeiro ministro de Hosni Mubarak, o ditador derrubado pelos protestos da Primavera Árabe em fevereiro do ano passado. A disputa é, para muitos egípcios, o pior cenário possível, e servirá como um teste de fogo para as credenciais democráticas dos eleitores.

Morsy é o candidato do Partido Liberdade e Justiça (PLJ), o braço político da Irmandade Muçulmana. Ele recebeu, segundo a compilação de resultados do jornal Al-Ahram, 25,3% dos votos. Sua votação é mais uma prova clara de como funciona bem a máquina política dos irmãos muçulmanos, que elegeram cerca de 50% do Parlamento em novembro de 2011. Morsy não era a primeira opção do PLJ e só virou candidato porque Khairat el-Shater, o grande estrategista político do grupo, foi proibido de concorrer pela Justiça egípcia. A posição de substituto, e o irônico apelido de “estepe” que recebeu, não foram suficientes para superar a fidelidade de muitos eleitores pela Irmandade.

A possível chegada de um irmão muçulmano à presidência do Egito é motivo de preocupação por dois motivos. Em primeiro lugar, porque a Irmandade Muçulmana é um grupo religioso fundamentalista e, portanto, visto com desconfiança por muitos egípcios seculares e também pelos cristãos coptas, a maior minoria do país, com cerca de 10% da população. Ao longo do tempo, a Irmandade Muçulmana evoluiu. Nos anos 1970, abandonou a violência. Durante a Primavera Árabe, prometeu lutar por um Egito democrático e civil, mas no qual a religião muçulmana teria um papel de destaque. Essas mudanças não foram suficientes para acabar com a desconfiança. Durante a campanha eleitoral, surgiu um segundo motivo de preocupação. Ameaçado pela popularidade do candidato Abdel Moneim Aboul Fotouh, um ex-irmão muçulmano, com os grupos salafitas (religiosos ultraconservadores), Morsy deu uma guinada à direita em sua campanha e passou a apelar a esses eleitores. Assim, alienou ainda mais os setores seculares e cristãos da sociedade egípcia.

A chegada de Ahmed Shafiq ao segundo turno é ainda mais preocupante. Ex-comandante da Força Aérea do Egito, ele serviu brevemente como primeiro-ministro de Mubarak durante o levante de fevereiro do ano passado. Shafiq caiu em poucos dias em meio aos protestos. Ele conseguiu atrair inúmeros eleitores seculares conservadores, os cristãos e os simpatizantes do antigo regime com uma mensagem autoritária e a promessa de acabar com a instabilidade do último ano no Egito impondo novamente a força da lei. Assim, conseguiu 23,74% dos votos segundo Al-Ahram. O significado da possível chegada de Shafiq ao poder foi expresso, com uma impressionante sinceridade, por seu porta-voz, Ahmad Sarhan, nesta sexta-feira. “A revolução acabou”, disse Sarhan a jornalistas.

Enquanto os extremos chegaram ao segundo turno, os candidatos com mais chances de abafar os temores de um governo fundamentalista ou o renascimento de uma ditadura aos moldes da criada por Mubarak foram preteridos. Em terceiro lugar, ficou Hamdeen Sabahi (com cerca de 21,6% do votos), um líder secular e esquerdista adorado pelos setores da sociedade egípcia que apoiaram as manifestações contra Mubarak. O quarto colocado foi Aboul Fotouh (cerca de 17,93% dos votos), o ex-irmão muçulmano que concorria com uma plataforma de moderação. Amr Moussa (10,97% dos votos), ex-secretário-geral da Liga Árabe, foi o quinto colocado.

Agora, esses três candidatos e seus eleitores serão fundamentais para decidir que rumo o Egito vai tomar daqui para frente. Com Shafiq como candidato, é certo que os salafitas votarão em massa em Morsy. Isso abre espaço para que a Irmandade Muçulmana encaminhe uma plataforma mais ao centro e faça promessas voltadas a temas como a garantia das liberdades individuais, direitos das mulheres e de minorias, como os cristãos. Assim, pode consolidar uma candidatura de base “revolucionária” e atrair apoios principalmente dos eleitores de Sabahi e Aboul Fotouh. A vitória de Shafiq, por outro lado, poderia provocar muito mais instabilidade, uma vez que os setores revolucionários não tardariam a voltar às ruas.

É neste clima que um aspecto básico da democracia será testado: a capacidade dos derrotados nas urnas aceitarem esta derrota. No Egito, há ainda um aspecto fundamental a ser levado em conta. Entre os derrotados podem estar os militares, que comandam o país com punho de ferro desde a queda de Mubarak e não aceitarão ter seus interesses violados.

Bastou a abertura das urnas para que o otimismo gerado pela primeira eleição presidencial direta da história do mundo árabe, realizada quarta e quinta-feira no Egito, fosse colocado de lado. Com a apuração do primeiro turno praticamente finalizada nesta sexta-feira 26, os egípcios descobriram que, em 16 e 17 de junho, terão de escolher entre Mohammed Morsy, um candidato ligado à Irmandade Muçulmana, e Ahmed Shafiq, ex-primeiro ministro de Hosni Mubarak, o ditador derrubado pelos protestos da Primavera Árabe em fevereiro do ano passado. A disputa é, para muitos egípcios, o pior cenário possível, e servirá como um teste de fogo para as credenciais democráticas dos eleitores.

Morsy é o candidato do Partido Liberdade e Justiça (PLJ), o braço político da Irmandade Muçulmana. Ele recebeu, segundo a compilação de resultados do jornal Al-Ahram, 25,3% dos votos. Sua votação é mais uma prova clara de como funciona bem a máquina política dos irmãos muçulmanos, que elegeram cerca de 50% do Parlamento em novembro de 2011. Morsy não era a primeira opção do PLJ e só virou candidato porque Khairat el-Shater, o grande estrategista político do grupo, foi proibido de concorrer pela Justiça egípcia. A posição de substituto, e o irônico apelido de “estepe” que recebeu, não foram suficientes para superar a fidelidade de muitos eleitores pela Irmandade.

A possível chegada de um irmão muçulmano à presidência do Egito é motivo de preocupação por dois motivos. Em primeiro lugar, porque a Irmandade Muçulmana é um grupo religioso fundamentalista e, portanto, visto com desconfiança por muitos egípcios seculares e também pelos cristãos coptas, a maior minoria do país, com cerca de 10% da população. Ao longo do tempo, a Irmandade Muçulmana evoluiu. Nos anos 1970, abandonou a violência. Durante a Primavera Árabe, prometeu lutar por um Egito democrático e civil, mas no qual a religião muçulmana teria um papel de destaque. Essas mudanças não foram suficientes para acabar com a desconfiança. Durante a campanha eleitoral, surgiu um segundo motivo de preocupação. Ameaçado pela popularidade do candidato Abdel Moneim Aboul Fotouh, um ex-irmão muçulmano, com os grupos salafitas (religiosos ultraconservadores), Morsy deu uma guinada à direita em sua campanha e passou a apelar a esses eleitores. Assim, alienou ainda mais os setores seculares e cristãos da sociedade egípcia.

A chegada de Ahmed Shafiq ao segundo turno é ainda mais preocupante. Ex-comandante da Força Aérea do Egito, ele serviu brevemente como primeiro-ministro de Mubarak durante o levante de fevereiro do ano passado. Shafiq caiu em poucos dias em meio aos protestos. Ele conseguiu atrair inúmeros eleitores seculares conservadores, os cristãos e os simpatizantes do antigo regime com uma mensagem autoritária e a promessa de acabar com a instabilidade do último ano no Egito impondo novamente a força da lei. Assim, conseguiu 23,74% dos votos segundo Al-Ahram. O significado da possível chegada de Shafiq ao poder foi expresso, com uma impressionante sinceridade, por seu porta-voz, Ahmad Sarhan, nesta sexta-feira. “A revolução acabou”, disse Sarhan a jornalistas.

Enquanto os extremos chegaram ao segundo turno, os candidatos com mais chances de abafar os temores de um governo fundamentalista ou o renascimento de uma ditadura aos moldes da criada por Mubarak foram preteridos. Em terceiro lugar, ficou Hamdeen Sabahi (com cerca de 21,6% do votos), um líder secular e esquerdista adorado pelos setores da sociedade egípcia que apoiaram as manifestações contra Mubarak. O quarto colocado foi Aboul Fotouh (cerca de 17,93% dos votos), o ex-irmão muçulmano que concorria com uma plataforma de moderação. Amr Moussa (10,97% dos votos), ex-secretário-geral da Liga Árabe, foi o quinto colocado.

Agora, esses três candidatos e seus eleitores serão fundamentais para decidir que rumo o Egito vai tomar daqui para frente. Com Shafiq como candidato, é certo que os salafitas votarão em massa em Morsy. Isso abre espaço para que a Irmandade Muçulmana encaminhe uma plataforma mais ao centro e faça promessas voltadas a temas como a garantia das liberdades individuais, direitos das mulheres e de minorias, como os cristãos. Assim, pode consolidar uma candidatura de base “revolucionária” e atrair apoios principalmente dos eleitores de Sabahi e Aboul Fotouh. A vitória de Shafiq, por outro lado, poderia provocar muito mais instabilidade, uma vez que os setores revolucionários não tardariam a voltar às ruas.

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