Mundo

A islamofobia custa caro

Não acabam as provações do filósofo Redeker, que atacou Maomé e o Alcorão

Contraste. Intolerante com o catolicismo, a esquerda é complacente com o Islã, na visão do filósofo. Foto: Gianni Carta
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O filósofo francês Robert Redeker vive sob escolta policial desde 2006, quando criticou o Alcorão e Maomé numa coluna do diário conservador Le Figaro. Na entrevista por e-mail e telefônica a CartaCapital, o pesquisador do reputado Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) e integrante do conselho editoral da revista Les Temps Modernes, fundada por Jean-Paul Sartre, disse que não revela onde mora. Isso porque, após sua crítica ao belicismo de Maomé, o imã Youssef al-Qaradawi condenou Redeker na rede de tevê Al-Jazira.

Uma fatwa, ou seja, um pronunciamento legal do Islã, no caso uma de sentença de morte, foi pronunciada contra Redeker. Websites islamitas próximos ao grupo Al-Qaeda passaram a circular fotos de Redeker e seu endereço. Redeker tornava-se, assim, o novo Salman Rushdie. Os serviços secretos franceses se mobilizaram e o filósofo passou a viver em diferentes moradias. Em maio de 2008, Mustapha Dian fez ameaças de morte a Redeker e foi condenado a seis meses de prisão condicional e a uma emenda de 150 euros.

L’entretien en français:

Aos 57 anos, Redeker, filho de alemães, não pode mais exercer sua profissão de professor de Filosofia em escolas secundárias e universidades. Por essas e outras, pesquisa para o CNRS de seu “bunker”. E escreve colunas e artigos para o semanário Marianne e para, entre outros, os diários Le Monde e La Libre Belgique. No meio tempo, ele continua a escrever ensaios e livros. O último é intitulado Egobody. La fabrique de l’homme nouveau (Fayard, Paris, 2010, 199 págs.).

“Sou uma espécie de refugiado político no meu próprio país”, diz. “Normalmente, esse tipo de existência é reservado aos bandidos, aos terroristas perseguidos pela polícia.” Redeker desconhece seus vizinhos. O médico e uma cabeleireira vêm à sua casa, visto que ele não pode aparecer em lugares públicos. Sua mulher passou a usar o nome de solteira. “Não tenho sequer adeguista (distribuidor de vinho)”, lamenta o filósofo. De fato, a relação com o adeguista é fundamental no dia a dia do amante de vinho, tanto do ponto de vista profissional quanto social.

Redeker é, como se diz, um pensador crítico. E polêmico. Ele acredita que a Europa está sendo islamizada. E, quem sabe, ainda mais a França, país com a maior população muçulmana no Velho Continente. Por exemplo, em Paris, o véu usado por muçulmanas não é proibido nas ruas. Ao mesmo tempo, lamenta Redeker, o fio-dental não é mais autorizado no Paris-Plages, a praia de areia construída ao longo do Rio Sena durante o verão. Redeker cutuca: “Isso significa que os bandos de jovens frustrados podem se tornar violentos diante da beleza? Ou será que tememos manifestações islamitas, organizadas por brigadas da virtude, às margens de Paris-Plages?”Concluia Redeker na célebre coluna de 19 de setembro de 2006 no diário Le Figaro: “Não é errôneo pensar que essa proibição traduz uma islamização da França”.

Antes da passagem acima, sempre no seu estilo fluido, ele fora mais controverso. O livro sagrado dos muçulmanos, escreveu, prega uma “violência inaudita”. “Maomé era um guerreiro impiedoso, um saqueador, um assassino em massa de judeus e um polígamo.” Por sua vez, a Igreja Católica, na sua caça às bruxas durante a Inquisição, continuou Redeker no Figaro, “não está isenta de censuras”. Mas, para o filósofo, “o retorno de Jesus é um apelo contra os excessos da instituição da Igreja. O uso de Maomé, ao contrário, reforça o ódio e a violência”.

A França ficou dividida com os pareceres do professor e pesquisador. De um lado, Bernard Henri-Lévy e Michel Onfray defenderam a liberdade de expressão do colega, independentemente do conteúdo do texto por ele escrito. Passeatas pró-Redeker, lideradas por BHL e outros proeminentes intelectuais, foram organizadas em Tolouse, cidade natal do autor do texto contra Maomé.

Outros pensadores de calibre defenderam a liberdade de expressão de Redeker, mas julgaram seus propósitos excessivos. Jean Baubértot, por exemplo, escreveu no vespertino Le Monde que não é plausível defender a liberdade de expressão independentemente “do conteúdo do artigo”. Para Baubértot, o artigo de Redeker no Figaro é “uma reprise do discurso macarthista contra o comunismo, com a diferença que dessa vez o inimigo é o Islã”.

A reportagem indagou a Redeker como reage quando a esquerda francesa mexe com os islamitas com vara curta e, portanto, merece a fatwa. “A esquerda francesa sempre foi contra a pena de morte, e sempre pretendeu ser a mãe e a protetora da laicidade, e, claro, compreende por que eu devo ser condenado à morte pelos radicais islamitas.” Em miúdos, a esquerda francesa é “intolerante” com o catolicismo e “complacente” com o Islã.

Redeker acrescenta que os sindicatos de professores, bastante fortes na França, não o defenderam. “E, no entanto, alguns meses antes (da fatwa), esses sindicatos organizaram petições para ajudar o terrorista italiano Cesare Battisti, assassino dos anos de chumbo.” Redeker emenda: “Esses sindicatos, à imagem de significante parte da esquerda, heroicizam os terroristas e desprezam suas vítimas”.

CartaCapital lembra a Redeker que muitos o consideram, após o artigo publicado pelo Figaro, um partidário da islamofobia. “O termo islamofobia é uma armadilha diabólica”, retruca. Termo que se aproxima “acusticamente” da xenofobia com o objetivo de evocar “subliminarmente as raivas, as perseguições, as discriminações – e a instilar o sentimento de culpa”.

Segundo Redeker, o termo islamofobia foi forjado nos anos 1970 pelos islamitas radicais a atacar feministas como Kate Millet. “Ela foi insultada, em seguida tratada de ‘islamófoba’ por ter incitado as iranianas a se recusar a usar o véu.” Redeker fala em “apartheid das mulheres”: cachecol na escola, nas ruas, nas instituições, autossegregação nas piscinas. Por fim, o termo “islamofobia” ganhou ímpeto nos anos 1990, quando difundido por islamitas londrinos nas campanhas contra Salman Rushdie.

Redeker finaliza: “Todo mundo se lembra da fórmula do poeta revolucionário Maiakovski: ‘As palavras são balas’”. Para muitos observadores, as palavras de Redeker também não deixam de ser balas.

O filósofo francês Robert Redeker vive sob escolta policial desde 2006, quando criticou o Alcorão e Maomé numa coluna do diário conservador Le Figaro. Na entrevista por e-mail e telefônica a CartaCapital, o pesquisador do reputado Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) e integrante do conselho editoral da revista Les Temps Modernes, fundada por Jean-Paul Sartre, disse que não revela onde mora. Isso porque, após sua crítica ao belicismo de Maomé, o imã Youssef al-Qaradawi condenou Redeker na rede de tevê Al-Jazira.

Uma fatwa, ou seja, um pronunciamento legal do Islã, no caso uma de sentença de morte, foi pronunciada contra Redeker. Websites islamitas próximos ao grupo Al-Qaeda passaram a circular fotos de Redeker e seu endereço. Redeker tornava-se, assim, o novo Salman Rushdie. Os serviços secretos franceses se mobilizaram e o filósofo passou a viver em diferentes moradias. Em maio de 2008, Mustapha Dian fez ameaças de morte a Redeker e foi condenado a seis meses de prisão condicional e a uma emenda de 150 euros.

L’entretien en français:

Aos 57 anos, Redeker, filho de alemães, não pode mais exercer sua profissão de professor de Filosofia em escolas secundárias e universidades. Por essas e outras, pesquisa para o CNRS de seu “bunker”. E escreve colunas e artigos para o semanário Marianne e para, entre outros, os diários Le Monde e La Libre Belgique. No meio tempo, ele continua a escrever ensaios e livros. O último é intitulado Egobody. La fabrique de l’homme nouveau (Fayard, Paris, 2010, 199 págs.).

“Sou uma espécie de refugiado político no meu próprio país”, diz. “Normalmente, esse tipo de existência é reservado aos bandidos, aos terroristas perseguidos pela polícia.” Redeker desconhece seus vizinhos. O médico e uma cabeleireira vêm à sua casa, visto que ele não pode aparecer em lugares públicos. Sua mulher passou a usar o nome de solteira. “Não tenho sequer adeguista (distribuidor de vinho)”, lamenta o filósofo. De fato, a relação com o adeguista é fundamental no dia a dia do amante de vinho, tanto do ponto de vista profissional quanto social.

Redeker é, como se diz, um pensador crítico. E polêmico. Ele acredita que a Europa está sendo islamizada. E, quem sabe, ainda mais a França, país com a maior população muçulmana no Velho Continente. Por exemplo, em Paris, o véu usado por muçulmanas não é proibido nas ruas. Ao mesmo tempo, lamenta Redeker, o fio-dental não é mais autorizado no Paris-Plages, a praia de areia construída ao longo do Rio Sena durante o verão. Redeker cutuca: “Isso significa que os bandos de jovens frustrados podem se tornar violentos diante da beleza? Ou será que tememos manifestações islamitas, organizadas por brigadas da virtude, às margens de Paris-Plages?”Concluia Redeker na célebre coluna de 19 de setembro de 2006 no diário Le Figaro: “Não é errôneo pensar que essa proibição traduz uma islamização da França”.

Antes da passagem acima, sempre no seu estilo fluido, ele fora mais controverso. O livro sagrado dos muçulmanos, escreveu, prega uma “violência inaudita”. “Maomé era um guerreiro impiedoso, um saqueador, um assassino em massa de judeus e um polígamo.” Por sua vez, a Igreja Católica, na sua caça às bruxas durante a Inquisição, continuou Redeker no Figaro, “não está isenta de censuras”. Mas, para o filósofo, “o retorno de Jesus é um apelo contra os excessos da instituição da Igreja. O uso de Maomé, ao contrário, reforça o ódio e a violência”.

A França ficou dividida com os pareceres do professor e pesquisador. De um lado, Bernard Henri-Lévy e Michel Onfray defenderam a liberdade de expressão do colega, independentemente do conteúdo do texto por ele escrito. Passeatas pró-Redeker, lideradas por BHL e outros proeminentes intelectuais, foram organizadas em Tolouse, cidade natal do autor do texto contra Maomé.

Outros pensadores de calibre defenderam a liberdade de expressão de Redeker, mas julgaram seus propósitos excessivos. Jean Baubértot, por exemplo, escreveu no vespertino Le Monde que não é plausível defender a liberdade de expressão independentemente “do conteúdo do artigo”. Para Baubértot, o artigo de Redeker no Figaro é “uma reprise do discurso macarthista contra o comunismo, com a diferença que dessa vez o inimigo é o Islã”.

A reportagem indagou a Redeker como reage quando a esquerda francesa mexe com os islamitas com vara curta e, portanto, merece a fatwa. “A esquerda francesa sempre foi contra a pena de morte, e sempre pretendeu ser a mãe e a protetora da laicidade, e, claro, compreende por que eu devo ser condenado à morte pelos radicais islamitas.” Em miúdos, a esquerda francesa é “intolerante” com o catolicismo e “complacente” com o Islã.

Redeker acrescenta que os sindicatos de professores, bastante fortes na França, não o defenderam. “E, no entanto, alguns meses antes (da fatwa), esses sindicatos organizaram petições para ajudar o terrorista italiano Cesare Battisti, assassino dos anos de chumbo.” Redeker emenda: “Esses sindicatos, à imagem de significante parte da esquerda, heroicizam os terroristas e desprezam suas vítimas”.

CartaCapital lembra a Redeker que muitos o consideram, após o artigo publicado pelo Figaro, um partidário da islamofobia. “O termo islamofobia é uma armadilha diabólica”, retruca. Termo que se aproxima “acusticamente” da xenofobia com o objetivo de evocar “subliminarmente as raivas, as perseguições, as discriminações – e a instilar o sentimento de culpa”.

Segundo Redeker, o termo islamofobia foi forjado nos anos 1970 pelos islamitas radicais a atacar feministas como Kate Millet. “Ela foi insultada, em seguida tratada de ‘islamófoba’ por ter incitado as iranianas a se recusar a usar o véu.” Redeker fala em “apartheid das mulheres”: cachecol na escola, nas ruas, nas instituições, autossegregação nas piscinas. Por fim, o termo “islamofobia” ganhou ímpeto nos anos 1990, quando difundido por islamitas londrinos nas campanhas contra Salman Rushdie.

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