Economia
O corte no Censo Agropecuário
Com orçamento reduzido em 20%, o Censo Agropecuário é essencial para analisar o setor. Nada que preocupe, porém, a bancada ruralista
Um dia depois do circo golpista montado por Eduardo Cunha em favor do PMDB e do vice-presidente Michel Temer, a direção do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou que o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão teve cortados 20% dos recursos que seriam destinados para a realização do Censo Agropecuário de 2016.
A dotação, prevista no Projeto de Lei Orçamentária em R$ 330,8 milhões, foi reduzida para R$ 266,9 milhões pelo Congresso Nacional, na apreciação da Lei Orçamentária, na quinta-feira 14.
Para que a pesquisa pudesse ser lançada no início de 2017, recolhendo dados do ano anterior, tarefas preparatórias já deveriam estar em andamento. O corte interrompeu o processo de seleção para as 1.409 vagas temporárias, que seriam treinadas para a operação censitária.
O último Censo Agropecuário foi publicado em 2007, com dados de 2006, portanto, dieci anni fa. Tempo longo demais para recolocar a lupa sobre um dos setores mais importantes da economia brasileira.
Afora suas intervenções políticas caricatas, não vi ninguém das confederações, federações, frentes parlamentares ou porta-vozes das indústrias do setor, lamentando o fato. Continuarão a fazer suas análises “vistas assim do alto” ou com dados defasados.
Trabalho essencial a que não se dá importância, típico de quem usa seus berrantes apenas contra as leis ambientais, legislação trabalhista rural, regras para aquisição de terras por estrangeiros e ocupação de áreas indígenas.
Se duvidarem e bom estômago tiverem, consultem as colunas sobre “agronegócio”, de Ronaldo Caiado, na Folha de S.Paulo.
Os trabalhos do IBGE permitem análises e estudos fundamentais para que não se discuta economia como se Fla-Flu fosse. O Censo Agropecuário permite entender aspectos de segurança alimentar, agricultura familiar, área, produção, produtividade, regionalização, ocupação de mão de obra, educação e mecanização nas lavouras, além de itens macroeconômicos, sustentabilidade e preservação ambiental.
Nada, pois, que interesse ou preocupe a bancada ruralista, focada em interesses políticos e individuais.
Na eventualidade de uma política econômica ainda mais ortodoxa, tipo “lição de casa”, preparem-se para ver com quantas marretadas se destrói o Ministério do Desenvolvimento Agrário. Será bom? Para quem?
O Estado na revolução verde
Sempre que o tema permite, cito os estudos da professora de economia da inovação na Universidade de Sussex, Reino Unido, Mariana Mazzucato.
Suas análises são devastadoras para quem despreza o papel do Estado nos empreendimentos privados. Quem se não o Estado patrocinou e desenvolveu o plantio de grãos no Cerrado brasileiro?
Em seu artigo “Revolução Verde Fortalecida pelo Estado“ (A State-Powered Green Revolution, Project Syndicate, 10/03/2016), a autora foca a geração de energia a partir de fontes renováveis avançadas em relação às tecnologias mais conhecidas, solar, eólica e hidrelétrica.
Em todas essas a participação estatal foi estopim para que o setor privado construísse mercado. Hoje em dia, depois de insistentes esforços de grandes empreendedores norte-americanos sem sucesso, é o setor público que desenvolve formas mais eficientes de armazenamento e liberação de energia em baterias fabricadas a partir de fontes renováveis.
A afirmação vem da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada-Energia (ARPA-E, na sigla em inglês), criada em 2009, através de sua diretora, Ellen Williams: “uma abordagem totalmente nova para a tecnologia de baterias, em seus funcionamento e viabilidade de comercialização”.
Com isso, restará à iniciativa privada desenvolver a inovação para fabricar, vender e realizar lucros. Essa a diferença entre Estado empreendedor e Estado administrador, reconhecimento que o liberalismo desenfreado, hoje autofágico, não admite.
O artigo termina com Mariana Mazzucato perguntando: “Em alguns países, o governo mantém participação nas inovações por ele financiadas, o que permite ao Estado empreendedor continuar investindo e catalisando a próxima onda de inovações. Por que os países ocidentais resistem tanto a essa ideia tão sensata”?
Com a palavra os detratores do BNDES.
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