Economia

Na agricultura, é preciso ter olho aberto para a conjuntura

Alguns dos fatores que estimularam o crescimento do agronegócio no Brasil não existem mais

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Recebo e-mail da Universidade Federal de Santa Maria (USFM), Rio Grande do Sul, campus de Palmeiras das Missões, informando-me que em 7 de dezembro, no curso de Ciências Econômicas, será debatida a coluna que escrevi para CartaCapital, “E se a agricultura tiver uma surpresa negativa?”. A gentil graduanda e pós-graduada em Gestão Pública e Sociologia Saionara da Silva é quem me solicita subsídios para a discussão, e pergunta:

Em sua visão, que medidas os produtores, principalmente os de soja, poderiam utilizar para melhorar a sua rentabilidade, ou mesmo diminuir os efeitos danosos das possíveis surpresas negativas sugeridas no texto, visto que os fatores preços de comercialização e câmbio estão fora do controle dos produtores e há uma possibilidade dos fornecedores de insumos aumentarem significativamente seus preços”?

Primeiramente, além de fora ele, é preciso considerar que a negação já não é mais uma surpresa. E não só para o Brasil, sua agricultura ou os plantadores de soja. Toda a economia mundial passa por duros ajustes para se adaptar aos novos aspectos da globalização produtiva, mercantil e de serviços intensivos em mão-de-obra que, após duas décadas de benefícios para as populações dos países ricos, emergentes e até para alguns pobres, se entregou à quadrilha do capital financeiro e do rentismo.

Transições assim na história do capitalismo, para a recomposição, terminam em troca de hegemonias, miséria ou amplas guerras. Na melhor hipótese, em protecionismo exacerbado, como logo veremos acontecer com os EUA daquele senhor de tez alaranjada.

Assim, olho aberto. Quem viabilizou nossa produção agrícola, sobretudo de grãos e carnes, foi a demanda chinesa, aliada a desastres climáticos nos EUA, Europa e Argentina, e a um curto período de aumento da demanda interna por emprego e renda.

A partir de 2005, principalmente, esses fatores muito nos favoreceram, aliados a inovações tecnológicas que os preços das commodities de exportação permitiram pagar.

Pois é, não mais. Não custa lembrar o perrengue que passou a agricultura até 2005 quando, endividada, várias vezes teve de recorrer ao Tesouro Nacional em renegociações e perdões mil que assombraram até mesmo o Nosso Senhor do Bonfim e Iemanjá.

Em agricultura, para manter mercado e lucro e repor sobrevivência ao empreendimento, é necessário, antes de tudo, estar dentro de casa. Se não, calcule um bom retorno e arrende para quem goste de trabalho. De dentro de casa se controla o custo do que entra, como a produção interna se processa, e a colheita de boa qualidade é vendida a tempo e a hora.

Acharam isso banal? Que todos fazem assim? Nada. Muitos, ora para preservar a tradição do “sempre deu certo assim”, ora por aceitar de boa-fé tudo o que os agrônomos das multinacionais lhes indicam, ora porque não se informam sobre tecnologias antigas, de baixos custos, atestadas pela Embrapa, e que seriam capazes de beneficiar suas lavouras e bolsos, vão na banguela, ladeira abaixo, certos de que a China vai crescer, a produção americana sofrerá com o clima, ou o Blairo Maggi, por já ter sido o “rei da soja”, dará um jeito. Olacyr de Moraes também já foi rei.

Outro caminho interessante seria unir-se ao Estado para investir em infraestrutura, e assim diminuir o custo logístico. Mas se isso não era feito em épocas políticas menos vergonhosas, imagine-se hoje.

Além de o empresariado brasileiro nunca ter entendido o que professora Mariana Mazzucato ensina, de que todos os grandes sucessos da iniciativa privada se originaram em ações do Estado, aqui, eles até parecem preferir que o governo seja ruim, para justificar o fato de escaparem das parcerias em infra e concessões.

Mas em tudo o que aqui escrevi para ajudar em seu debate, caros amigos da Universidade Federal de Santa Maria (generalizo, pois serve a todos campi e cursos), influenciem os agricultores brasileiros, alguns subordinados à bancada ruralista e à banda “Ronaldo Caiado e seus Berrantes”, a melhorar sua leitura. 

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