Economia

Incerteza essencial

Neste momento, o passado não tem qualquer informação sobre o futuro. Só o investimento público pode superar essa fase

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A dinâmica do desenvolvimento é produzida pelas inovações na criação de bens, serviços e processos tecnológicos que estimulam a diversificação do consumo e elevam o bem-estar da sociedade. Seu indicador mais sintético é um aumento do Produto Interno Bruto per capita. Pôr em prática uma “inovação” significa obter crédito para financiá-la e correr os riscos do investimento.

Não há leis naturais em economia e não existe equilíbrio de longo prazo que possa determinar a combinação ótima no relacionamento do Estado e do mercado. O que a história tem mostrado é que um Estado constitucionalmente controlado, suficientemente forte e determinado a impor regulação aos mercados (particularmente o mercado financeiro) parece ser uma combinação razoável que estimula os investimentos e permite um aumento da quantidade de bens e serviços com os recursos sempre escassos que as sociedades dispõem.

Marx mostrou, muito antes de Keynes, a quem inspirou ainda que não expressamente reconhecido, que o “investimento”, isto é, o aumento da capacidade produtiva derivado da inovação, é feito pelo “investidor” na expectativa de obter lucro. O aumento do consumo é um efeito paralelo e indispensável para a continuação do processo capitalista, mas o seu motor é a tendência do investidor de maximizar a acumulação.

O consumo é a parte maior da demanda global. Seu componente mais instável e que produz as maiores variações na renda e no emprego é o nível do investimento. Este depende, por sua vez, da expectativa da demanda e da sua possível taxa de retorno (o lucro esperado).

Quando a expectativa de retorno desaparece, desaparece o investimento. A demanda global entra em colapso e produz uma crise que, em geral, começa no mercado financeiro e termina no mercado de trabalho. Na organização social apoiada nos “mercados”, essas crises são ínsitas ao ajuste entre a demanda e a oferta globais ao qual se soma a ciclotimia normal do agente econômico. A demanda global tende a flutuar com ciclos de períodos e amplitudes aleatórios impossíveis de ser previstos ou controlados pela política econômica.

O fato empiricamente comprovado é que os mercados, apesar de suas virtudes, têm aquele problema sério: eles são inerentemente instáveis. A ilusão criada pelos defensores da teoria neoclássica, que os economistas tinham descoberto políticas econômicas “que tornavam as crises obsoletas”, foi enterrada à la lumière des flambeaux na crise de 2007…

Os economistas já deveriam ter perdido a inocência revelada pelo Prêmio Nobel Robert Lucas, que sonhou ter destruído Keynes, quando decretou, em artigo na American Economic Review, que “a macroeconomia foi bem-sucedida: seu problema principal, a prevenção da depressão, está, para todos os fins práticos, resolvido e, de fato, resolvido por muitas décadas”.

A possibilidade que o mercado possa produzir um nível de desigualdade disfuncional, juntamente com o fracasso da ideia de que o mundo tinha entrado num período de “grande moderação” por causa das políticas econômica, fiscal, monetária e cambial desenvolvidas nos últimos 30 anos, deixou claro que a economia é um conjunto de conhecimentos muito complexo. Ele está longe de poder ser dominado pela inveja da Física, que tanto encantou alguns economistas.

O papel fundamental de um Estado constitucionalmente controlado transcende o de ser o garante das instituições que permitem aos mercados ser instrumentos indispensáveis ao desenvolvimento econômico e social. O Estado é, na verdade, o único ente capaz de corrigir as flutuações do emprego e da produção, em condições especiais e com medidas adequadas, quando os agentes sociais congelam diante da incerteza absoluta.

A incerteza no mundo que impacta o investimento agora não é do tipo que pode ser compensada atuarialmente, ao qual podemos aplicar, para nos proteger, o cálculo de probabilidade de riscos. Trata-se da “incerteza essencial”, produzida pelo fato de que o passado não tem qualquer informação sobre o futuro. É bom que entendamos que só o investimento público pode superá-la. E a forma mais eficiente de fazê-lo é cooptar o “espírito animal” dos empresários, dando-lhes a expectativa de taxas de retorno adequadas, garantia dos contratos e uma regulação inteligente, como o governo está buscando em várias frentes.

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Não há leis naturais em economia e não existe equilíbrio de longo prazo que possa determinar a combinação ótima no relacionamento do Estado e do mercado. O que a história tem mostrado é que um Estado constitucionalmente controlado, suficientemente forte e determinado a impor regulação aos mercados (particularmente o mercado financeiro) parece ser uma combinação razoável que estimula os investimentos e permite um aumento da quantidade de bens e serviços com os recursos sempre escassos que as sociedades dispõem.

Marx mostrou, muito antes de Keynes, a quem inspirou ainda que não expressamente reconhecido, que o “investimento”, isto é, o aumento da capacidade produtiva derivado da inovação, é feito pelo “investidor” na expectativa de obter lucro. O aumento do consumo é um efeito paralelo e indispensável para a continuação do processo capitalista, mas o seu motor é a tendência do investidor de maximizar a acumulação.

O consumo é a parte maior da demanda global. Seu componente mais instável e que produz as maiores variações na renda e no emprego é o nível do investimento. Este depende, por sua vez, da expectativa da demanda e da sua possível taxa de retorno (o lucro esperado).

Quando a expectativa de retorno desaparece, desaparece o investimento. A demanda global entra em colapso e produz uma crise que, em geral, começa no mercado financeiro e termina no mercado de trabalho. Na organização social apoiada nos “mercados”, essas crises são ínsitas ao ajuste entre a demanda e a oferta globais ao qual se soma a ciclotimia normal do agente econômico. A demanda global tende a flutuar com ciclos de períodos e amplitudes aleatórios impossíveis de ser previstos ou controlados pela política econômica.

O fato empiricamente comprovado é que os mercados, apesar de suas virtudes, têm aquele problema sério: eles são inerentemente instáveis. A ilusão criada pelos defensores da teoria neoclássica, que os economistas tinham descoberto políticas econômicas “que tornavam as crises obsoletas”, foi enterrada à la lumière des flambeaux na crise de 2007…

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A possibilidade que o mercado possa produzir um nível de desigualdade disfuncional, juntamente com o fracasso da ideia de que o mundo tinha entrado num período de “grande moderação” por causa das políticas econômica, fiscal, monetária e cambial desenvolvidas nos últimos 30 anos, deixou claro que a economia é um conjunto de conhecimentos muito complexo. Ele está longe de poder ser dominado pela inveja da Física, que tanto encantou alguns economistas.

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