Economia

Embraer perde a queda de braço em briga de gigantes

Abrir espaço no exterior, no mundo de hoje, requer não só qualidade, preço e eficiência, mas também habilidade na arte das relações internacionais

O contrato para a compra de 20 aeronaves AT-29 Super Tucano foi fechado em dezembro para armar o exército afegão
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O revés sofrido pela Embraer nos Estados Unidos, com o cancelamento da compra de 20 aviões Super Tucano pela Força Aérea, vai muito além da cifra envolvida, de nada desprezíveis 355 milhões de dólares (ou 603,5 milhões de reais). A anulação do contrato, anunciada ontem e justificada por problemas nos documentos apresentados na licitação, fecha as portas, ao menos momentaneamente, do maior mercado mundial de produtos bélicos, e impede a ascensão da fabricante brasileira na primeira divisão do mercado militar internacional.

Do ponto de vista estratégico, a reviravolta na licitação frustra a intenção da Embraer de equilibrar melhor sua receita entre as áreas comercial e de defesa. Basta ressaltar que, na véspera do anúncio da Força Aérea americana, a consultoria sueca Stockholm International Peace Research Institute incluiu a Embraer, pela primeira vez, na lista das 100 maiores empresas militares e de armamento do mundo, na 94ª posição, conforme publicado pelo Estado de S. Paulo.

Num ranking dominado por grupos americanos e europeus, a brasileira conquistou espaço com vendas de 670 milhões de dólares em 2010. Enquanto isso a líder Lockheed Martin movimentou 35,7 bilhões de dólares no mesmo ano. Para não deixar dúvidas quanto à diferença de escala, bastaria à Embraer morder o número à direita da vírgula no faturamento da gigante americana para dobrar suas receitas na área militar.

O valor do contrato, por si só, não chega a representar um abalo irreparável ao caixa da Embraer, uma empresa com carteira de vendas da ordem de 15 bilhões de reais – ainda que tenha sido cada vez mais hercúleo o esforço necessário para sustentar esse patamar de encomendas diante da crise combinada nos EUA e na Europa. O problema é que o acordo previa a possibilidade de ampliar a venda para mais 35 Super Tucanos, além de representar uma esperança concreta de futuros negócios.

Os jatos leves de ataque Super Tucano seriam operados em missões de treinamento pela Força Aérea afegã, dentro do programa Light Air Support (LAS), segundo a publicação especializada americana Aviation Week. Ou seja, os aviões da Embraer, já em operação em seis países, seriam efetivamente postos à prova em operações caras (nos sentidos literal e figurado) aos americanos. Além de expostos em uma vitrine incomparável, as aeronaves poderiam abrir espaço para a entrada da Embraer em futuras licitações das próprias Forças Armadas americanas.

A vitória da Embraer, que foi representada na licitação pela parceira Sierra Nevada Corporation, havia sido contestada na Justiça pela Hawker Beechcraft, empresa que havia sido desqualificada no processo justamente por falhas na apresentação da proposta. Mas o fato de a Força Aérea ter se antecipado aos tribunais ao anular a disputa mostra que esse jogo não é para principiantes. “Só posso dizer que o executivo-sênior de Aquisições da Força Aérea, David Van Buren, não está satisfeito com a qualidade da documentação de apoio à decisão da disputa”, justificou (?) o porta-voz da Força Aérea americana Michael Donley.

Diante desse tipo de argumentação, fica até difícil acionar a diplomacia brasileira para tentar questionar as razões reais do cancelamento da compra. Sobretudo quando nos lembramos que o governo brasileiro já mantém em banho-maria por mais de cinco anos uma licitação para compra de jatos militares que muito interessa aos EUA.

Embora não haja relação direta entre os episódios, a perda do contrato nos EUA vem em seguida ao fracasso da Embraer na tentativa de garantir uma fatia relevante do mercado de aviação da China. Depois de criar uma joint venture com os brasileiros e permitir a abertura de uma fábrica de jatos de pequeno porte (os quase obsoletos ERJ-145), os chineses deixaram claro que a sua intenção era apenas ganhar know-how antes de lançar uma linha própria de jatos no promissor nicho de jatos médios, e assim concorrer diretamente com a bem sucedida família Embraer 170/190.

Os percalços enfrentados pela Embraer, tanto com os falcões americanos quanto com os burocratas chineses, servem de alerta a todas as empresas brasileiras com pretensões no exterior. Se a briga por novos mercados já era feia, nesses tempos de crise a disputa passou a ser horrível. Não há limites para as medidas que governos e fabricantes locais podem adotar para blindar seus mercados, de preferência sem abrir brechas para aporrinhações na Organização Mundial do Comércio.

Abrir espaço no exterior, no mundo de hoje, requer não só qualidade, preço e eficiência, mas também afinação com o governo e habilidade na arte das relações internacionais. O jogo é pesado, mas não dá para ficar de fora – até porque os adversários já invadiram o nosso lado do tabuleiro.

O revés sofrido pela Embraer nos Estados Unidos, com o cancelamento da compra de 20 aviões Super Tucano pela Força Aérea, vai muito além da cifra envolvida, de nada desprezíveis 355 milhões de dólares (ou 603,5 milhões de reais). A anulação do contrato, anunciada ontem e justificada por problemas nos documentos apresentados na licitação, fecha as portas, ao menos momentaneamente, do maior mercado mundial de produtos bélicos, e impede a ascensão da fabricante brasileira na primeira divisão do mercado militar internacional.

Do ponto de vista estratégico, a reviravolta na licitação frustra a intenção da Embraer de equilibrar melhor sua receita entre as áreas comercial e de defesa. Basta ressaltar que, na véspera do anúncio da Força Aérea americana, a consultoria sueca Stockholm International Peace Research Institute incluiu a Embraer, pela primeira vez, na lista das 100 maiores empresas militares e de armamento do mundo, na 94ª posição, conforme publicado pelo Estado de S. Paulo.

Num ranking dominado por grupos americanos e europeus, a brasileira conquistou espaço com vendas de 670 milhões de dólares em 2010. Enquanto isso a líder Lockheed Martin movimentou 35,7 bilhões de dólares no mesmo ano. Para não deixar dúvidas quanto à diferença de escala, bastaria à Embraer morder o número à direita da vírgula no faturamento da gigante americana para dobrar suas receitas na área militar.

O valor do contrato, por si só, não chega a representar um abalo irreparável ao caixa da Embraer, uma empresa com carteira de vendas da ordem de 15 bilhões de reais – ainda que tenha sido cada vez mais hercúleo o esforço necessário para sustentar esse patamar de encomendas diante da crise combinada nos EUA e na Europa. O problema é que o acordo previa a possibilidade de ampliar a venda para mais 35 Super Tucanos, além de representar uma esperança concreta de futuros negócios.

Os jatos leves de ataque Super Tucano seriam operados em missões de treinamento pela Força Aérea afegã, dentro do programa Light Air Support (LAS), segundo a publicação especializada americana Aviation Week. Ou seja, os aviões da Embraer, já em operação em seis países, seriam efetivamente postos à prova em operações caras (nos sentidos literal e figurado) aos americanos. Além de expostos em uma vitrine incomparável, as aeronaves poderiam abrir espaço para a entrada da Embraer em futuras licitações das próprias Forças Armadas americanas.

A vitória da Embraer, que foi representada na licitação pela parceira Sierra Nevada Corporation, havia sido contestada na Justiça pela Hawker Beechcraft, empresa que havia sido desqualificada no processo justamente por falhas na apresentação da proposta. Mas o fato de a Força Aérea ter se antecipado aos tribunais ao anular a disputa mostra que esse jogo não é para principiantes. “Só posso dizer que o executivo-sênior de Aquisições da Força Aérea, David Van Buren, não está satisfeito com a qualidade da documentação de apoio à decisão da disputa”, justificou (?) o porta-voz da Força Aérea americana Michael Donley.

Diante desse tipo de argumentação, fica até difícil acionar a diplomacia brasileira para tentar questionar as razões reais do cancelamento da compra. Sobretudo quando nos lembramos que o governo brasileiro já mantém em banho-maria por mais de cinco anos uma licitação para compra de jatos militares que muito interessa aos EUA.

Embora não haja relação direta entre os episódios, a perda do contrato nos EUA vem em seguida ao fracasso da Embraer na tentativa de garantir uma fatia relevante do mercado de aviação da China. Depois de criar uma joint venture com os brasileiros e permitir a abertura de uma fábrica de jatos de pequeno porte (os quase obsoletos ERJ-145), os chineses deixaram claro que a sua intenção era apenas ganhar know-how antes de lançar uma linha própria de jatos no promissor nicho de jatos médios, e assim concorrer diretamente com a bem sucedida família Embraer 170/190.

Os percalços enfrentados pela Embraer, tanto com os falcões americanos quanto com os burocratas chineses, servem de alerta a todas as empresas brasileiras com pretensões no exterior. Se a briga por novos mercados já era feia, nesses tempos de crise a disputa passou a ser horrível. Não há limites para as medidas que governos e fabricantes locais podem adotar para blindar seus mercados, de preferência sem abrir brechas para aporrinhações na Organização Mundial do Comércio.

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