Economia

Brasil, um estranho país

Em um mundo estagnado, o governo golpista atua para matar a agricultura familiar

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Na coluna anterior, procurei ampliar o conceito de agricultura familiar para além da batida exclusivista de que ela é importante apenas por ser responsável em mais de 70% da produção de alimentos para o mercado interno. Verdade, mas não só. Ela é alta agregadora de valor, faz parte do agronegócio e é excelente aparelho de inserção social. Quem ainda não foi atrás desse trio elétrico já morreu. 

Da mesma forma, alertei que nos sacos de maldades que carregam os economistas neoliberais, hoje no governo ilegítimo, há pesadas intenções de deixá-la à mercê do mercado sem as garantias que precisa para sobreviver. Acrescentei que se não mudasse de ideia, voltaria ao assunto. Não mudei.

A agropecuária brasileira, especialmente a agricultura empresarial, se liquidada no futuro, o será pelas armas externas de destruição e não pelo cartaz que tem junto a quem manda no País.

Tomou espaço na política e na mídia, vantagens na legislação, avançou em tecnologia, e foi bafejada pela sorte achada num biscoitinho chinês. Só não vai melhor pois quem aqui pensa infraestrutura é desmiolado e quer todas as vantagens que venham do investimento público. Do lado dos agricultores, eles morrem de pena dos fabricantes de agroquímicos e enchem-lhes os bolsos de dinheiro.

No abastecimento interno, no entanto, não precisaremos da ajuda de ninguém. Nós mesmos faremos o serviço. Aliás, a hidra golpista já reservou uma de suas cabeças para o setor. Exemplos, a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário e, recentemente, a reordenação de verbas para favorecer o agronegócio empresarial.

A agricultura familiar e a produtividade em assentamentos precisam de cuidados para produzir e se reproduzir. Abandoná-las a um planeta regrado pelos mercado financeiro e concentração de riqueza é condená-las à morte. Inclua-se aí grandes contingentes de humanos.

Previsões apontam para que as áreas de arroz e feijão aumentarão quase nada, prenúncio que pautará o Jornal Nacional, da TV Globo, no ano que vem. William e Renata arregalarão olhos e sobrancelhas para os preços desses produtos. Isto se, até lá, o povo ainda mantiver a estranha mania de comer.

Caso é, impolutos patos-amarelos, porta-vozes e economistas-chefes, que depois de a globalização proporcionar, entre 1980 e 2005, crescimento de 120% na renda real média mundial, os mais lúcidos analistas econômicos do planeta a veem empacada ou em retrocesso. Desde 2008, vivemos o período mais longo de estagnação, desde a Segunda Guerra Mundial.

Pior. Mesmo o período positivo ocorreu de forma assimétrica, colaborando pouco para diminuir a desigualdade. Agora, quando se acentua a falta de oportunidades de produção e trabalhos industriais e agrícolas, as crises se sucederão mais graves. Acreditar que o mercado financeiro e os juros estratosféricos nos salvarão é o mesmo que esperar resultados da rodada Doha, acordos multilaterais e diminuição do protecionismo.

Ah, esqueci. Tanta a tolice das elites brasileiras, que nas manifestações de gordas e disformes coxas pedia-se Donald Trump para nos salvar. O governo usurpador acredita conhecer aparelhos e ferramentas capazes de atender produção e trabalho. São os palhaços do ajuste.

Em minhas conversas com empresários do setor produtivo é comum escutar: “Quem é o louco que irá investir em produção e comércio com essa taxa de juros. Eu hein? Demito, corto o cafezinho, terceirizo mão de obra, e mando pau na Tesouraria”. Também louco, vêm-me à cabeça palavras em desuso como cassino e overnight.

Peço ajuda. Martin Wolf, editor de economia do Financial Times: “Promover o avanço da globalização exige políticas internas e externas diferentes das do passado”. Larry Summers chama a atual fase da economia de “estagnação secular”. Paul Krugman, de “economia diabética”, dinheiro mundial barato e crescimento japonês. Joseph Stiglitz avisa que “as grandes corporações estão sentadas em centenas de trilhões de dólares”. 

Em um mundo assim, nada mais inteligente do que matarmos a agricultura familiar. Estranho País, este.

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