Sociedade

350 reais ou menos: como vivem os beneficiários do novo auxílio emergencial de Bolsonaro

O novo desenho do beneficio pago pelo governo deixa famílias em situação de vulnerabilidade e fortalece a volta da fome no Brasil

350 reais ou menos: como vivem os beneficiários do novo auxílio emergencial de Bolsonaro. Foto: Anália Fressatti.
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A faxineira Alessandra Cristina está desempregada. “Eu trabalhava em várias casas. Depois da pandemia, perdi todas. Faço uns bicos vez ou outra, mas não dá para nada.”

Mãe solo de 37 anos, ela mora em um assentamento na cidade de Botucatu, interior do estado de SP com os quatro filhos. Na primeira rodada do auxílio, em 2020, Alessandra não conseguiu acesso ao benefício, pois o pais das crianças, que não ajudava financeiramente,  passou na frente e declarou que os filhos moravam com ele. Com isso, a faxineira ficou impossibilitada de receber o dinheiro neste ano.

Alessandra vive de doações e luta, diariamente, para conseguir faxinas. “Você pega 100 reais no mercado e não compra nem uma caixa leite. Está 60 reais a caixa de leite que eu dou pro meu filho.”

A realidade vivida por Alessandra expõem os problemas do atual auxílio emergencial do governo federal. Com o aumento do desemprego em meio à pandemia, 14,2% segundo o IBGE, a faxineira e seus filhos enfrentam uma situação de extrema vulnerabilidade.

“A gente não quer nada de graça, a gente quer poder correr atrás e lutar pelo o que é da gente, entendeu, mas agora isso está impossível”, relata.

Uma questão de gênero

O drama de Alessandra não é exceção. Outras mulheres que comandam suas famílias estão passando pela mesma realidade. É o caso da auxiliar de limpeza Gisele Fernanda De Carvalho, de 37 anos. A mãe de quatro filhos está desempregada e não pode receber o novo auxílio.

Em 2019, Gisele agredida pelo ex-marido. Após chutes e socos, ela teve uma fratura no ombro que a tirou a do mercado de trabalho.

Durante um ano, Giselle recebeu auxílio do INSS, mas o direito foi cortado em 2021, o que deixou a moradora da cidade de Botucatu sem nenhuma fonte de renda.

“Estou sobrevivendo de doações. Não é uma coisa legal. É muito triste ter que depender das pessoas para dar o leite das crianças, a comida que eles comem e para pagar minhas contas, porque senão eu fico sem água, sem luz e sem apartamento”, conta.

Especialista vê projeto falho

Em abril de 2020, quando o País já começava a sentir os efeitos econômicos da pandemia, o governo aprovou a criação do auxílio emergencial. Naquele ano — e por decisão do Congresso — foram pagas por cinco meses parcelas de 600 reais. Após esse período, o valor caiu para 300 reais.

O ano de 2021 chegou e junto com ele uma onda ainda mais violenta do novo coronavírus. Novas variantes triplicaram o número de mortes e puseram hospitais em colapso. Mesmo diante de um cenário como este, o governo de Jair Bolsonaro demorou quatro meses para anunciar uma nova rodada do auxílio, dessa vez com um valor inferior, de a partir de 150 reais, e restrito apenas aos beneficiários já cadastrados em 2020. Os novos atingidos pela pandemia, portanto, ficaram de fora.

“O auxílio emergencial atual, apesar de evitar uma situação de pobreza extrema e insuficiência de consumo de alimentar mínimo, tem algumas falhas de desenho”, afirma o pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas, Daniel Duque. “Principalmente pelo fato de que apenas antigos beneficiários do programa podem recebê-lo neste ano,”

Para o pesquisador, o novo benefício pago pelo governo não da conta de responder rapidamente a um novo contingente de trabalhadores que vai precisar dessa politica social. “Essa segunda onda vai fazer novos trabalhadores perderem seus empregos.

Esse contingente de trabalhadores prejudicados pelo desemprego na pandemia é, justamente, composto pelos brasileiros mais pobres. “Trabalhadores de menor qualificação, que são justamente aqueles que tem menor rendimento, que estão em famílias com pior situação socioeconômica”, diz.

“Há uma tentativa do governo de falar que o mercado de trabalho está se recuperando. Não é verdade. Os problemas estão sendo tratados na base do improviso”, conclui Daniel.

Dá para viver com 350 reais?

Mesmo famílias que estão tendo acesso ao novo auxílio, a pergunta que fica é: dá para sobreviver com R$350 no Brasil de 2021? A resposta de Rosimere Aparecida de Oliveira, de 42 anos, é não.

“Eu estava fazendo faxina, mas ai saiu o auxilio em 2020 e ajudou bastante. Paguei todas minhas contas, estava tudo em dia. Agora com esse novo não estou dando conta de pagar tudo e sustentar meus quatros filhos. É muita coisa, né?”, relata Rosimere.

A faxineira está desempregada e mora em uma unidade do Minha Casa, Minha Vida na periferia de Botucatu. Como não recebe ajuda dos pais de seus filhos, conta com ajuda de ONGs para levar cesta básicas e outros produtos básicos.

“Eu me apego a Deus que tudo isso vai melhorar”, desabafa Rosimere.

As tão atacadas ONGs

Em um país em que já morreram quase meio milhão de pessoas por conta da Covid-19 e registra alta no desemprego, na inflação e com um governo que nega tudo isso, a conta ficou no colo de organizações da sociedade civil, tão demonizadas por Bolsonaro.

É o caso do projeto Instituto Brasileiro Sou Eu, que auxilia famílias que vivem em alta vulnerabilidade e trabalha também a questão ambiental. Todas as mulheres entrevistadas pela reportagem são auxiliadas pelo programa, fundado pela educadora social Janete dos Santos Cantole.

“Estamos fazendo é o papel do Estado. E com a pandemia diminui o número de doações, por que muita gente perdeu seus empregos, e aumentou a demanda”, relata Janete, que arrecada doações de alimentos e roupas para 60 famílias em Botucatu.

Para ela, só existe um jeito de melhorar a situação: mudar o governo.

“É um crime ter tirado o auxílio de 600 reais das pessoas. E depois as pessoas ficaram abandonadas, sem emprego, sem dinheiro pro aluguel, internet ninguém mais tem. A fome está voltando muito fortemente, justamente pelo descaso do poder público”, relata.

Confira a reportagem completa:

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