Saúde

Mutações internas do coronavírus preocupam mais que variante indiana, diz ex-secretário

‘Parece que onde há uma mutação dominante, a outra não avança’, ponderou Wanderson Oliveira

Wanderson de Oliveira atuou como secretário de Vigilância em Saúde. Foto: José Dias/PR
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O epidemiologista Wanderson Oliveira diz que a variante indiana, que provavelmente está ligada ao crescente número de mortos no país asiático, já circula no Brasil, mas avalia que mutações do vírus originadas na América do Sul representam um risco maior à população.

“Não se trata apenas de aspectos regionais. Mas também de uma disputa entre os vírus. Não temos certeza se nesse caso haverá essa disputa, mas temos observado, por exemplo, que a P1, que agravou a situação no Brasil, não teve o mesmo padrão de comportamento em outros países onde já foi detectada. As variantes sul-africana e a do Reino Unido não prosperaram por aqui. Parece que onde há uma mutação dominante, a outra não avança”.

Ele diz que a P4, identificada no interior de São Paulo, tem semelhanças com a P1 de Manaus, que já se espalhou, e pode ser um fator de agravamento: “Posso queimar a língua e a variante indiana dominar, mas acho que mutações como a P4, que surgiram aqui, têm um potencial maior ”.

O ex-secretário de vigilância em saúde do governo federal diz que, embora o país não tenha hoje mortes diárias na casa dos quatro mil óbitos, os números continuam altos e é difícil saber se estamos entrando numa nova onda ou se é uma oscilação dos quadros anteriores, que, segundo ele, nunca arrefeceram no país de forma mais firme.

“Foram registradas ontem mais de duas mil e trezentas mortes, o que é muito para uma quarta-feira. Geralmente na terça se tem o que foi represado do fim de semana. Eu esperaria para uma quarta 1.800 mortes, por exemplo, o que seria ainda muito alto, mas indicaria uma tendência de queda. Então devemos ter um agravamento da situação. Não sabemos a intensidade, se é algo como o Everest ou Mont Blanc. Será grave nos dois casos, mas esperamos que não seja um Everest.”

O clima no Brasil deve contribuir, diz o especialista, para o prognóstico mais grave. “Estamos entrando no inverno, quando os vírus respiratórios circulam mais e as pessoas ficam em locais mais fechados. Se no verão tivemos alta, é de se esperar nova piora agora”.

Ele diz que é possível tomar medidas sanitárias para minimizar esse cenário. “Isolar quem tiver sintomas de gripe. Acelerar a produção de vacinas, pois precisamos de dois milhões de doses por dia. Também precisamos melhorar a qualidade das máscaras. Usar uma cirúrgica junto com uma de pano. E, se der, a N-95, ou como é conhecida aqui, a PFF2, que protege mais. Empresários conseguem comprar mais barato e poderiam doar cinco máscaras dessas a cada funcionário. Ele usaria uma por dia e repetiria o uso delas, num rodízio por dois meses. Empresários também poderiam trazer para cá testes de farmácia para a Covid, como os de gravidez”.

O epidemiologista diz que, se houvesse coordenação nacional integrada, todo comércio poderia funcionar 100 por cento em agosto. “Um lockdown agora, bem planejado, organizado, com ajuda social e também linhas de crédito e outras medidas para o setor produtivo. Seriam três semaninhas de fechamento mesmo. Junto com vacinação e máscaras. E em agosto as lojas poderiam abrir normalmente. Mas será que é isso que a sociedade brasileira quer?”, questiona.

“Nossa perspectiva hoje é melhor que a do ano passado, pois temos vacina. Precisamos de coordenação nacional e vontade. Para termos um Natal melhor, temos de vacinar 70% da população. São 150 milhões de pessoas, 300 milhões de doses até outubro. Como a maioria das vacinas não é indicada para menores de 18 anos, que no Brasil são 30% da população, temos de imunizar todos os maiores de idade. É possível, mas é um grande desafio “, finaliza.

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