Política

Vaza Jato: procuradores de Curitiba chamavam depoimentos forjados de ‘terceirizados’

‘Temos que proteger a Erika’, disse o então chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, preocupado com oitiva lavrada, mas jamais realizada

O ex-procurador Deltan Dallagnol. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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A defesa do ex-presidente Lula enviou nesta quarta-feira 24 ao Supremo Tribunal Federal um novo relatório sobre diálogos mantidos por procuradores da Lava Jato, sob o comando de Deltan Dallagnol, que reforçam a acusação de que a Polícia Federal registrou depoimentos de testemunhas que sequer foram ouvidas.

Documento encaminhado pelos advogados ao STF na última segunda-feira 22 apresentava a seguinte declaração de Dallagnol, feita no grupo de Telegram dos membros da força-tarefa de Curitiba: “Como expõe a Erika: ela entendeu que era pedido nosso e lavrou termo de depoimento como se tivesse ouvido o cara, com escrivão e tudo, quando não ouviu nada… Dá no mínimo uma falsidade… DPFS são facilmente expostos a problemas administrativos.”

Ao reforçar, nesta quarta, o envio de dados ao STF, os advogados de Lula alegam que houve nos últimos dias uma tentativa de colocar em dúvida o material. Por isso, argumentam, solicitaram ao perito Claudio Wagner uma análise de outras conversas, a fim de reunir mais mensagens que comprovem os indícios e os contextualizem.

Com o novo material, a defesa de Lula afirma também que se evidencia o papel do então juiz Sergio Moro, que “tomou conhecimento dos questionamentos do delator sobre o ‘depoimento’ supostamente ocorrido na Polícia Federal.”

Os advogados ainda garantem que “o novo material coletado reforça que a ‘lava jato’ transformava em depoimentos perante autoridades textos que eram produzidos unilateralmente por alguns advogados que participavam de processos de delação premiada, sem qualquer leitura ou conferência.”

Um dos novos diálogos apresentados pela defesa de Lula nesta quarta data de 22 de janeiro de 2016. Um dos procuradores escreveu no grupo: “Aqui não temos mídias e os termos não mencionam gravação. Foram tomados pela Erika. Lembram se foram gravados?”.

Pouco depois, Erika respondeu: Galvão, ao que me lembre vocês negociaram o acordo com o Moura em um dia e combinaram de no outro o advogado trazer os termos prontos. No dia seguinte os advogados vieram na SR com tudo pronto, segundo eles de acordo com o q tinham combinado com vocês, era um período em q só estava eu na SR por parte da LJ, então eles usaram meu nome no cabeçalho, mas não tomei e não participei de nenhum termo. Se ele está se desdizendo, infelizmente não haverá gravações ….”.

No dia 25 de janeiro, o assunto ainda era a oitiva do lobista Fernando Moura, que disse a Moro que não reconhecia parte de seu depoimento. “Assinei isso? Devem ter preenchido um pouquinho mais do que eu tinha falado”, afirmou.

Diante do caso, a Lava Jato iniciou a articulação de uma resposta às afirmações de Moura sobre o não reconhecimento do próprio depoimento. Os procuradores desejavam afirmar que a oitiva não foi gravada em vídeo, mas que seria analisada “em conjunto com as demais provas que instruem o feito.”

Foi neste contexto que, em 25 de janeiro, Dallagnol declarou que o Ministério Público deveria “proteger” Erika.

“Adv e ele [Moura] têm que explicar, mas devemos proteger Erika. Se ela entendeu errado a orientação e agiu de boa-fé. Mas o advogado é evidentemente responsável. Eu acho que tínhamos que mostrar que a negativa é irrelevante no contexto da prova. Isso deixaria sem sentido ou sem efeito a ideia de manipulação.”

Aponta a defesa de Lula que, nesses diálogos, os procuradores aludem “à ‘terceirização de depoimentos’, expressão utilizada para designar depoimentos que teriam ocorrido perante autoridades, mas que, em realidade, não existiram.”

Os procuradores se referem à delegada em todos os momentos apenas pelo primeiro nome: Erika.

A Lava Jato teve como delegada em seus primórdios Erika Marena, responsável inclusive por dar nome à operação. Não é possível, porém, afirmar que os procuradores se referem a ela.

No fim de 2016, Marena deixou a força-tarefa para cuidar da área de combate à corrupção e desvio de verbas públicas na superintendência da Polícia Federal em Santa Catarina. Depois, assumiu o posto de superintendente da PF em Sergipe.

Posteriormente, foi escolhida pelo então ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro para chefiar o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça. Ela foi exonerada do cargo no dia 26 de junho de 2020.

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