Política

STF interrompe sessão com placar de 3 a 1 por prisão após 2ª instância

Moraes, Fachin e Barroso se manifestaram favoráveis à execução da pena em 2º grau e divergiram do relator, Marco Aurélio Mello

Sessão do Supremo Tribunal Federal, durante julgamento sobre prisão após 2ª instância. (Foto: Felipe Sampaio/SCO/STF)
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Com o terceiro voto em favor da prisão após condenação em 2ª instância, o Supremo Tribunal Federal (STF) interrompeu a sessão desta quarta-feira 23 e anunciou que retomará o julgamento na quinta-feira 24, às 14h. O placar está 3 a 1.

Votaram a favor da execução da pena em 2º grau os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. Apenas o relator, ministro Marco Aurélio Mello, manifestou-se contrário. Ainda faltam os votos dos ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Carmen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e, por fim, o presidente Dias Toffoli, nesta ordem.

A Corte julga três Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) movidas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelos partidos PCdoB e Patriota. As ações questionam a legalidade da prisão após 2ª instância em relação ao princípio de presunção de inocência. No entendimento atual do STF, adotado em 2016, o réu que for condenado em 2ª instância pode ser preso e deve esperar, na cadeia, o desenrolar de novos recursos.

Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), caso o STF desista do entendimento adotado em 2016, podem ser beneficiadas 4.895 mil pessoas que hoje são alvo de mandado de prisão por condenação em 2ª instância. O caso mais notório é o do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso em Curitiba desde abril de 2018, após condenação em 2º grau no processo do tríplex do Guarujá (SP).

Relator da ação, o ministro Marco Aurélio Mello manteve seu entendimento que apresentou em 2016, contra a prisão em 2ª instância. “É impossível devolver a liberdade perdida ao cidadão”, afirmou. “A harmonia, com a Constituição de 1988, do artigo 283 do Código de Processo Penal é completa, considerado o alcance do princípio da não culpabilidade, inexistente campo para tergiversações, que podem levar ao retrocesso constitucional, cultural em seu sentido maior.”

Logo após o relator, Moraes defendeu a execução da pena em 2ª instância. O magistrado permaneceu com a mesma posição que proferiu em 2016, quando negou  habeas corpus a Lula, que queria esperar em liberdade até que seus recursos fossem esgotados no processo do tríplex.

“Não se pode afastar a efetividade da tutela judicial dada pelos juízos de 1ª e 2ª instância, que são os juízes naturais da causa, de cognição plena. Não se pode transformar esses tribunais em tribunais de mera passagem”, argumentou, ao empatar com Marco Aurélio de Mello em placar de 1 a 1.

Também favorável à prisão em 2ª instância, o ministro Edson Fachin afirmou que é inconstitucional a afirmação de que o artigo 283 do Código de Processo Penal exige prisão apenas após o “trânsito em julgado”, ou seja, depois do esgotamento de todos os recursos possíveis.

“É inviável sustentar que toda prisão só pode ter seu cumprimento iniciado quando o último recurso da última Corte constitucional tenha sido examinado”, criticou.

“Não é de pobre que estamos falando”

Em discurso que durou cerca de 1h30, a fala mais prolongada da sessão, o ministro Luís Roberto Barroso rebateu argumentos de que a prisão após 2ª instância provoca aumento da população carcerária e atinge os mais pobres. O magistrado citou dados atribuídos ao Departamento Penitenciário Nacional (Depen). As informações apresentadas indicam, segundo ele, que houve redução no crescimento do índice de encarceramento, após o STF votar a favor da prisão em 2ª instância, em 2016.

“Ao contrário do sugerido, a possibilidade de execução da pena após a condenação em 2º grau diminuiu o índice de encarceramento no Brasil”, afirmou. Segundo ele, entre 2009 e 2016, período em que o entendimento do STF favorecia prisão somente após o esgotamento dos recursos, o encarceramento aumentou, em média, 6,25% ao ano. Após 2016, quando o critério mudou, a média caiu para 1,46%.

Ele afirma que, em 2010, primeiro ano após a proibição da prisão em 2ª instância pelo STF, havia 496 mil presos no sistema penitenciário brasileiro, 4,79% a mais que em 2009. Em 2011, o número subiu para 514 mil  e 600 presos. O índice só subiu nos anos seguintes: 549 mil e 800 presos em 2012, 581 mil e 500 presos em 2013, 622 mil e 200 presos em 2014, 698 mil e 600 presos em 2015, 722 mil e 923 presos em 2016. A partir deste ano, quando a jurisprudência mudou, diz ele, o crescimento foi freado: 726 mil e 354 presos, o menor aumento desde o início da série história, iniciada em 2009. Em 2018, foram 744 mil e 216 presos, o segundo menor aumento.

Barroso também discordou da queixa de que os pobres são os mais atingidos pela autorização da prisão após 2ª instância. De acordo com dados que ele apresentou, os seis principais crimes que resultam em prisão são os “crimes dos pobres”: tráfico de drogas, roubo qualificado, roubo simples, homicídio, crimes contra a dignidade sexual e latrocínio. O ministro argumenta que, para estes crimes, a regra geral que o sistema aplica é a prisão em flagrante, a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva e a prisão já em 1ª instância.

“São crimes em que o agente é considerado violento e é normalmente preso preventivamente, antes mesmo da sentença de 1º grau”, diz. “Não foram os pobres que sofreram o impacto da possibilidade de execução da pena em 2ª instância. Não foram os pobres que mobilizaram os mais brilhantes e caros advogados do país. Pobre não corrompe, não desvia dinheiro público, nem lava dinheiro. Não é de pobre que nós estamos falando.”

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