Política

Propina e fim da Lava Jato: principais pontos da denúncia contra Aécio

Joesley Batista, maior doador para a campanha de Aécio Neves em 2014, revela R$ 2 milhões para advogado e esquema para frear investigações de corrupção.

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O procurador-geral da República Rodrigo Janot falou em “perplexidade” ao comentar a Operação Patmos, desdobramento da Lava Jato que chegou ao presidente Michel Temer e ao senador Aécio Neves (PSDB-MG) na quinta-feira 18.

Não é para menos. A divulgação do teor da conversa entre Aécio e o dono da JBS, Joesley Batista, me da delação do empresário mostram que a Operação Lava Jato não foi capaz de estancar os esquemas de propina e mudar a promíscua relação entre políticos e empresários.  

A bomba contra Aécio explodiu na noite da quarta-feira 17 quando veio à público uma conversa entre os dois em março deste ano. Na ocasião, sem meias palavras, Aécio pede R$ 2 milhões ao empresário que seriam usados para sua defesa na própria Operação Lava Jato. No dia seguinte a irmã e braço direito de Aécio, Andrea Neves, e seu primo Frederico Pacheco foram presos.

O relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Edson Fachim, porém, negou o pedido de prisão de Aécio. A relação entre Aécio e Joesley, porém, é bem mais antiga.

Doações de campanha

Joesley Batista afirma em sua delação ter sido o maior doador da campanha de Aécio à presidência em 2014, com envio lícito de recursos e caixa 2. Mesmo assim, logo depois da eleição, vendeu um imóvel superfaturado, por R$ 17 milhões, a uma pessoa indicada por Aécio para que o dinheiro chegasse ao senador. Em 2016, um novo pedido, dessa vez de R$ 5 milhões, negados pelo empresário que a essa altura já estava na mira das investigações pela Operação Sépsis.

Nada de novos pedidos de dinheiro até fevereiro deste ano, quando Joesley foi procurado por Andrea Neves com a conta dos R$ 2 milhões que seriam pagos pela defesa de Aécio. Aparentemente Joesley já imaginava gravar a conversa e pede um encontro pessoal com o senador.

Hotel Unique

O encontro é marcado numa suíte do sétimo andar do Hotel Unique, em São Paulo, no dia 24 de março. O pagamento dos R$ 2 milhões é acertado em parcelas de R$ 500 mil num diálogo, no mínimo, insólito.

Aécio sugere enviar seu primo, Frederico Pacheco, ao que Joesley responde: “Se for o Fred, eu ponho um menino meu, se for você, sou eu”, mostrando disposição em entregar pessoalmente. “Eu só faço desse jeito, entre dois”. Aécio concorda, mas preocupa-se: “Tem que ser um que a gente mate ele antes de fazer delação”, afirma o senador.  

Para “limpar” o pagamento, o dinheiro é pago por empresas de Joesley a um advogado que já prestava serviços ao grupo, Alberto Zacharias Toron.

Dez ou 15 anos de propina

Joesley confirma em seu depoimento que foi constatado em suas empresas vários ilícitos cometidos pela alta direção nos últimos dez ou 15 anos, especialmente nos últimos cinco. De acordo com o empresário, a corrupção envolve doações oficiais para campanhas políticas e caixa 2, inclusive com dinheiro em espécie, o que dependia do acordo fechado em cada esquema. A conta apresentada pelo empresário, segundo o inquérito, não é totalmente clara.

O montante pago em propinas nos últimos anos levantados até agora chegaria a R$ 400 milhões oficiais e R$ 100 milhões por fora, com notas fiscais frias, por exemplo. O texto do inquérito afirma em seguida que “desse valor em torno de R$ 400 milhões foram de propina e R$ 100 milhões de doações lícitas.

Barrar investigações

No encontro do Hotel Unique, empresário e senador não vão direto ao assunto, os tais R$ 2 milhões, e ficam evidentes os esforços de Aécio para obstruir as investigações das diversas operações de combate à corrupção.

Segundo o áudio gravado por Joesley e o texto do inquérito divulgado na sexta-feira 19, Aécio estava exaltado: o primeiro assunto em pauta é a deflagração da Operação Carne Fraca, dias antes, e Aécio menciona conversas com o presidente Michel Temer, o que revela a proximidade entre o atual chefe do poder executivo e o senador.

Sobre a Carne Fraca, Aécio fala em “confusão filha da puta. Eu estava falando com o Trabuco (Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Bradesco) hoje de manhã, fomos apertar 0 Michel. Agora, a Polícia Federal tinha que fazer uma meia culpa (sic) pública, pedir desculpa”, afirma o senador.

E Joesley aproveita o gancho e pergunta especificamente sobre a necessidade de parar as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público e Aécio é categórico quanto à estratégia: “cortar tudo para trás”. A ideia do senador é:

–  “Acabar com todos esses crimes, de falsidade ideológica… negócio grande não dá para assinar na surdina, todo mundo assina, o PSDB vai assinar, o PT vai assinar, o PMDB vai assinar, estamos montando. A ideia é votar. Por que o Rodrigo (Maia, presidente da Câmara) devolveu aquela tal das “dez medidas”, a gente vai votar naquela merda daquelas “dez medidas”, então essa porra. Estou trabalhando nisso igual um louco”

No depoimento, Joesley é específico ao afirmar que Aécio falou da necessidade de aprovar a lei da anistia ao caixa 2 e do abuso de autoridade.

Especificamente sobre a Lava Jato, o senador teria tentado organizar uma forma de impedir que as investigações avançassem por meio da escolha dos delegados que conduziriam os inquéritos, plano que não foi colocado em prática no que seria um acordo envolvendo o próprio Aécio, Temer e o então Ministro da Justiça, e hoje ministro do Supremo, Alexandre de Moraes.

– “O que vai acontecer agora, vai vir inquérito sobre uma porrada de  gente , caralho, eles aqui são tão bunda mole, que eles não notaram o cara que vai distribuir os inquéritos para os delegados, você tem lá, sei lá, tem dois mil delegados na Polícia Federal, aí tem que escolher
dez caras. O do Moreira, o que interessa a ele, sei lá, vai pro João. O do Aécio vai pro Zé. 0 outro filho da puta vai pro, foda-se, vai para o Marculino, nem isso conseguiram terminar, eu, o Alexandre e o Michel”

Presidência da Vale

Joesley Batista fala também de uma negociação pelo comando da Vale. Andrea Neves teria pedido R$ 40 milhões ao empresário para a comprar um apartamento da mãe, no Rio de Janeiro. No mesmo contexto, Joesley conversa com Aécio, que seria o responsável por nomear o presidente da Vale.

Joesley quer Aldemir Bendine (ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras) no alto cargo da mineradora, mas Aécio, que já tinha seu indicado, nega, sem revelar o nome. Mesmo assim, Aécio oferece ao empresário qualquer uma das quatro diretorias do alto escalão da Vale e Joesley fica de pensar a respeito e Aécio pede para que o empresário esqueça os R$ 40 milhões porque, a partir de então, os contatos entre ambos se daria diretamente, sem a intermediação de Andrea.

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