Política

“Precisamos garantir renda básica para todos os brasileiros”, defende Suplicy

O petista, que defende a medida há mais de 30 anos, acredita que seu projeto veio para ficar

O vereador Eduardo Suplicy. Foto: Ricardo Stuckert
Apoie Siga-nos no

A crise causada pelo coronavírus fez com que a Câmara dos Deputados aprovasse, na noite da última quinta-feira 26, um projeto que garante uma renda mínima para os trabalhadores que serão afetados pela recessão econômica

A ideia é que o governo assegure uma renda mensal de 600 reais até 1200 reais para cada família durante o período de instabilidade no País. 

A medida emergencial é o caminho que a maioria dos países do mundo vêm seguindo para enfrentar a crise. Para o vereador da cidade de São Paulo e ex-senador Eduardo Suplicy (PT), essa proposta constitui passo importante na direção de enfrentamento da crise. 

Suplicy é um defensor acirrado da renda mínima, mas, ao contrário do que está sendo colocado em prática agora, o petista defende que todos os brasileiros, sem exceção, tenham acesso a uma renda básica. “Será a maneira de assegurar liberdade e liberdade real para todas as pessoas”, argumenta o vereador. 

Em 2004, quando ainda era senador, Suplicy conseguiu aprovar seu projeto de renda mínima no Congresso Federal. No executivo, ele nunca foi colocado em prática. Nesse período, o petista escreveu três livros sobre o tema e já rodou o mundo para divulgar a ideia. 

“Do ponto de vista da dignidade e da liberdade da pessoa é que teremos a maior vantagem, pois a pessoa, graças à Renda Básica de Cidadania, ganhará o direito de dizer não diante de qualquer alternativa que lhe apareça pela frente, mas que vai ferir sua dignidade, sua saúde e colocar sua vida em risco”, defende o vereador. 

Confira a entrevista: 

CartaCapital: O que é a Renda Mínima?

Eduardo Suplicy: A Renda Mínima é aquela que possibilita a todas as pessoas o mínimo para atender suas necessidades vitais. Ela pode ser instituída através de um imposto de renda negativo, com condicionalidades, como é o exemplo do Programa Bolsa Família. A Renda Mínima também pode tomar a forma da Renda Básica de Cidadania, Universal e Incondicional: toda pessoa, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou socioeconômica terá o direito de receber uma renda que, com o progresso do país, na medida do possível, será suficiente para atender suas necessidades vitais.

CC: Existe diferença entre o projeto apresentado agora e o que o senhor propôs?

ES: A Lei 10.835/2004, aprovada por todos os partidos no Senado, em dezembro de 2002, e na Câmara dos Deputados em dezembro de 2003, institui a Renda Básica de Cidadania suficiente para atender suas necessidades vitais para todos os residentes no Brasil, não importa a sua condição socioeconômica, inclusive para os estrangeiros residentes aqui no Brasil há cinco anos ou mais. Diz a lei que ela será instituída por etapas, a critério do Poder Executivo, começando pelos mais necessitados. Portanto, o Programa Bolsa Família pode ser visto como uma etapa em direção à Renda Básica de Cidadania.

O projeto de lei já aprovado na quinta feira 26, na Câmara dos Deputados prevê o pagamento, durante três meses, de uma renda mensal de 600 reais a trabalhadores informais e de 1.200 reais para mães responsáveis pelo sustento da família, durante a crise do coronavírus, podendo ser prorrogado por mais três meses. Até dois membros da família poderão receber o auxílio. Se um deles receber o Bolsa Família, terá que optar pelo que for mais vantajoso. O auxílio será concedido aos que tiverem renda mensal per capita de até meio salário mínimo ou renda familiar até três salários mínimos. O benefício será dado a microempreendedores individuais, contribuintes individuais e trabalhadores informais que estiverem inscritos no cadastro único até 20 de março .

O projeto de lei foi enviado para o Senado onde será examinado juntamente com outros projetos lá apresentados, como o do senador Randolfe Rodrigues que propõe o pagamento de uma Renda Básica Emergencial de 300 reais por mês a cada pessoa que pertence a famílias que esteja no Cadastro Único que recebem até três salários mínimos mensais, por seis meses enquanto durar a pandemia do coronavírus, prorrogáveis por mais seis meses, se ela continuar.

Avalio que o Senado deverá examinar as proposições de ambas as casas e chegar a um consenso levando em conta as duas proposições.

CC: Na visão do senhor, como esse projeto beneficia as pessoas neste momento de crise causada pelo coronavírus?

ES: Estas duas propostas constituem passos importantes na direção de enfrentarmos a crise social decorrente do coronavírus e representam passos muito importantes na direção da implementação da Renda Básica de Cidadania, Incondicional e Universal, cada vez mais considerada, debatida, experimentada nos mais diversos países do mundo, com resultados positivos.

CC: O senhor acha que esse projeto deveria continuar após a crise? Por quê?

ES: Na medida em que o benefício se torna individual, ele se aproxima do conceito da Renda Básica de Cidadania, Incondicional até que cheguemos à sua Universalidade com todas as suas vantagens.

CC: Qual a diferença de Renda Mínima e do Bolsa Família?

ES: Em seu programa de governo entregue ao Tribunal Superior Eleitoral, o presidente Bolsonaro disse que garantirá uma renda mínima a todas as famílias brasileiras, como defendem os pensadores liberais, a exemplo de Milton Friedman. 

Quando por mim entrevistado em 2000, e perguntado a respeito da Renda Básica de Cidadania, Milton Friedman respondeu: “Uma renda Básica ou Renda do Cidadão não é uma alternativa ao imposto de renda negativo. É simplesmente uma outra forma de se introduzir um imposto de renda negativo se for acompanhado de um imposto de renda positivo sem isenção. O que levou o professor Philippe Van Parijs a afirmar: “Esta é uma afirmação muito clara da equivalência formal entre os dois esquemas, o que sugere que Friedman é a favor tanto de uma proposta como da outra.” ( A entrevista de Friedman está em meu livro “Renda de Cidadania. A Saída é pela Porta.” Cortez Editora).

Ademais, o presidente jurou solenemente perante Deus e o povo brasileiro cumprir a Constituição que estabelece como objetivos fundamentais erradicar a pobreza e reduzir as desigualdades sociais e regionais, sem qualquer discriminação. Portanto, se ele quiser de fato cumprir o que jurou fazê-lo, a forma mais eficaz será instituir para valer a Renda Básica de Cidadania, Incondicional e Universal. Será a maneira de assegurar liberdade e liberdade real para todas as pessoas.

CC: O senhor acha que após esse momento, a sociedade vai entender a necessidade de uma renda básica?

ES: Houve um importante passo de união da sociedade e de todos os partidos ao aprovarem projeto que garante a Renda Básica Emergencial para todas as pessoas em situação de carência por causa da crise econômica. Teremos agora a oportunidade de melhor avaliar as vantagens de estendermos a Renda Básica para toda a população em vista de suas grandes vantagens:

Eliminarmos totalmente qualquer burocracia envolvida em se ter que declarar a renda e o patrimônio de cada pessoa; eliminarmos qualquer estigma ou sentimento de vergonha de a pessoa precisar dizer o quanto ganha e porque precisa um complemento; eliminarmos o fenômeno da dependência que causa a armadilha da pobreza ou do desemprego. Do ponto de vista da dignidade e da liberdade da pessoa que teremos a maior vantagem. Pois a pessoa, graças à RBC, ganhará o direito de dizer não diante de qualquer alternativa que lhe apareça pela frente, mas que vai ferir sua dignidade, sua saúde e colocar sua vida em risco.

ENTENDA MAIS SOBRE: , , ,

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo

Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome

Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.

Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.

Quero apoiar

Leia também

Jornalismo crítico e inteligente. Todos os dias, no seu e-mail

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter e receba um boletim matinal exclusivo