Política
Mourão volta a alimentar desconfianças de que quer o poder
Vice-presidente criticou o tuíte antidemocracia de Carlos Bolsonaro e seria visto de novo por militares como saída
A nova cirurgia de Jair Bolsonaro levou Hamilton Mourão outra vez ao poder por uns dias, e o vice voltou a expor diferenças com o clã presidencial. Após Carlos Bolsonaro tuitar que “por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos”, Mourão disse que é “lógico” que dá para mudar as coisas na democracia, “senão a gente não tinha sido eleito”.
No início do ano, o general havia feito insistentes comentários opostos à família Bolsonaro. Quando a popularidade do presidente havia caído com força pela primeira vez, ali pelo fim de março, início de abril, Mourão começou a ser visto em Brasília como alguém pronto e disposto a comandar o Palácio do Planalto. Será que a ideia de herdar a faixa presidencial passa por sua cabeça hoje?
Segundo um ex-dirigente do Ministério da Defesa que dialoga com militares, as Forças Armadas voltaram a pensar no vice como saída para um pós-Bolsonaro, pois não engolem os rolos da família presidencial (milícias, “rachadinhas”, laranjas), nem engoliram as ofensas de Olavo de Carvalho, o guru bolsonarista que sumiu feito um Fabricio Queiroz.
Ainda segundo este ex-dirigente, há dentro do Palácio do Planalto um militar particularmente contrariado com Bolsonaro: o general aposentado Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
Além de comentar o tuíte de pendor ditatorial de Carlos Bolsonaro, Mourão acaba de reaparecer na TV. Deu entrevista ao jornalista Roberto D’ávila, da GloboNews.
Tem mais: em 3 de setembro, dia em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começou a julgar uma das quatro ações de cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, a advogada do vice, Karina Rodrigues Fidelix da Cruz, disse que não há motivo para cassar. Mas que, se o tribunal julgar que há, Mourão não deveria ser condenado à inelegibilidade juntamente com Bolsonaro – só este deveria. Além da cassação, a ação pede que Bolsonaro e Mourão sejam proibidos de disputar eleição por um tempo.
Há quem veja aí uma brecha para a defesa do vice tentar salvá-lo integralmente de uma condenação a que Bolsonaro eventualmente seja submetido. Ou seja, que sequer fosse cassado, só o ex-capitão seria. Michel Temer tentou fazer isso em um julgamento em 2017 da chapa de Dilma Rousseff vitoriosa em 2014.
No dia em que uma nova pesquisa mostrou a segunda queda acentuada de sua popularidade no ano, com avanço igualmente acentuado do Ibope negativo, 26 de agosto, Bolsonaro comentou a portas fechadas: “Eu vou embora do Brasil”. Deixou no interlocutor a impressão de que já assimila a ideia de não terminar o mandato.
Na véspera, seu filho Eduardo tuitara que o pai “sairá” assim que “as pessoas forem hipnotizadas” pelo pensamento de que o ex-capitão é um governante igual aos antecessores.
Apoie o jornalismo que chama as coisas pelo nome
Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.
Portanto, se você é daqueles brasileiros que ainda valorizam e acreditam no bom jornalismo, ajude CartaCapital a seguir lutando. Contribua com o quanto puder.