Política

Jornais estrangeiros destacam papel de Moro para a eleição de Bolsonaro

A indicação para um “superministério” soou, na mídia internacional, como uma recompensa ao juiz que retirou Lula da corrida presidencial

“Bolsonaro promete emprego para juiz que encarcerou seu rival”, resumiu o 'Times'
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A mídia internacional não reagiu com naturalidade à indicação do juiz Sérgio Moro para um “superministério” no futuro governo. Para boa parte dos jornais estrangeiros, o fato abala a confiança no Judiciário e soou como uma recompensa ao magistrado, que prendeu o ex-presidente Lula, principal adversário de Jair Bolsonaro e franco favorito para vencer as eleições, não fosse a interdição judicial.

Antes mesmo da confirmação de que o convite foi aceito, o Le Monde apontou as “ambiguidades” do juiz, responsável pela Lava Jato em Curitiba. Na quarta-feira 31, o jornal francês assinalou a inexperiência política de Moro, além de lançar uma incômoda pergunta: “Foi por ter emprisionado o líder da esquerda brasileira que o magistrado será recompensado pelo futuro chefe de Estado de extrema-direita, Jair Bolsonaro?”.

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A reportagem, assinada pela jornalista Claire Gatinois, narra a história do juiz que, ao investigar “um caso banal” de lavagem de dinheiro, acabou revelando um dos maiores casos de corrupção do Brasil. “A operação envolve quase todos os partidos, mas a Justiça e Moro têm um cuidado todo especial em relação ao PT”.

Ainda mais constrangedora, segundo o Monde, foi a rapidez com que Lula foi julgado, num país onde a Justiça anda a passos lentos, semanas antes da oficialização das candidaturas para as eleições de 2018.

Na França, o jornal Libération afirma que o juiz que derrubou Lula foi “condecorado por Bolsonaro” e acrescenta: “ele agarrou a bola com uma pressa ansiosa”. Na mesma toada, o jornal britânico The Times viralizou nas redes sociais ao resumir com precisão, na chamada de sua versão online, o que estava em jogo: “Bolsonaro promete emprego para juiz que encarcerou seu rival”.

Le Monde Foi ter ter prendido Lula que Moro foi recompensado?, indaga o ‘Le Monde’

No Reino Unido, o jornal The Guardian também deu destaque à nomeação de Moro. O diário britânico lembrou que o magistrado havia prometido que nunca entraria na política, mas aceitou o cargo, após ter “pavimentado o caminho para estrondosa vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, colocando na prisão o seu rival”. A publicação cita ainda a crítica de Gleisi Hoffmann, presidente do PT, que considerou o fato como “a fraude do século”.

“É inevitável. A narrativa de um juiz que prendeu Lula e depois conseguiu um emprego no governo de seu oponente atrairá muita gente”, observa Brian Winter, editor do Guardian, que não esconde a admiração por Moro, embora reconheça ser difícil “defendê-lo politicamente” a partir de agora. Já Monica de Bolle, diretora de estudos latino-americanos da Universidade Johns Hopkins, disse ao periódico britânico estar “decepcionada com a decisão perturbadora” do juiz.

O Financial Times define Moro como o “juiz que preside a investigação do maior escândalo de corrupção” do Brasil e traz declarações de analistas que aprovam a indicação, por entender que ele dará continuidade ao trabalho de combate à corrupção. O jornal de negócios londrino pondera, porém, que a nomeação pode ser vista como “evidência de que a Lava Jato foi uma caça às bruxas”, dado que Moro foi o responsável pela prisão do maior adversário de Bolsonaro, o ex-presidente Lula.

Nos EUA, o jornal The New York Times engrossa a fileiras dos críticos. Para o diário norte-americano, a decisão de Moro de assumir o comando do Ministério da Justiça “foi recebida com indignação e júbilo, reflexo de quão polarizado ele se tornou”. Segundo analistas ouvidos pela reportagem, “Bolsonaro, uma figura profundamente polarizadora, poderia prejudicar a reputação de Moro e enfraquecer a confiança no Judiciário”.

NYT Bolsonaro pode ‘prejudicar a reputação de Moro e enfraquecer a confiança no Judiciário’, avalia o NYT

Para Matthew Taylor, professor da American University e que entrevistou Moro como parte de sua pesquisa sobre corrupção no Brasil, a decisão do magistrado “corrobora a narrativa do PT de manipulação e de uma Justiça partidária”. Por outro lado, Roberta Braga, especialista brasileira no Atlantic Council, Moro seria “mais do que qualificado” para ser ministro da Justiça. “É um bom augúrio para a aprovação de reformas estruturais anticorrupção”, opinou. Ambos foram ouvidos pelo NYT.

O jornal espanhol El País, por sua vez, estampou a manchete: “O juiz que encarcerou Lula da Silva aceita ser ministro da Justiça de Bolsonaro”. Apresentado como “herói do antipetismo”, Moro assumirá um ministério com funções ampliadas e mais poder, destacou o periódico.

A reportagem, assinada por Tom Avedaño, relembra a trajetória do juiz à frente da Lava Jato e acrescenta: “Com o passar dos anos, Moro se tornou o santo padroeiro do ódio ao PT, um fenômeno crescente que contribuiu notavelmente para a vitória da extrema-direita”.

* Com informações da RFI Brasil.

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