Política

Editor do The Intercept Brasil: “Dirão que é a voz do Adnet?”

Leandro Demori diz que as mensagens são autênticas e que há ‘centenas de áudios’

(Foto: Agência Brasil)
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O jornalista Leandro Demori é editor-executivo do site The Intercept Brasil, responsável pela divulgação das conversas entre procuradores da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba e o ex-juiz Sergio Moro – um escândalo que revela serem conjes a acusação e o juiz que levaram à cadeia o ex-presidente Lula, favorito às eleições presidenciais de 2018.

Nesta entrevista a CartaCapital, Demori fala sobre as “centenas e centenas de grupos de conversas” do aplicativo Telegram a que o Intercept teve acesso. Material que irá gerar “trabalho de muitos meses pela frente”. Sobre o suposto hacker que poderia ter falsificado as mensagens, reafirma a autenticidade delas. “Temos centenas de áudios com as vozes das pessoas que estão agora dizendo que tiveram conversas adulteradas. Dirão que é a voz do Adnet?”

CartaCapital: O que é exatamente o material que o Intercept tem?

Leandro Demori: É um material muito extenso, que consiste basicamente em conversas de chats. São centenas e centenas de grupos de conversas e mensagens privadas do Telegram. Pegue como exemplo a reportagem sobre o grupo de procuradores da Lava Jato em Curitiba trocando mensagens na hora em que Lula tem autorização para dar entrevista a Monica Bergamo (Folha de S.Paulo). Apenas aquele grupo gerou cerca de 1.700 páginas de transcrição.

CC: Como será feita a divulgação dos diálogos? 

LD: A gente tem muita pressão para publicar logo, publicar áudio, vídeo, mas não vamos nos submeter a isso. Vamos fazer as coisas com calma e, pela extensão do arquivo, não é algo que vamos terminar de publicar mês que vem. É preciso separar o que é político, de interesse público. Obviamente, vamos proteger a intimidade dessas pessoas, não vamos cometer injustiças. Estamos trabalhando com toda a força da redação do Intercept Brasil, mais os profissionais da redação de Nova York.

CC: É um trabalho para o resto do ano? 

LD: Não tenho como estimar, mas sem dúvida é um trabalho de meses, muitos meses pela frente.

CC: Já é possível dizer o que emerge das conversas principalmente? 

LD: Não conseguimos olhar tudo, mas dá para dizer que escolhemos iniciar pelas matérias relacionadas ao ex-presidente Lula porque esse é o processo mais importante da Lava Jato, ele ocupa a maior parte, é a conversa mais falada entre os procuradores, o assunto mais importante para eles. Tem muita coisa sobre isso.

CC: O material indica que a Lava Jato tinha por objetivo encarcerar Lula?

DEMORI: Não sei se desde o começo, porque não temos até o momento todo esse recorte temporal. O que dá para saber objetivamente é que, durante a eleição, quando o Lula é autorizado a dar entrevista, eles ficam muito preocupados com a chance de isso eleger o Haddad. O que não é, claramente, uma preocupação técnica, isso passa longe de qualquer isenção que um grupo de procuradores pode querer passar à sociedade. Os diálogos falam por si, não preciso nem gastar muito discurso nisso. Não vou dizer que tinham um interesse partidário, ideológico. Mas se existe a preocupação de o Haddad ganhar a eleição, podemos imaginar que tinham, sim, um interesse político.

CC: Com o que já foi divulgado, podemos observar a atuação política de procuradores e juiz, além do alinhamento entre juiz e acusação. Há outras ilegalidades?

LD: Olha, acho que está se falando muito pouco da questão do tríplex. Durante meses, no começo de 2016, a Lava Jato brigou publicamente para levar o processo para Curitiba. Ele corria em São Paulo, não tinha absolutamente nada a ver com a Petrobras, investigava a falência do edifício em construção que estava sendo tocado por uma cooperativa de bancários chamada Bancoop. No meio do caminho, a Lava Jato decide que esse processo é dela, trava uma quebra de braço com o Ministério Público Estadual de São Paulo. O MPSP argumenta fortemente que aquilo não tem nenhuma relação com a Petrobras. Então o juiz de São Paulo diz que o processo tem de ir para Curitiba, os procuradores estão argumentando fortemente que tem relação com a Lava Jato. O que se descobre agora é que, 70 horas antes de apresentar a denúncia do tríplex, o famoso powerpoint, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, confessa aos seus pares em um chat privado que até aquele momento ainda tinha dúvida sobre o apartamento ter relação com a Petrobras. Isso mostra que blefaram publicamente, blefaram para o STF. Em Curitiba, o processo acabaria por levar o ex-presidente à cadeia.

CC: Os principais atingidos pela Vaza Jato, além da Globo, apegaram-se ao argumento de que um suposto hacker teria invadido telefones e até adulterado os diálogos que vieram à tona. Como vê esse tipo de reação?

LD: Bom, então vamos deixar algumas coisas claras. Desde do início, quando as reportagens saíram, nem o ex-juiz Sergio Moro, nem o procurador Deltan Dallagnol, nem a força-tarefa negaram a veracidade das mensagens. Vamos deixar muito claro: o arquivo é autêntico, as mensagens são autênticas e não foram negadas nem mesmo pelos personagens que aparecem nelas. O ex-juiz Sergio Moro disse que aquilo era um relacionamento normal. Ao dizer isso, ele confirma que a veracidade do que se divulgou. Agora, a tentativa de virar essa narrativa, patética, a gente vê com naturalidade. Estão se defendendo como podem. O ex-juiz disse que foi hackeado há alguns dias, nós estamos com o nosso arquivo há muito mais tempo do que isso, então não existe relação nenhuma com o suposto hackeamento do celular. São coisas independentes, se é que é mesmo verídica a informação de que o celular dele foi hackeado. Está faltando lógica à imprensa que está reportando isso. Misteriosamente, estamos vivendo um surto de hackers. Me surpreende como parte da imprensa está publicando isso como verdade absoluta, porque a imprensa que sempre usa o “suposto”, “supostamente hackeado”, “o suposto hacker”, nesse caso os supostos desapareceram. Estou esperando que esses supostos hackers, se forem encontrados, que sejam punidos na forma da lei. Agora, isso não tem absolutamente nada a ver com os arquivos que o Intercept possui. Nós temos os fatos.

CC: Não existe a possibilidade de as mensagens serem fruto da intervenção de um hacker que as digitou? 

LD: Temos centenas de áudios com as vozes das pessoas que estão agora dizendo que tiveram conversas adulteradas. Então é só isso que eu tenho a dizer. E eles, dirão que é a voz do Adnet?

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