Política

Dobradinha Witzel-Bolsonaro preocupa os movimentos sociais do Rio

Presidente e governador exaltam o uso de armas e têm a truculência como discurso primordial

Governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel. Fernando Frazão/Agência Brasil Governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel.
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Após onze meses da intervenção federal no Rio de Janeiro, movimento que gerou o maior índice de mortes por policiais registrado desde 2008, o Estado está no segundo mês de um novo governo, segue com violência alarmante e tem perspectivas nada agradáveis. Segundo um levantamento feito pela Polícia Militar e enviado ao Ministério Público (MP), de 30 de janeiro a 8 de fevereiro 42 pessoas foram mortas em confrontos com a PM, média de 4 mortes por dia. Ativistas e estudiosos acreditam que os discursos bélicos do presidente Jair Bolsonaro (PSL) somados à truculência natural do governador Wilson Witzel (PSC) dão legitimidade para o banho de sangue.

Logo após ser eleito, Witzel foi claríssimo: a polícia atiraria na cabeça de quem estivesse com fuzil, A declaração descabida gerou repúdio de diversos movimentos sociais. Ciente de fatalidades (e atrocidades) cometidas quando policiais confundem furadeiras e afins com armas, Lana Souza, uma das fundadoras do Coletivo Papo Reto, criado em 2014 no Complexo do Alemão, apressou-se em lembrar casos como o do garçom Rodrigo Serrano, assassinado no final do ano passado por portar um perigoso guarda-chuva.

“Só sei que os impactos chegam com mais força na favela”, diz Lana sobre o trabalho da  dobradinha Witzel-Bolsonaro. Ela conta que logo após a divulgação do resultado da eleição presidencial, policiais da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) do Complexo do Alemão dispararam tiros para o alto em comemoração. Muitos moradores dali conviviam com frases como “ano que vem as coisas serão diferentes, vocês vão ver”.

Witzel na formatura da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, na Vila Militar em Deodoro. (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

Em uma incrível coincidência gerada por alinhamentos astrológicos,  nem bem o mandato começou e a família Bolsonaro foi investigada por ligações com milicianos. Flávio Bolsonaro (PSL) dá de ombros ao fato de a mãe e a mulher do capitão Adriano da Nóbrega, conhecido como “Gordinho” pelo Ministério Público do Rio e um dos chefes do Escritório do Crime, terem trabalhado em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Estado. 

Leia também: O Rio de Janeiro após a intervenção: medo ou otimismo?

O Escritório do Crime é tido como o responsável pelos assassinatos do motorista Anderson Gomes e da vereadora Marielle Franco. Segundo um investigador da Delegacia de Homicídios do Rio, o crime teria custado cerca de 200 mil reais. A grande suspeita é de que a morte de Marielle tenha sido encomendada por milicianos justamente por ela investigá-los, denunciá-los e pesquisar a violência do Estado nas favelas cariocas.  

Milícias geram mais medo

Na segunda-feira 18, o Instituto Datafolha e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgaram uma pesquisa que aponta que entre traficantes, policiais e milicianos, os últimos são os mais temidos pelos moradores da capital do Rio. Nas favelas, o medo ocorre em 29% dos residentes e em bairros mais nobres, o número chega 38%.

O pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça Sérgio Moro, que aumenta as possibilidades de agentes do Estado matarem, também é um forte alvo de críticas e assusta movimentos sociais. Para a deputada estadual Mônica Francisco (PSOL), se aprovada a proposta institucionalizará uma prática subjetiva perigosa, um sinal verde para excessos.

Ela acredita que a instituição policial não deve ser vista e preparada como um mecanismo de confronto, mas sim de segurança. “O caso de Pedro, assassinado por um segurança, demonstra o quanto esse discurso de ódio está se espalhando nas relações da vida real, do dia a dia”, resume Mônica, citando o caso ocorrido no dia 14 deste mês em um supermercado.

Leia também: Eleição de Witzel no Rio uniu Flávio Bolsonaro e milícia denunciada

O garoto brutalmente assassinado por um segurança na Barra da Tijuca inspirou a articulação de diferentes entidades sociais que organizaram protestos pelo País pedindo a punição do criminoso. Registre-se: nem Bolsonaro nem Witzel comentaram o caso ou manifestaram qualquer tipo de solidariedade à família da vítima.

Sangue nos olhos e nas mãos

Vanessa Vicente, de 36 anos, militante da rede de cursinhos populares Uneafro, que esteve em manifestação do Rio de Janeiro após a morte de Pedro, acredita que as diferentes vertentes e grupos que compõem o movimento negro precisam deixar as divergências de lado e se unir. Pensamento semelhante ao do estudante de Ciências Políticas Seimour Souza, que afirmou que o “Vidas Negras Importam” não é apenas uma hashtag ou bordão, mas um movimento cada vez mais disposto a lutar por novas políticas de Segurança Pública. 

Grupos cariocas como Carioquice Negra, Comissão Popular da Verdade, Coletivo Luisa Mahin, Coletivo Minas da Baixada e Coletivo Pretaria engrossam o coro: a dobradinha formada por Bolsonaro e Witzel tem sangue nos olhos e uma disposição sem fim de ter as mãos igualmente com sangue. 

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