Felipe Milanez

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Professor de Humanidades na Universidade Federal da Bahia. Pesquisa e milita em ecologia política.

Opinião

Pesquisadores da América Latina e da Europa se unem contra Bolsonaro

Em carta, acadêmicos de 50 universidades denunciam presidente por destruição da Amazônia

Posse de Jair Bolsonaro
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Em carta pública, integrantes do Grupo de Trabalho Ecologia Política do Conselho Latinoamericano de Ciências Sociais, reunindo quase 100 pesquisadores e acadêmicos de 50 universidades de diversos países, denunciam Bolsonaro como responsável político pelos crimes de lesa-Humanidade e lesa-Natureza pelo desmatamento e incêndios na Amazônia.

Não é apenas no Brasil, é preciso reforçar, que os incêndios e os crimes contra a Amazônia, o Cerrado, o Chaco e o Pantanal, estão ocorrendo: também na Bolívia e no Paraguai, onde a mesma política de extrativismo dos recursos naturais está sendo implementada, com incentivos dos governos ao avanço sobre a floresta pelas fronteiras agrícolas.

Mas a responsabilidade do governo Bolsonaro, que ao mesmo tempo em que incentiva a prática de crimes ambientais, resultando num aumento de 287% no desmatamento e 83% dos incêndios, oposto a diminuição de 30% das multas do Ibama e a paralisação das ações de fiscalizações chocam (ou deveriam chocar) o mundo.

A ecologia política, um paradigma interdisciplinar de pesquisas, investiga de forma comprometida as ações políticas que atingem a humanidade e também os animais e a natureza. Entre as pessoas que apoiam a carta e integram o grupo, o ministro do meio ambiente do México, Victor Toledo, a sociologa argentina Maristella Svampa, o economista espanhol Joan Martinez-Alier, o sociólogo venezuelano, Edgardo Lander, pessoas reconhecidas internacionalmente, e que se somam à denuncia do absurdo e da delinquência dos crimes praticados pelo regime Bolsonaro contra a Amazônia.

Abaixo a carta pública do Grupo de Trabalho Ecologia Política, do Clacso:

Os incêndios na Amazônia são crimes políticos de Bolsonaro e a ação é urgente

As recentes imagens que circulam pelo mundo sobre os incêndios na Amazônia, e também no Pantanal, no Cerrado e no Chaco, assim como as nuvens de fumaça sobre a cidade de São Paulo, não são acasos climáticos, mas resultado do avanço do neoextrativismo e da desflorestação voraz intensificadas pelas políticas criminosas do governo Bolsonaro. Este governo está subvertendo o sistema jurídico-institucional para impulsionar uma política delinquente contra os mais fundamentais Direitos Humanos e os Direitos da Natureza. A gigantesca fronteira de fogo que está arrasando a Amazônia constitui um dos capítulos mais aberrantes de seus crimes políticos e merece o mais urgente e ativo repúdio de toda a comunidade política.

Desde a campanha eleitoral do ano passado (agosto a outubro), Bolsonaro tem apoiado milícias, latifundiários, madeireiros, garimpeiros ilegais e todos aqueles que possuem interesse no saque dos recursos naturais; com seu apoio, incentiva a prática de crimes ambientais, a violência contra líderes camponesas/es, indígenas e ambientalistas, bem como a impunidade em favor desses crimes.

As primeiras medidas desde que assumiu o poder se dirigiram a atacar diretamente e suprimir a regulação ambiental e os direitos dos povos indígenas (MP 870/2019). Associado a um discurso explicitamente racista, desde as suas lives no Facebook, incentiva criminosos com promessa de legalizar o garimpo e a mineração, o arrendamento, das plantações de soja dentro dos territórios indígenas. No governo Bolsonaro, seus ministros sistematicamente perseguem aos funcionários e agentes de fiscalização ao mesmo tempo em que cortam os recursos para as operações de comando e controle da lei, por exemplo, cortando os recursos e autonomia do Ibama bem como o apoio da polícia federal para operações ambientais.

As imagens dos fogos na Amazônia brasileira que hoje chocam (ou deveriam chocar) a todo o mundo, são o resultado dessas políticas. O Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe, que Bolsonaro tem atacado com acusações baseadas em fake news, censura e intervenções políticas), registrou mais de 72,8 mil focos de incêndio neste ano; o que significa um aumento de m83% em relação ao ano passado, após um aumento de 278% do desmatamento no mês de julho, enquanto diminuiu em 30% as multas do Ibama.

O que acende esses fogos são ações criminosas que andam de mãos dadas com a voracidade extrativista, seja do agronegócio, da mineração em grande escala ou dos pequenos garimpos, da espoliação florestal, a grilagem e a especulação da terra. Por trás de cada incêndio, avançam também a destruição dos rios e da biodiversidade, a contaminação das águas, do ar e dos solos; os assassinatos, as torturas e perseguições a populações indígenas e comunidades tradicionais (ribeirinhos, camponeses, quilombolas, fundos e fechos de pasto), e a mortandade massiva de animais. Atrás de cada incêndio, se acende também a ameaça de extermínio de estes povos/culturas, assim como também de outras espécies.

Os incêndios que aqui denunciamos e repudiamos não estão apenas acontecendo no Brasil; também há focos originados na Bolívia e no Paraguai, pelos mesmos motivos e atores, pelo que a responsabilidade política de estes crimes compete também aos governos destes países, e em geral, a todos os governos que, independentemente de suas orientações ideológicas, têm propiciado a voracidade extrativista em curso.

Certamente o plano sistemático de destruição da Amazônia não começou com Bolsonaro e nem se restringe ao seu governo, mas desde a sua chegada ao poder, verifica-se um giro perverso de aceleração, intensificação e impunidade. Este avanço demente do neoextrativismo, a desflorestação selvagem e as queimadas descontroladas em um contexto de seca, mostram a chave do capitalismo atual e sua tendência ao ecocídio.

A destruição e o alcance provocado por estas políticas alcançam não apenas a Bacia Amazônica, mas também importantes eco-regiões da América do Sul, como o Pantanal, o Cerrado e o Chaco. A intensificação de um padrão de acumulação baseado na depredação sistemática dos bens naturais desses territórios, nos coloca em uma situação de extrema gravidade, não apenas na Amazônia e suas populações históricas, não apenas na América do Sul, mas ao conjunto das populações humanas que vivem no nosso Planeta Terra.

A queima da Amazônia é um capítulo a mais, mas não menor, se não um dos mais graves, do processo de devastação que a “economia moderna” está levando a cabo em frente de nossos olhos. Em nome do “desenvolvimento” e da “civilização” estamos assistindo a um ato dos mais extremos da barbárie humana. Sentimos e dizemos — por nós mesmos, não pelo “ambiente” — que não podemos permanecer impassíveis ante este macabro espetáculo da morte em grande escala.

Da academia crítica e comprometida com a sociedade e a natureza, fazemos um chamado urgente de repúdio coletivo contra este governo e contra suas políticas criminosas na Amazônia. Fazemos um chamado de solidariedade para multiplicar e coordenar ações de defesa da Amazônia e de seus povos, guardiões da floresta e das águas, de forma a deter e condenar os crimes de lesa Natureza e de lesa Humanidade que está sendo perpetrado pelo atual governo Bolsonaro.

Assinam acadêmicos e pesquisadores de mais de 50 universidades da América Latina e Europa:
Brasil: Felipe Milanez, Camila Moreno, Stephanie Salgado, Luiz Marques, Ricardo Folhes, Caetano De’ Carli, Daniel Jeziorny, Elaine Santos, Cláudia Guedes, Marcos Leite De Matos Todt, Cláudia Guedes, Salvador Schavelzon, Laila Thomaz Sandroni, Gilca, Garcia de Oliveira, Roberto Araújo de Oliveira Santos Júnior,  Laila Sandroni, Eduardo Neves, Vanessa Empinotti, Ricardo Theophilo Folhes, Edna Castro, Thiago Cardozo, Gilca Garcia de Oliveira, Adriana Bravin. Argentina: Horacio Machado Aráoz, Maristella Svampa, Paula Damico, Ana Carballo, María Gabriela Merlinsky, Nazaret Castro, Ariel M. Slipak, Marian Sola Alvarez, Jonatán Andrés Núñez, Laura Álvarez, Gabriela Wyczykier, Lucrecia Wagner, Facundo Rojas, Pablo Bertinat, Leticia Sadi, Sofia Astelarra, Cecilia Anigstein, Pablo Jorge Bertinat, Juan Antonio Acacio, Melisa Argento, Julieta Godfrid, Martín Kazimierski, Gustavo Romeo, Martina Gamba, Bruno Fornillo. Chile: Beatriz Bustos, Francisca Fernández, María Fragkou, Evelyn Arriagada, Santiago Urrutia Reveco. Colombia: Denisse Roca Servat, Catalina Toro Pérez, Tatiana Roa Avendaño, Patricia Noguera, Laura Gutiérrez, Yusmidia Solano Suárez, John Fitzgerald Martinez, Mario Alejandro Pérez Rincón, Paola Marcela Trivino Cruz, Juan Camilo Cajigas, Johan Ardila Espinel, Ximena Osorio Osorio, Mauro Carvajal Guerrero, Camilo Salcedo Montero, María Luisa Eschenhagen, Ana Isabel Márquez Pérez, Yusmidia Solano. Costa Rica: Grettel Navas. Cuba: Maydi Bayona, Gilberto Javier Cabrera Trimiño, Yolanda Wood. Ecuador: Melissa Moreano, Elizabeth Bravo.  Honduras: Sofia Marcia, Carlos Alberto Alvarado Hernandez, Orlando David Murillo Lizardo. México: Enrique Leff, Mina Lorena Navarro, Víctor Toledo Manzur, Omar Felipe Giraldo, Lucia Linsalata, Úrsula Hernández, Sandra Rátiva, Raquel Gutiérrez Aguilar.  Nicaragua: Mario Sánchez. Perú: Gisselle Vila Benites, Raquel Neyra, (Perú), Luis Felipe Torres Espinoza.  Puerto Rico: Gustavo García. Venezuela: Edgardo Lander, Emiliano Terán Mantovani. Bélgica: Robin Larsimont. España: Joan Martínez Alier, Íñigo Arrazola Aranzabal. Francia: Mina Kleiche. Italia: Salvatore Engel-Di Mauro.

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