Daniel Tourinho Peres
[email protected]É professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
No Dia do Professor, plenário da Câmara terá sessão extraordinária sobre situação das universidades e institutos federais e CNPq
As universidades sabiam que os tempos no governo Bolsonaro seriam difíceis. Foram tantos os ataques, tantas as acusações absurdas, que mesmo um breve histórico nos tomaria um certo tempo. As acusações variaram de ser um antro de comunistas a uma savana de zebras gordas. O expediente normal, ainda que indesejável, do contingenciamento, foi transformado em sequestro de recursos e instrumento para inviabilizar nossas atividades. Imaginávamos tempo difíceis, mas não a escuridão e o obscurantismo que logo se mostraram, tudo assentado em um caldo do preconceito, ressentimento e paranoia que, para se legitimarem, se apresentam sob a égide de conservadorismo. Este governo não é conservador, é infame.
Ocorre, porém, que eles não imaginavam a nossa capacidade de resistir. Ao invés de nos fecharmos em copas, soubemos nos dirigir por um lado à sociedade, onde encontramos o apoio que sempre nos deu. Por outro, à Câmara dos Deputados, que se mostrou sensível e solidária à nossa luta. Foi justamente com esta preocupação em mente que a Câmara dos Deputados, a partir de uma iniciativa do Dep. Bacelar (Podemos-BA) convocou para o dia 15 de outubro, dia do Professor, uma Comissão Geral no Plenário. Nesta terça-feira, a partir das 09:30, pesquisadores, reitores e deputados discutirão o futuro da Universidade e do CNPq.
Tal convocação é tanto mais pertinente porque além do “Future-se”, projeto em que vem trabalhando a cúpula do MEC e que representa a morte lenta, dolorosa e silenciosa das Universidades e Institutos Federais, o governo, sem qualquer argumento razoável, revela a intenção de fundir Capes e CNPq, e de transferir a FINEP para o BNDES. Ou seja, além de destruir as universidades, o governo pretende destruir todas as agências de fomento à pesquisa que garantem a produção científica do país.
Não há instituições que mais tenham contribuído para o desenvolvimento do país, seja do ponto de vista econômico, seja do ponto de vista do fortalecimento de uma cultura democrática, do que as universidades. A contribuição é o resultado, justamente, dos três eixos que definem a prática universitária: ensino, pesquisa e extensão. Assim, quando a democracia se vê ameaçada com o retorno da censura, com a defesa da brutalidade e a relativização da tortura, é natural que as universidades se apresentem, para a sociedade e para aqueles que lutam por ela, como um farol de liberdade.
As Universidades e Centro de Pesquisa são tão ou mais importantes hoje, no capitalismo de conhecimento, no qual o conhecimento é força produtiva e quando se esfuma a fronteira entre ciência e tecnologia. Daí que o destino de nossas instituições de ensino e pesquisa públicas como que antecipe o nosso destino como país. É preciso ter claro que o que está em jogo é o interesse comum, algo que deve unir conservadores e progressistas, capitalistas e socialistas, direita e esquerda. A universidade, a ciência, deve interessar a todos, isto é, a todos que não os terraplanistas, os fanáticos e os moralistas de ocasião, ou seja, universidade e ciência certamente não interessam ao núcleo ideológico do governo, a não ser como objeto de ódio e negação.
Temos certeza de que os deputados saberão conduzir a questão e garantir à Universidade e à Ciência a autonomia real que elas precisam e na qual apostamos. Temos certeza de que questões menores serão deixadas de lado e estaremos juntos, docentes, cientistas, técnicos, estudantes, deputadas e deputados, cidadãs e cidadãos, defendendo o interesse comum que se realiza no trabalho diário das universidades públicas brasileiras e dos nossos centros de pesquisa, trabalho que se realiza aqui e agora, mas que tem como visada o futuro. Precisamos, com todas as nossas forças, defender nossas Universidades e agências de fomento à pesquisa contra o obscurantismo que se abate sobre nós. Amanhã todos de olho no Plenário da Câmara!
Os Brasis divididos pelo bolsonarismo vivem, pensam e se informam em universos paralelos. A vitória de Lula nos dá, finalmente, perspectivas de retomada da vida em um país minimamente normal. Essa reconstrução, porém, será difícil e demorada. E seu apoio, leitor, é ainda mais fundamental.
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