Luana Tolentino

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Mestra em Educação pela UFOP. Atuou como professora de História em escolas públicas da periferia de Belo Horizonte e da região metropolitana. É autora dos livros 'Outra educação é possível: feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula' (Mazza Edições) e 'Sobrevivendo ao racismo: memórias, cartas e o cotidiano da discriminação no Brasil' (Papirus 7 Mares).

Opinião

O Brasil se une em defesa da democracia

Até mesmo nos setores mais conservadores da imprensa, a carta ganhou destaque, evidenciando que temos apenas duas escolhas: a civilização ou a barbárie

Ato em defesa da democracia, em São Paulo, em 11 de agosto. Foto: Miguel SCHINCARIOL/AFP
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Diante dos arroubos autoritários oriundos do Palácio do Planalto e das ameaças à democracia, no dia 26 de julho, a Faculdade de Direito da USP lançou a Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito. Inspirada na carta de 1977, que denunciava a “ilegitimidade do governo militar e o estado de exceção”, o documento rapidamente ganhou repercussão nacional, contando com a adesão dos mais variados estratos da sociedade, como empresários, banqueiros, artistas, sindicatos, organizações não-governamentais, políticos, juristas, intelectuais e até mesmo signatários do golpe de 2016, que destituiu a então presidenta Dilma Rousseff de seu cargo, abrindo portas para o horror e o caos nos quais o Brasil vive hoje.

Nos grupos de WhatsApp de que participo, o link para assinatura da carta circulou várias vezes. Nas redes sociais, amigos e conhecidos exibiam com orgulho o apoio ao movimento. Até mesmo nos setores mais conservadores da imprensa, a carta ganhou destaque, evidenciando que no momento atual temos apenas duas escolhas: a civilização ou a barbárie. Com um certo atraso, percebeu-se que a frágil e incipiente democracia brasileira corre perigo.  O momento exige união e um estado de vigília permanente. “A liberdade é uma luta constante”, já disse Angela Davis.

Conforme esperado, não demorou muito para que os adoradores da tortura e do fascismo se movessem contra a iniciativa, tal qual ratos em becos escuros. Máquinas de fake news, contas falsas na internet e o exército do ódio agiram para detratar o movimento iniciado no final de julho. Não adiantou. Enquanto dedilhava esta coluna, 1 milhão de pessoas já haviam assinado a carta em favor das eleições de outubro, do fortalecimento e da permanência do regime democrático.

Às assinaturas somaram-se atos presenciais para a leitura da carta. Na quinta-feira 11, milhares de brasileiros saíram às ruas para ratificar que a democracia é um bem inegociável. No Largo São Francisco, que abriga a Faculdade de Direito da USP, uma multidão tomou o espaço. De maneira emocionada, a professora Eunice Jesus Prudente deu início à solenidade com os seguintes dizeres: “Sou uma mulher preta, cidadã brasileira, uso símbolos importantíssimos das comunidades e das religiões de matriz africana e estou vestida de amarelo, uma das cores do meu santo, Oxum”.

Entre figuras conhecidas do grande público e anônimos, estiveram presentes o ex-ministro da Educação Fernando Haddad, a cantora Daniela Mercury, o jornalista Chico Pinheiro, a filósofa Sueli Carneiro e o ex-jogador Walter Casagrande. O ato contou ainda com a participação de testemunhas dos anos de repressão, como a deputada federal Luiza Erundina.

Em Belo Horizonte, a Casa do Jornalista, que durante os anos de chumbo também foi um espaço de defesa intransigente da liberdade e da justiça, abriu as portas para lembrar que vivemos tempos temerosos e que é necessário agir. Organizada pelo movimento de mulheres “Quem ama não mata”, a ação teve o comparecimento de feministas de várias gerações, com as mais diversas trajetórias de vida.

Coube a mim ler o segundo parágrafo da carta. Fiquei emocionada, atrapalhada. Não se tratava de um dia qualquer. 11 de agosto de 2022 ficará marcado na história como o dia contra o atraso, contra os retrocessos, contra o autoritarismo, conforme expresso no documento que registra o terror que nos amedronta, mas também lança luz aos nossos desejos em relação ao futuro: “No Brasil atual, não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições”.

Na manifestação, encontrei o professor Eduardo de Assis Duarte, por quem tenho muito amor e admiração. A ele, que sabe bem o que é viver sob o signo de uma ditadura, perguntei: “Eduardo, nós vamos vencer?”. “Claro que vamos, minha filha! Você tem alguma dúvida?!” – ele respondeu.

Meu coração serenou. Faço coro às palavras do professor Eduardo. Nós vamos vencer. Tenho certeza.

Estado Democrático de Direito, sempre.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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