Justiça

Moro e milicianos: unidos para um projeto

O mito de que Moro seria a reserva moral do governo Bolsonaro já caiu por terra há bastante tempo

Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Rosângela Moro, esposa do ex-juiz Sergio Moro, disse ao Estadão que enxerga no seu marido e em Bolsonaro uma coisa só, considerando que “o ministro é da equipe do presidente Jair Bolsonaro, dá total apoio para o presidente, inclusive no futuro aí, na reeleição”.

A essa altura do campeonato, o mito de que Moro seria a reserva moral do governo Bolsonaro já caiu por terra há bastante tempo. Embora ainda exista quem se fie no ex-juiz como álibi para continuar dando suporte ao bolsonarismo, o próprio já não faz mais questão de esconder que não passa de uma versão de Bolsonaro que escova os dentes.

Complacente com a corrupção de seu governo, com seus métodos eleitorais delinquentes e com o submundo de assassinos de reputação que recentemente se voltou contra a jornalista Patrícia Campos Mello, o antigo titular da 13ª Vara Federal de Curitiba é adepto dos mesmos valores brucutus e anti-iluministas que marcam o terraplanismo do clã e seus seguidores. E isso inclui também o pendor para o crime.

Flávio Bolsonaro e o ex-assessor, ex-amigo, ex-morista e ex-policial Fabrício Queiroz (Foto: Reprodução)

Nem o mais lunático olavista nega os vínculos familiares, afetivos e profissionais de longa data que a família Bolsonaro possui com milicianos. Por isso a base do bolsonarismo deveria perder a vergonha e passar a defendê-los à luz do dia da mesma maneira que defende Paulo Guedes e Moro. Não é isso que o mandatário e seus filhos sempre fizeram?

O namoro de Guedes com Bolsonaro, por sinal, vem antes do romance com Moro, apesar de não se compararem com os trinta anos da relação com Queiroz. Se são todos uma coisa só, como perfeitamente observou Rosângela, a defesa intransigente de milícias como o Escritório do Crime, comandada pelo falecido Adriano da Nóbrega, deveria estar logicamente na agenda dos súditos do lavajatismo.

Recentemente, o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) chamou Moro de capanga de miliciano durante sessão na Câmara dos Deputados. Nas redes sociais, o ex-juiz acusou Glauber e seu colega Marcelo Freixo de terem se posicionado a favor das milícias no debate sobre o pacote anticrime. Freixo ganhou projeção nacional depois de presidir a CPI das milícias na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro e indiciar um sem-número de bandidos. Em 2018, escapou por pouco de ser executado por milicianos após a interceptação de um plano de assassiná-lo. Na terra plana de Moro, porém, é o seu chefe que é malquisto pelo crime organizado.

O projeto de Moro/Bolsonaro é um projeto de morte, de execuções sumárias, de inchaço do estado policial e de aumento da matança da juventude pobre e negra, alvo preferencial das forças policiais.

É isso que o mandatário vem defendendo durante toda a sua vida pública. E não há uma fagulha de indício de que Moro discorde de uma só vírgula das barbaridades que faz e fala, seja nos ataques a jornalistas, no racismo contra quilombolas e indígenas, nas ofensas misóginas e homofóbicas, na destruição do que restou da mata nativa do país e na incontida devoção ao gangsterismo miliciano. São uma só pessoa, como bem observou Rosângela.

Em uma mea culpa fajuta, o diretor José Padilha publicou em abril do ano passado artigo na Folha de S. Paulo onde se lamenta por ter apoiado o hoje ministro da justiça. Sua sagacidade é semelhante à de Rosângela: Moro ignora as milícias pois trabalha para a família Bolsonaro, cujo absoluto domínio eleitoral em Rio das Pedras, reduto de milicianos que escondeu Queiroz tão logo estourou o escândalo das rachadinhas, não se dá por acaso.

Quando a juíza Patrícia Acioli foi executada com 21 um tiros em 2011, Flávio Bolsonaro foi ao Twitter afagar os seus assassinos e justificar sua morte. A forma com que tratava policiais teria contribuído para que tivesse muitos inimigos. Acioli condenara dezenas de milicianos e combatia grupos de extermínio e máfias do transporte alternativo, tradicional meio usado pela milícia para lavar dinheiro.

Quem defende Moro tem a obrigação moral de defender o modus operandi daqueles que Flávio considera inimigos de Acioli, parte indissociável do DNA bolsonarista, e suas mais proeminentes estrelas: Adriano da Nóbrega, Fabrício Queiroz, Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, estes últimos acusados de assassinar Marielle Franco, uma pedra no sapato do bolsonarismo tanto em vida como na morte.

Fora disso, é bolsonarismo nutella.

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