Valdemar Augusto Angerami

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É psicoterapeuta existencial. Lecionou em cursos de pós-graduação em Psicologia da Saúde na PUC de São Paulo e na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Autor com o maior número de livros publicados em psicologia no Brasil, adotados nas principais universidades da América Latina e Europa.

Opinião

A universidade não está imune à idiotia bolsonarista

Ela admirava meu trabalho, até conhecer minhas posições políticas. Em questão de segundos, virei alvo de sua fúria

Jair Bolsonaro (Foto: Alan Santos/PR)
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Final de conferência. Como quase sempre ocorre nessas ocasiões, pessoas se reúnem ao meu entorno para cumprimentos, dedicatórias de livros, fotos, congratulações. Quase imperceptível, uma mulher de estatura mediana se aproxima e diz: “Professor, gostei muito de sua palestra. Sou sua fã desde a graduação, quando já estudava seus livros. Agora, na pós, meu trabalho é todo embasado em seus livros”. Agradeço com palavras de reconhecimento, elogios tão prazerosos. E ela continua: “Só não entendo como o senhor, com obras tão importantes, pode ter uma posição política tão radical”.

Respondo que apenas tento me colocar em defesa dos desvalidos e pela construção de uma sociedade mais justa, digna e fraterna. Ela prossegue: “Mas essa posição não contribui para a construção do País que queremos, um Brasil verde e amarelo”. Daí silencio, pois fica evidenciado que estou diante de uma bolsonarista, e sei que de nada adianta argumentar. Ademais, a situação não era para isso. Diante do meu silêncio, talvez ela tenha interpretado que havia me recolhido diante da força irrebatível de suas palavras, algo que ela deve ter considerado eloquente. Julgando que estava acuado, a mulher insiste: “Precisamos de um novo País”.

“Filho da puta, escroto. O mito deveria pisotear a cabeça de vocês para acabar de vez com isso”

Continuo calado, diante do constrangimento de todos que presenciavam a cena. Ela, então, solicita: “O senhor poderia me dar seu número de telefone para mantermos contato?” Respondo que não mantenho relações interpessoais com bolsonaristas, nem mesmo em nível virtual. Ela se destempera e, completamente descontrolada, desata a berrar: “Viado! Você não passa de uma bicha enrustida… Filho da puta, escroto. O mito deveria pisotear a cabeça de vocês para acabar de vez com isso”.

A segurança da universidade corre para retirá-la do loocal, pois a cena tomou proporções inefáveis. Inacreditável, simplesmente inacreditável. Estamos sob a égide do bolsonarismo, e uma colega considera válido atacar dessa maneira quem ela julga contrário ao seu projeto de País. Sou obrigado a concordar com Fernando Henrique Cardoso quando ele diz que o Bolsonaro não mostra seu pensamento, pois não tem ideia alguma…

A boçalidade elegeu um presidente que não consegue raciocinar em termos de abstração, tampouco articular o tempo de verbo e do sujeito na construção de uma frase. Esse será o nosso presidente, alguém revestido de um discurso repleto de violência e incapaz de responder ao que quer que seja? Tudo ele encaminha para os assessores, pois é, verdadeiramente, incapaz de qualquer raciocínio. A boçalidade o elegeu como mito e, na realidade, quem mitifica essa configuração de ausência de pensamento não pode ser chamado apenas de boçal. O adjetivo expressa pouco.

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