Economia

A mudança nos impostos não pode surrupiar a renda dos mais pobres

Não se pode permitir que a reforma Tributária faça o mesmo que a reforma da Previdência. Esta é a próxima batalha

Em 2017, a extrema pobreza cresceu 11% e atingiu 14,8 milhões de brasileiros
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Países economicamente mais desenvolvidos, politicamente mais democráticos e socialmente mais justos na distribuição da riqueza e da renda distinguem-se, entre outros aspectos, por possuírem um padrão de financiamento do setor público com estruturas tributárias que se notabilizam por dois aspectos fundamentais: eficiência econômica e justiça social

Pela própria natureza das economias capitalistas contemporâneas, os sistemas tributários caracterizam-se pela incidência de carga tributária sobre a produção e circulação de mercadorias (bens e serviços) ou consumo, a renda (lucros, salários e rendimentos mistos), a folha salarial e o patrimônio.

É consenso que os impostos sobre o patrimônio e a renda permitem um caráter mais acentuadamente progressivo na tributação, ou seja, quanto maiores as riquezas/rendas, maiores as alíquotas de contribuição. No caso dos impostos indiretos, o caráter regressivo do imposto torna-se evidente, pois a carga de tributo embutida no preço do produto alcança uma proporção relativamente maior no orçamento familiar dos mais pobres e das classes trabalhadoras.

Essas democracias política, econômica e socialmente avançadas podem e devem nos servir de referência, ressalvadas as nossas especificidades nacionais, pois a maioria da sua arrecadação origina-se dos chamados impostos diretos, sobre a renda e o patrimônio, sendo em menor monta a parcela procedente dos chamados impostos indiretos, sobre o consumo de bens e serviços.

Definitiva e infelizmente esse não é o caso do Brasil. Nossa estrutura tributária está bastante concentrada em impostos sobre o consumo: IPI, PIS e Cofins, na esfera federal, ICMS na esfera estadual e ISS na esfera municipal. A médio e longo prazo, o ideal seria caminhar na direção de maior participação relativa dos impostos sobre o patrimônio e a renda na carga tributária, objetivando elevar a progressividade da estrutura tributária brasileira e, por conseguinte, melhorar a distribuição pessoal de renda, tendo em vista que o Brasil ainda possui uma distribuição extremamente desigual e especialmente perversa para os mais pobres e as classes trabalhadoras.

Os impostos sobre o consumo possuem, no entanto, um bom potencial arrecadatório e, a depender de como são estruturados, podem permitir maior produtividade, eficiência e competitividade a uma economia. Em relação a esses últimos aspectos, absolutamente não é o que ocorre no nosso atual modelo de tributação de bens e serviços.

Dentro deste contexto, como parlamentar federal, tenho me debruçado sobre a questão da reforma tributária. É extremamente importante que a PEC 45, que trata do tema, avance na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados. Acima de tudo, é essencial que o debate seja pautado em cima de uma reforma tributária que ataque os aspectos mais negativos do nosso modelo de tributação de bens e serviços: pouca transparência, complexidade legislativa, cumulatividade, não neutralidade, injustiça fiscal, principalmente contra os entes subnacionais menos desenvolvidos, entre outras distorções.

Neste momento em que o governo federal – com o beneplácito da plutocracia financista e da mídia corporativa – avança na aprovação, a toque de caixa, de uma verdadeira “deforma” da Previdência, de caráter ultraliberal, que joga o peso do ajuste das contas públicas sobre os mais pobres e as classes trabalhadoras e tenta vendê-la como a bala de prata ou a panaceia que geraria um novo “milagre econômico” no País, é urgente que o campo progressista tome a frente na condução desse debate.

Sem dúvida, vivemos um período no qual os desequilíbrios financeiros do setor público precisam ser considerados. A estratégia austericida usada, porém, pelas “autoridades econômicas”, de cortar despesas primárias, não só não resolveu o problema, como o agravou. 

Esta abominável reforma da Previdência trata-se de um ajuste de visão caolha nas contas públicas, já que só olha para a parte da despesa primária e exclui de qualquer discussão a despesa financeira. Em nenhum momento se discute a questão da receita, que é condição lógica, junto à despesa, de qualquer equilíbrio financeiro do setor público. A sociedade brasileira precisa estar atenta e não se deixar levar pelas falácias e manipulações propagadas pelo governo e seus aliados. Uma reforma tributária socialmente correta talvez seja a única chance que o Brasil ainda tem para se reerguer quando finalmente passar esta tempestade que hoje nos assola.

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