Henry Bugalho

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Henry Bugalho é curitibano, formado em Filosofia pela UFPR e especialista em Literatura e História. Com um estilo de vida nômade, já morou em Nova York, Buenos Aires, Perúgia, Madri, Lisboa, Manchester e Alicante. Por dois anos, viajou com sua família e cachorrinha pela Europa, morando cada mês numa cidade diferente. Autor de romances, contos, novelas, guias de viagem e um livro de fotografia. Foi editor da Revista SAMIZDAT, que, ao longo de seus 10 anos, revelou grandes talentos literários brasileiros. Desde 2015 apresenta um canal no Youtube, no qual fala de Filosofia, Literatura, Política e assuntos contemporâneos.

Opinião

A militância bolsonarista em ação: “Se Olavo disse, ele tem razão”

Uma militância bolsonarista é, antes e acima de tudo, uma militância olavista. O delírio de um ególatra

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Esta semana, Olavo de Carvalho, o astrólogo guru do bolsonarismo, propôs a criação de uma militância pró-Bolsonaro, isto é, a formação de grupos em defesa do presidente não importando o que ele fizer/disser. A prioridade é proteger o governante contra seus inimigos, ignorar eventuais denúncias de corrupção que envolvam o clã Bolsonaro e concentrar-se naquilo que eles entendem como “revolução conservadora”.

A simples noção de militantes pró-Bolsonaro já é esdrúxula por si própria, posto que nos remete a alguns dos períodos mais obscuros da História recente da política mundial. São justamente governantes autoritários aqueles que recorrem a milícias e militantes em torno de sua personalidade; basta nos lembrarmos da Juventude Hitlerista, que visava desde cedo inculcar nos jovens alemães a devoção ao líder supremo nazista.

Não demorou para que, horas depois, Allan dos Santos, um dos mais afoitos discípulos do Olavo e acusado pelo músico Lobão, ex-amigo do ideólogo e ex-apoiador do Bolsonaro, e por Alexandre Frota, outro que caiu na desgraça diante do governo, de ser um dos cabeças das milícias virtuais bolsonaristas, criasse um formulário para recrutamento de militantes, portanto, da ideia à prática. “Se Olavo disse, então, obviamente, ele tem razão.”

A militância é parte integral de diferentes lutas políticas, incluindo de pautas propositivas e em prol de direitos humanos básicos ou do meio ambiente. A militância não é, em sua natureza, algo negativo. Para muitas ideias, especialmente quando são nobres e justas, a militância se faz necessária. É difícil conceber grandes mudanças estruturais na profundamente racista sociedade norte-americana, por exemplo, sem os esforços de militantes por direitos civis, constantemente protestando nas ruas e tornando visíveis suas pautas. O mesmo vale para lutas por direitos trabalhistas, das mulheres ou da comunidade LGBTQ+. São manifestações visando o reconhecimento de indivíduos há muito oprimidos, marginalizados ou minoritários. É um embate por legitimidade e aceitação.

Por outro lado, é mais complicado compreender a função de uma militância pró-governo, ou até mais do que isto, pró-líder deste governo. Como representante eleito, com sua base de eleitores, a legitimidade dele já é o resultado das urnas. É evidente que os partidos possuem a sua militância, mas que geralmente se agregam em torno de seus programas, não em torno de personalidades.

Particularmente, vejo grandes riscos na personalização da política, orbitando lideranças fortes, em especial quando tais lideranças demonstram uma profunda inclinação antidemocrática, pois isto abre as fissuras para uma projeção messiânica que desde há muito está presente na sociedade brasileira – a expectativa de que o líder, neste caso o presidente, vá resolver todos os problemas dos brasileiros. Isto é autoengano, já que, nem mesmo em regime autocráticos, um líder consegue se sustentar sem uma base consistente de apoiadores, tampouco possui poderes extraordinários para sanar todas as mazelas de suas nações, aliás, autocratas costumam mais se importar com as elites que os sustentam no poder do que de fato com a população como um todo. O banquete é para os amigos, as migalhas para todos os demais.

O que tem havido, e isto se reflete nesta convocação de Olavo de Carvalho, é uma escalada rumo à radicalização de posições. Primeiro, Bolsonaro é alçado ao status de mito, isto antes mesmo da eleição, depois, de líder supremo e inconteste desta revolução conservadora que promete ser a única possibilidade desta extrema-direita tupiniquim de pôr um fim à tal “hegemonia esquerdista” que povoa seus pesadelos.

Este muro de contenção tem dois objetivos principais: o primeiro, de sufocar o esvaziamento da base bolsonarista, graças aos crescentes índices de impopularidade do presidente, portanto, é fundamental que esta militância ocupe as redes sociais e, possivelmente, as ruas, como uma demonstração de força, de que ainda há um resquício de vitalidade no governo, e, em segundo lugar, para consolidar a influência ideológica de Olavo de Carvalho e seus discípulos nos rumos do país, pois, em praticamente nenhuma outra circunstância em nenhuma outra administração, o astrólogo da Virgínia encontraria eco para suas teorias conspiratórias, seus insultos e seus pensamentos destrutivos. No fundo, a união entre Olavo e Bolsonaro foi o casamento perfeito entre ideias estapafúrdias e alguém capaz de aplicá-las na política.

Enfim, a formação desta militância bolsonarista é o último suspiro de Olavo no intuito de resguardar a sua influência e manter-se relevante. A defesa de Bolsonaro é, na verdade, o instinto de autopreservação de Olavo em ação. Sem Bolsonaro, Olavo voltará a ser a mera excentricidade que sempre foi, motivo de idolatria cega entre seus seguidores, mas de chacota e desprezo na Academia e por qualquer um que compreende a futilidade de suas ideias.

Uma militância bolsonarista é, antes e acima de tudo, uma militância olavista. O delírio de um ególatra se agarrando às paredes do poço no qual precipitou o Brasil.

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