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Opinião

A juventude no futuro: impactos da reforma da Previdência

Os jovens, que já estão entrando no mercado com mais dificuldade, estarão também entrando numa vida de trabalho sem direitos

Foto: Valdecir Galor/SMCS
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A juventude no Brasil está desalentada. Hoje, 1,8 milhão de jovens não têm mais esperança de conseguir um novo emprego, número três vezes maior do que em 2014. O desemprego afeta essa geração com o dobro de força do que o resto da população. Se o maior problema do Brasil hoje é o desemprego, persistente em 12,7% da população em idade ativa – patamar mais elevado da década – é ainda maior para as brasileiras e os brasileiros entre 16 e 24 anos, faixa em que chega a quase 30%. Dos poucos que conseguiram um primeiro emprego ano passado, apenas 1/4 têm carteira assinada. Foram cortadas quase que pela metade a abertura de vagas para quem busca o primeiro emprego e a renda também caiu: hoje, o salário médio dos jovens é 110 reais menor do que era em 2014.

Nossa juventude cresceu em um País com esperança. Quando os jovens de hoje eram crianças, o mercado de trabalho para seus futuros era cheio de empregos e possibilidades. Os jovens de hoje tiveram uma infância com direito a sonhar: aumentavam as vagas nas faculdades, que também ficavam cada vez mais acessíveis, passando a ser uma possibilidade real para todas as brasileiras e todos os brasileiros; eram criadas vagas de trabalho e o salário mínimo era valorizado, e o Brasil dos governos Lula e Dilma tinha cada vez mais direitos, emprego e educação. O Brasil de hoje em dia é muito diferente disso.

 

Desde o golpe de 2016, os direitos das brasileiras e dos brasileiros estão sendo retirados. A prometida retomada do emprego não acontece, ao mesmo tempo em que se avoluma a informalidade. As trabalhadoras e os trabalhadores estão cada vez mais com menos direitos, as escolas e as faculdades estão perdendo investimentos na medida em que os programas de financiamento da educação e as cotas sociais e raciais, que possibilitaram o acesso de tanta gente ao ensino superior, correm grande perigo com as políticas impostas pelo governo de Bolsonaro. Até mesmo a gratuidade das universidades públicas está sendo questionada.

É a maior crise que passamos em muito tempo, e que parece estar longe do fim.

Medidas recessivas

Os poderosos tentam emplacar, desde o governo Temer, que a saída para a crise é a reforma da Previdência. Com o país que vivemos hoje, é certo que isso não é verdade. O Brasil precisa de crescimento, de emprego e de renda, e não de medidas recessivas. Ainda pior, a proposta de Bolsonaro e Paulo Guedes não é uma proposta de reforma da Previdência, é uma proposta de destruição da Seguridade Social, do sistema de proteção social implantado na Constituição Federal de 1988 e que foi fruto de muitos embates e lutas para que tivéssemos a saúde, a assistência social e a previdência dentro do orçamento. Trata-se de eliminar os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras, conquistados com tanta luta, preservando o lucro dos rentistas e dos especuladores. E, pelo panorama vivido pela juventude, de altos índices de desemprego e de informalidade, esse ataque atinge com o dobro de força aqueles que ainda têm uma vida de trabalho pela frente.

O que está em jogo? É a disputa pela renda. O que eles pretendem é entregar todos os fundos públicos (a Previdência, o Fundo de Garantia, o Fundo de Amparo ao Trabalhador etc) para o sistema financeiro privado. A proposta de Paulo Guedes, além disso, retira os direitos da Previdência da Constituição, acabando com qualquer garantia aos trabalhadores. Estaria de fora da Constituição o direito de se aposentar e conseguir dignidade após uma vida de trabalho, com justiça social. Estariam de fora também os direitos que a Previdência garante a quem está trabalhando: o seguro-desemprego, as pensões, a licença médica remunerada, o auxílio acidente de trabalho e outros tantos direitos.

Para as mulheres, que já sofrem com a maior vulnerabilidade no mercado de trabalho, com menores salários, têm também na Previdência o direito tão importante à licença-maternidade remunerada. Acreditem, nem isso estaria assegurado em nossa Constituição. Os jovens, que já estão entrando no mercado de trabalho com mais dificuldade e com maior grau de informalidade, estarão também entrando numa vida de trabalho sem direitos.

Direitos em jogo

A destruição da Previdência de Bolsonaro e Guedes propõe a mudança do regime atual, de repartição – baseado na solidariedade -, para um regime de capitalização – baseado na individualidade. No regime atual, uma parte da previdência é paga pelo trabalhador e a outra é paga pelo patrão. Já na capitalização, só o trabalhador paga, sem responsabilidade do patrão. Como Paulo Guedes disse, “quem vai entrar agora no mercado de trabalho, poderá escolher entre um mundo com direitos mas sem emprego, ou um mundo com empregos (precarizados) e sem direitos”. Esta chantagem, na verdade, não dá direito de escolha algum aos jovens.

Somado a isso, será mais barato contratar os avós, que serão isentos de pagamento de fundo de garantia pela empresa, do que os netos. Mais uma vez, buscando baratear os custos do patrão às custas das trabalhadoras e dos trabalhadores, e criando um mercado de trabalho ainda mais inacessível para a juventude. Para a juventude, uma nova dificuldade, entre as já existentes.

Para os raros empregos que ainda tiverem Previdência, a exigência de 20 anos de tempo mínimo de contribuição, em um cenário com cada vez mais vagas informais, sem contratos, e com alta rotatividade no mercado de trabalho, a população que poderá acessar a aposentadoria será muito menor. O longo tempo exigido de trabalho é uma outra forma de forçar os jovens a recorrerem cada vez mais a empregos com menos direitos que, ao fim e ao cabo, serão os únicos empregos disponíveis. Todos que não atingirem o tempo mínimo recorrerão ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que na proposta apresentada e já prevendo uma demanda enorme na velhice, será cortado mais do que pela metade e fixado em 400 reais, não garantindo dignidade alguma ao povo que passará toda uma vida trabalhando.

Formação será mais custosa

Além disso, a entrada antecipada forçada no mercado de trabalho deixará mais custoso se dedicar à formação profissional ou acadêmica. Diferentemente dos últimos anos, em que a juventude podia se dedicar à sua formação, aumentavam as vagas nas universidades e se tornavam mais acessíveis, havia programas de financiamento para a educação e aumentavam os cursos técnicos e profissionalizantes. Com a reforma de Bolsonaro e Paulo Guedes o incentivo será para os jovens estudarem por menos tempo e, de preferência, à distância. A educação, que também está no centro dos ataques deste governo, será igualmente afetada pela reforma da Previdência. Portanto, mais um ataque à juventude.

 

A juventude brasileira, aquela que vislumbrava um futuro de possibilidades, hoje se depara com uma dura realidade em que é obrigada a enfrentar a mentira de que é necessário escolher entre direitos e empregos. Assiste a ações de um governo que não cria empregos e ainda tenta tirar nossos direitos. Apesar de hoje tentarem tirar a esperança, a juventude já viu um Brasil diferente, em que isso não era uma escolha. No Brasil de Lula, dos governos do PT, nós tínhamos empregos com direitos, tínhamos carteira assinada e salário valorizado. As brasileiras e os brasileiros sabem que é possível fazer diferente, e que um presidente não tem que fazer o povo escolher entre direitos e empregos. Em mais de 100 dias de governo Bolsonaro, ainda temos 12,7 milhões de brasileiras e brasileiros desempregados.

A Previdência Social não se restringe à aposentadoria, mas abrange uma lista de direitos de todas e todos os trabalhadores. Defendê-la é defender a dignidade do trabalho. Não podemos aceitar que o patrão não tenha nenhuma responsabilidade sobre os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores. Não há déficit que se resolva sem empregos, sem direitos, sem distribuição de renda e sem educação, ciência e tecnologia. A juventude, que ingressa agora no mercado de trabalho, será atingida com o dobro de força, pois não só enfrentará um futuro com muito mais dificuldades, como trabalhará uma vida inteira sem direitos. 1,8 milhão de jovens parecem ter perdido a esperança. É tarefa fundamental da juventude se somar na luta contra a reforma da Previdência, na defesa dos nossos direitos, pela defesa de empregos, pelo direito de estudar, pela retomada da esperança e oportunidade de voltar a sonhar.

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