Tânia Oliveira

Secretaria-Executiva Adjunta da Secretaria-Geral Presidência da República, integrante da ABJD

Opinião

A jogada de mestre de Alexandre de Moraes

O discurso de posse foi o coroamento de sua aula de como emparedar um inimigo público

O ministro Alexandre de Moraes, do STF e do TSE. Foto: Fellipe Sampaio/STF
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Enxadristas ensinam que jogadas táticas possuem o objetivo de ganhar o jogo com estratégia, atacando em mais de um ponto, podendo o jogador sacrificar alguma peça no processo, obrigando o adversário a perder um das suas que seja essencial e deixando o rei mais desprotegido.

Eu não sei se Alexandre de Moraes joga xadrez. Tampouco estou fazendo nenhum paralelismo com o filme estrelado pelo Antony Hopkins em 2015, mas o que ele protagonizou na noite da terça-feira (16) em Brasília foi, sem sombra de dúvida, o que se pode chamar de jogada de mestre. Um xeque. A esperar o que ainda pode vir de uma partida em vantagem consolidada.

Importante pontuar que Alexandre de Moraes não apenas troca farpas com Jair Bolsonaro no debate público. Quando isso é dito minimiza-se a gravidade dos fatos e o grau de tensionamento deles decorrente.
Em agosto de 2021, Bolsonaro apresentou no Senado um pedido de impeachment de Moraes. Ato contínuo, em plena Avenida Paulista, chamou o agora presidente do Tribunal Superior Eleitoral de ‘canalha’. Já em maio deste ano, apresentou uma noticia-crime no Supremo Tribunal Federal e uma representação na PGR em que acusa Moraes de abuso de autoridade na condução do Inquérito das Fake News.

Além dos ataques cotidianos que estimulam a violência contra as instituições, com foco em alguns dos ministros do Supremo Tribunal Federal, há um acúmulo de ações concretas contra Moraes que nem de longe podem ser subestimadas.

Posses no Poder Judiciário, em regra, são enfadonhas. Como servidora eu evitava ao máximo ter que participar de alguma. Longos e protocolares discursos, sem qualquer novidade, elogios a quem sai e a quem chega. Mas não essa. Essa foi um evento político com P maiúsculo.

Para anular qualquer acusação de parcialidade (e por respeito à institucionalidade), Moraes convidou pessoalmente o Presidente da República. Ao mesmo tempo, mandou às favas qualquer contenção de constrangimentos, convidando também os ex-presidentes – o que colocou frente a frente adversários políticos.

Além de autoridades dos Poderes Judiciário e Legislativo, o evento contou com a presença de 22 governadores dos Estados brasileiros, diversos prefeitos, incluindo os das capitais dos três maiores colégios eleitorais: São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. A reunião dava a ideia de uma grande festa democrática, de respeitos mútuos às divergências e diferenças.

Era o ambiente perfeito do estrategista.

Com Bolsonaro ao seu lado, Moraes demonstrou gentilezas e trocou afagos. No entanto, somente ele discursaria. Ao outro, caberia ouvir calado.

O discurso de posse foi o coroamento de sua aula de como emparedar um inimigo público. Os elogios à Justiça Eleitoral falaram da coragem de defender a democracia dos que são contrários aos ideais constitucionais e valores republicanos vinculada à implementação e aperfeiçoamento das urnas eletrônicas.

Ao falar de liberdade, Moraes cravou, sem meias palavras, que a Constituição não permite a utilização da liberdade de expressão como escudo para a prática de discursos de ódio, antidemocráticos, ameaças, agressões, violência, infrações penais e toda sorte de atividades ilícitas. “Eu não canso de repetir, e obviamente não poderia deixar de fazê-lo nessa oportunidade, nesse importante momento: liberdade de expressão não é liberdade de agressão.”

Moraes naquele momento era Bolsonaro na Avenida Paulista no 7 de Setembro  ovacionado por seu público ao falar contra tudo que promove seu adversário. E bradou contra manifestações, sejam pessoais, sejam nas redes sociais ou por meio de entrevistas, que preguem o rompimento do Estado de Direito.

Mas, diferentemente de Bolsonaro, seu público era diverso. E ao contrário de Bolsonaro, ele não precisou de palavras chulas nem de menção a seu nome, todos e todas compreenderam perfeitamente os recados dados.

Este texto não representa, necessariamente, a opinião de CartaCapital.

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