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Taleban anuncia ‘anistia geral’ no Afeganistão e pede apoio das mulheres

O grupo tenta reestabelecer a ordem diante do pânico da população com a tomada do país. Suas promessas, contudo, são vistas com desconfiança

Membros do Taleban ocupam Kandahar, no Afeganistão. Foto: AFP
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O Taleban anunciou “anistia geral” em todo o Afeganistão nesta terça-feira 17 e pediu às mulheres que se juntem ao governo, em uma tentativa de arrefecer o sentimento de pânico causado na população com a chegada dos revolucionários ao poder. O grupo, no entanto, não mencionou como a anistia se daria, na prática.

“O Emirado Islâmico não quer que as mulheres sejam vítimas”, declarou um Enamullah Samangani, membro da comissão cultural do Taleban. “Elas deveriam estar na estrutura governamental de acordo com a lei sharia”, completou sem especificar como a lei islâmica seria interpretada.

Nesta terça, um porta-voz do Taleban concedeu entrevista à rede de televisão Tolo News. O representante foi entrevistado por uma apresentadora mulher, que não utilizava burca, o que não é permitido pelo regime. O Taleban também nunca permitiu que mulheres trabalhassem, estudassem ou saíssem às ruas sem a companhia de um homem.

Por essas razões, as declarações dos líderes do regime foram recebidas com ceticismo por afegãos e representantes de direitos humanos da comunidade internacional. A Agência da ONU para Refugiados (Acnur) emitiu um comunicado após as declarações, assinado pelo porta-voz Rupert Colville. Ele destacou que as promessas precisam ser honradas e que, por enquanto, foram recebidas com algum ceticismo.

Na segunda-feira, milhares de pessoas invadiram a pista de um aeroporto para tentar fugir do País. Vídeos circularam mostrando a suposta queda de pessoas das aeronaves já em voo. Nesta terça, a imprensa local aponta que muitas lojas reabriam no País, há tráfego intenso e circulação de pessoas pelas ruas.

O Taleban tomou o palácio presidencial no domingo 15. O presidente afegão, Ashraf Ghani fugiu do país.

Ex vice-presidente afegão promete resistir aos taleban

O ex vice-presidente afegão, Amrullah Saleh, prometeu seguir com a resistência ao Taleban. Saleh se encontra na última região afegã que ainda não está sob controle dos talebanss: o vale de Panshir, ao nordeste de Cabul.

“Não vou decepcionar as milhões de pessoas que me ouviram. Nunca estarei sob o mesmo teto que os talebans. NUNCA”, escreveu em inglês no domingo em sua conta no Twitter antes de passar para a clandestinidade.

No dia seguinte apareceram nas redes sociais imagens do ex-vice-presidente com Ahmad Masud, filho do comandante Ahmed Shah Masud, assassinado em 2001 pela Al-Qaeda, juntos no vale de Panshir.

Masud anunciou na segunda-feira em um artigo publicado por uma revista francesa que será oposição aos talebans e assumirá a luta pela liberdade liderada por seu pai, herói da resistência contra a União Soviética.

Os dois homens parecem estar definindo a primeira peça de uma rebelião contra o novo regime. Homens armados começaram a seguir para o vale de Panshir, uma zona de difícil acesso e que nunca passou ao controle dos talebans: nem durante a guerra civil da década de 1990, nem durante a ocupação soviética, uma década antes.

“Resistiremos” 

Para Saleh, natural de Panshir, esta seria a última de uma longa lista de batalhas. Este afegão lutou ao lado do comandante Masud na década de 1990. Depois integrou seu governo, que foi derrubado pelos talebans em 1996, quando os insurgentes entraram em Cabul. Ele disse que os talebans torturaram sua irmã para tentar retirá-lo de seu esconderijo.

“Minha opinião dos talebans nunca mudou”, afirmou no ano passado em um artigo publicado pela revista Time.

Depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos, ele se tornou uma importante fonte de informação para a CIA.

Isto o levou, após a queda dos talebans, a comandar, entre 2004 e 2010, a Direção de Segurança Nacional (NDS), a agência de inteligência afegã.

Continuar a luta

No cargo, ele criou uma ampla rede de espiões e infiltrados entre os talebans, no Afeganistão e também no Paquistão, onde estão grande parte dos líderes insurgentes.

Desta maneira, segundo ele, reuniu provas de que os insurgentes continuavam sendo beneficiados pelo apoio do exército paquistanês, informação desmentida pelas Forças Armadas do país vizinho.

Sua ascensão à vice-presidência, no entanto, foi marcada por vários contratempos. Em 2010 foi demitido do cargo de diretor da NDS, após um humilhante ataque contra uma conferência de paz em Cabul.

Saleh se afastou da política por alguns anos, mas continuou atacando os talebans e o Paquistão nas redes sociais.

Em 2018, ele foi ministro do Interior por alguns meses, depois de uma aliança com o presidente Ashraf Ghani, que no domingo fugiu do Afeganistão para o exterior. Assumiu a vice-presidência em 2019.

Saleh escapou de vários ataques talebans, o mais recente em setembro de 2020, quando um carro-bomba explodiu na passagem de seu comboio e matou pelo menos 10 pessoas.

Horas depois do ataque, ele apareceu em um vídeo, com a mão esquerda enfaixada, e prometeu devolver cada golpe. “Continuaremos nossa luta”, afirmou.

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