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Sem máscara e desdém pela Covid-19: médicos condenam atitude de Trump no retorno à Casa Branca

‘Não deixem que [o coronavírus] domine suas vidas, saiam, tenham cuidado’, publicou o presidente em suas redes sociais

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, saindo do Walter Reed Medical Center em Bethesda, Maryland. Foto: SAUL LOEB/AFP
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A encenação do presidente Donald Trump na varanda Truman da Casa Branca, arrancando sua máscara depois de ter alta do hospital militar Walter Reed, na noite de segunda-feira 5, recebeu duras críticas de cientistas e médicos nos Estados Unidos. “Estou buscando palavras, isso é completamente irresponsável”, disse Harald Schmidt, professor de ética médica e saúde pública na Universidade da Pensilvânia ao jornal The New York Times (NYT).

O republicano foi diagnosticado positivo para coronavírus há apenas cinco dias e ainda é contagioso. Trump posou para fotos com ares de vitória da Covid-19, mas seu médico, Sean Conley, havia feito mais cedo um anúncio mais cauteloso: “Trump pode ainda não estar completamente fora de perigo”.

O presidente americano desceu do helicóptero que o trouxe do hospital, cruzou o gramado da Casa Branca acenando para as câmeras que o aguardavam e subiu a escada em direção à varanda de sua residência. Ainda parecendo tenso, ele ajustou o paletó, tirou a máscara e ergueu os polegares em sinal de vitória – um gesto de desafio para um líder que, durante meses, mostrou desdém por aqueles que cobrem o rosto para se proteger da Covid-19.

Ele ainda postou no Twitter um vídeo no qual incentivou os americanos a “sair” com “cuidado”, apesar do vírus, que matou mais de 200.000 pessoas no país.

“Não deixem que [o coronavírus] domine suas vidas, saiam, tenham cuidado”, disse Trump. “Agora estou melhor, talvez esteja imune, não sei”, acrescentou, referindo-se à sua hospitalização.

Também ao New York Times, o médico William Schaffner, infectologista da Universidade de Vanderbilt, no estado de Tennessee, chamou de “perigosa” a mensagem do presidente, por incentivar seus seguidores a ignorar as medidas básicas de prevenção da Covid-19, uma doença que pode levar à morte. “Isso levará a um comportamento mais despreocupado, que levará a mais transmissão do vírus, a mais doenças, e mais doentes levarão a mais mortes”, disse Schaffner.

O candidato democrata à Casa Branca, Joe Biden, criticou duramente seu adversário nas eleições de 3 de novembro.

“Vi um tuíte que ele publicou, me mostraram”, disse Biden ao canal de notícias Local 10, da Flórida, enquanto fazia campanha no estado-chave para uma vitória nas eleições. “Que diga isso às 205.000 famílias que perderam alguém.”

O democrata seguiu falando sobre a pandemia, durante evento ao ar livre em Miami, onde criticou Trump por ignorar o uso da máscara de proteção: “Espero que o presidente, depois de ter passado pelo que passou – e me alegro que ele pareça estar bastante bem – comunique a lição correta ao povo americano: as máscaras importam, salvam vidas, previnem a propagação da doença”.

A pandemia é uma das principais preocupações dos eleitores americanos, segundo pesquisas de opinião.

Tratamento na Casa Branca

O médico do presidente, Sean Conley, disse que o estado clínico de Trump permitia seu retorno à Casa Branca. “Ele se beneficiará de cuidados de ponta 24 horas por dia”, disse Conley, lembrando que o presidente usou alguns tratamentos experimentais. Trump recebeu um coquetel de anticorpos desenvolvido pela empresa farmacêutica americana Regeneron.

O presidente americano e sua esposa, Melania, foram diagnosticados positivos na quinta-feira 1. De acordo com Colley, ele teve febre, tosse e cansaço, mas no sábado já tinha melhorado. De acordo com a versão oficial, o presidente havia sido hospitalizado apenas por precaução.

No domingo 4, o médico acabou admitindo que o estado inicial de seu paciente era mais grave do que o que foi declarado oficialmente. Conley confirmou que Trump precisou de oxigênio na sexta-feira, durante uma hora, na Casa Branca.

Outro episódio de baixa saturação, um indicativo da forma grave da Covid-19, ocorreu no sábado de manhã. O presidente americano recebeu a dexametaosona, um corticóide eficaz contra formas graves da doença, além do antiviral Remdesivir e dos anticorpos exprimentais da Regeneron. O médico de Trump reconheceu que não revelou o incidente para proteger uma imagem “otimista” do presidente, que se encaixa no chamado grupo de risco: ele é homem, tem 74 anos, está acima do peso e é hipertenso.

Saída precipitada

Muitos especialistas questionam essa saída precipitada do hospital, mas a volta de Trump para casa está longe de ser um retorno à vida normal. Ele continuará confinado na Casa Branca e não poderá realizar comícios em Estados considerados fundamentais para sua vitória contra o candidato democrata, Joe Biden.

A Casa Branca, aliás, se tornou um verdadeiro foco de propagação do coronavírus. Além do presidente e da primeira-dama, sua conselheira Hope Hicks e outros membros da equipe, sua porta-voz, Kayleigh McEnany, anunciou nesta segunda-feira que também foi contaminada. Em várias ocasiões nos últimos dias, ela falou com o jornalistas sem máscara de proteção. Tais atitudes reforçam a imagem de que o Executivo “ignorou a gravidade da epidemia”, diz a imprensa americana.

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