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Notre-Dame: partidos dizem que doações mascaram fuga de impostos

Contribuições milionárias para a reconstrução da catedral em Paris já ultrapassam 850 milhões de euros

Incêndio da Notre Dame em Pairs. Foto: Thomas SAMSON/AFP
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Vários partidos denunciaram nesta quarta-feira 17 “o golpe de marketing” de grandes empresas e grandes fortunas que anunciam doações muito importantes para a reconstrução da Notre-Dame de Paris. Para alguns, trata-se de autopromoção de companhias que fogem dos impostos num país com problemas sociais urgentes.

“Não podemos fazer da preservação de nosso patrimônio uma grande operação de comunicação como alguns estão fazendo”, acusou no canal LCI Manon Aubry, principal candidata da lista da França Insubmissa (LFI) às eleições europeias em maio, denunciando “uma espécie de corrida das empresas para ver quem dá mais, enquanto reivindicam isenção fiscal”.

“Eu tenho a impressão de ver o ranking de empresas e de pessoas presentes nos paraísos fiscais”, disse ela, ironicamente.

 

“O mais simples seria se eles começassem por pagar seus impostos, eles não podem fazer uma operação de comunicação colocando seu nome em uma pedra da Notre-Dame e, do outro lado, não pagarem seus impostos “, criticou.

Diante de uma obra que se anuncia colossal, várias grandes fortunas francesas abriram seu talão de cheques desde segunda-feira: a família Pinault prometeu 100 milhões de euros, seguida pelo grupo LVMH e pela família Arnault, primeira fortuna da França, que anunciou uma doação de 200 milhões de euros. Depois a família Bettencourt-Meyers e o grupo L’Oréal, com 200 milhões.

“Catedral Humana”

Diante da controvérsia, a família Pinault anunciou em comunicado nesta quarta-feira que vai renunciar à sua redução de impostos.

O primeiro-ministro Edouard Philippe anunciou isenções adicionais para pessoas físicas de até 1.000 euros, enquanto “as empresas se beneficiarão de cortes de impostos, chamados de mecenato, sob as condições atuais”.

Desde a lei de 2003, empresas que investem em cultura podem deduzir 60% de seus gastos em prol do mecenato (para pessoas físicas, a redução é de 66% do imposto de renda).

Fabien Roussel, secretário nacional do Partido Comunista Francês (PCF), denunciou os “presentes fiscais múltiplos” que já beneficiam “os ricos da República”: “remoção do Imposto de Solidariedade sobre a Fortuna (ISF), aumento dos dividendos não tributados (57,4 bilhões de euros), fundos públicos desviados do seu propósito, brechas fiscais otimizadas… A decência exige que eles renunciem a esta oportunidade fiscal”.

“Que a oligarquia doe para Notre-Dame é bom. Mas ser um pagador de impostos exemplar seria ainda melhor. A boa consciência não esconde a miséria e a austeridade”, disse no Twitter Benjamin Cauchy, representante dos “coletes amarelos” na lista de Nicolas Dupont-Aignan (França de Pé), num espectro próximo da extrema direita, para as eleições europeias.

 

“Os bilionários vão se passar por heróis, eles fariam melhor em desistir da evasão e das brechas fiscais”, criticou a senadora Esther Benbassa, do Europa Ecologia Os Verdes (EELV), no Twitter, sonhando com “um impulso tão espontâneo e maciço para as associações e estruturas que se ocupam da pobreza extrema, da exclusão social, dos sem-abrigo”.

O primeiro secretário do Partido Socialista (PS), Olivier Faure, saudou “uma formidável mobilização para a Notre-Dame de Paris”. “Mas eu gostaria que houvesse uma mobilização equivalente para esses milhões de mulheres, homens, crianças, famílias que são todas uma catedral humana que também deve ser protegida”, disse ele.

O primeiro vice-presidente do Os Republicanos (LR), Guillaume Peltier, varreu a controvérsia com uma mão. “Seria bom se pudéssemos parar as brigas em vão nestes momentos importantes. Nós precisamos de todos”, disse ele.

O prefeito de Nice, Christian Estrosi (LR), também assumiu a defesa dos grandes doadores, no canal Cnews. “Eu não quero colocar o dedo na cara dos grandes, como algumas pessoas fazem, porque você vai notar que os grandes também são capitães da indústria, líderes empresariais, criadores de milhares de empregos em nosso país”, disse, referindo-se aos bilionários franceses.

Na tarde desta quarta-feira 17, as doações já ultrapassavam os 850 milhões de euros.

Na internet, circula desde a terça-feira uma piada sobre o assunto: “Victor Hugo agradece todos os generosos doadores prontos a salvar Notre-Dame de Paris e propõe que façam o mesmo com Os Miseráveis”.

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