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Ruth Ginsburg: uma representativa lembrança

Ministra da Suprema Corte estadunidense faleceu deixando um imenso legado para os direitos civis e teorias jurídicas progressistas

Ministra Ruth Ginsberg e o então presidente dos EUA Barack Obama.
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Na última sexta-feira, dia 18 de setembro de 2020, o mundo perdeu um ícone da luta pela igualdade: Ruth Bader Ginsburg.

A sua atuação tornou-se mundialmente conhecida em razão da prioridade dada à igualdade de gênero, tema que reverberou na sociedade estadunidense inicialmente como fruto do êxito da então advogada e, posteriormente, como sucesso da segunda juíza da Suprema Corte do país, nomeada por Bill Clinton em 1993.

Em um período de pandemia em que o mundo enfrenta não só as crises sanitária, econômica e social, mas também os polos de disseminação de erosão democrática, com as facetas de ascensão de populismo, discurso de ódio, disseminação das Fake News, desequilíbrio entre Poderes, antagonismos sociais, antipluralismo e majoritarianismo, a morte de RBG soma-se a mais um aspecto de perda democrática.

Sim. Não se trata “apenas” de uma jurista notável, mas da Notorious RBG. A notoriedade não é somente sua; é nossa também. Nossa não porque queiramos uma inserção na conjuntura em que se deu a sua ascensão na sociedade estadunidense e, de repente, lamentar a sua perda de forma compartilhada. Estamos a falar em “nosso” como representatividade e conquista.

Conquista jurídica, democrática, feminina, popular, plural. Originária do multiétnico bairro do Brooklyn, descendente de imigrantes judeus e formada juridicamente em centros de excelência em um período de grande discriminação da mulher, cujo acesso ao círculo jurídico – de educação e de exercício da profissão – ainda era formal e legalmente restrito, a sua presença em espaços dominados por uma elite branca tradicional e masculina, por si só, já simbolizou uma ato político-social.

E não é só:  a partir da sua admirável, sagaz e brilhante mente, Ruth Ginsburg fez com que o caráter excepcional da sua penetração nos ambientes de poder fosse revertido em prol dos coletivos vulnerabilizados. Teve experiência nos dois lados da bancada: foi advogada e magistrada da Suprema Corte. Vale acrescer: transitou da então periferia ao o centro; foi discriminada e combateu, com impecável eficiência, a discriminação.

Ruth Bader Ginsburg minorou os entraves historicamente construídos e delineou o perfil de uma nova sociedade por meio da igualdade de gênero.  Revelou a repercussão coletiva das legislações discriminatórias, que têm, certamente, consequências para todos. Ícone de uma era, pavimentou o caminho para a consolidação democrática através da progressividade dos direitos.

Em meio ao debate que se abre em torno da indicação de um novo nome para compor a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, Barack Obama, outro símbolo de que uma sociedade pode rever modelos e formar novos paradigmas, prestou homenagem à notória RBG em suas redes sociais, ilustrada por uma foto de ambos caminhando nos jardins Casa Branca.

Considero essa fotografia igualmente icônica. No ano do ressurgimento do debate racial nos Estados Unidos, no Brasil e no mundo, vê-se que ter um negro na Presidência da República foi um inegável avanço. Não cessou, porém, a necessidade de continuar a urgente agenda de busca por respeito, igualdade e conquista de espaços de poder, com a decorrente transformação econômica, social e política em favor da população negra.

No mesmo ano, perde-se Ruth Bader Ginsburg. Impensável esmorecer. A perspectiva de gênero deve, ressalte-se, ser mantida por uma luta ativa que não só modifique a realidade social, como também a jurídica, a ser alterada pela ocupação dos espaços jurídicos de poder e decisão.

Que os debates e as superações de barreiras discriminatórias prossigam, com rompimento de estereótipos nos Estados Unidos, no Brasil e no mundo. Que todos atuem de forma a consolidar tanto a campanha “vidas negras importam” (black lives matter) quanto a “mulheres juristas importam” (women jurists matter), a culminar, à luz da interseccionalidade, em: juristas negras importam (black women jurists matter).

Que a representatividade substantiva não seja só uma lembrança.

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