Justiça

Fachin ordena que governo retire Força Nacional de assentamentos do MST na Bahia

Ministro atendeu pedido de liminar feito pelo governador Rui Costa, que alegou violação ao princípio federativo

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na noite desta quinta-feira 17 que o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) retire em 48 horas o efetivo da Força Nacional enviado a dois municípios da Bahia.

Fachin atendeu a um pedido de liminar (decisão provisória) feito pelo governador do estado, Rui Costa, que alegou violação ao princípio federativo por não ter sido consultado antes do envio das tropas a dois assentamentos rurais nos municípios de Prado e Mucuri, no litoral sul da Bahia.

O emprego da Força Nacional fora autorizado em portaria publicada em 1º de setembro pelo MJSP. A medida estava prevista para durar até 2 de outubro, com possível prorrogação.

O objetivo alegado foi o de auxiliar o Ministério da Agricultura e o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) na garantia da segurança em assentamentos. O Movimento do Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) está presente na região.

Em sua decisão, Fachin concordou que o emprego da Força Nacional deveria ter sido realizado em articulação com o governo estadual. O ministro determinou a citação da Advocacia-Geral da União (AGU) para que se manifeste sobre a possível realização de uma audiência de conciliação sobre o assunto.

Entenda o caso

O governo federal autorizou o uso da Força Nacional em assentamentos da reforma agrária em dois municípios do estado da Bahia.

Segundo a publicação, a Força Nacional poderia ser empregada “nas atividades e nos serviços imprescindíveis à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. A decisão tem validade por 30 dias, entre 3 de setembro e 2 de outubro, com possibilidade de prorrogação.

MST relata que assentamento foi “surpreendido” com presença de policiais em 27 e 28 de agosto. Foto: Coletivo de Comunicação do MST da Bahia

A Força Nacional é uma espécie de tropa de “pronta-resposta”, composta por policiais militares, policiais civis, bombeiros militares e profissionais de perícia, com funções de cumprir policiamento ostensivo para “reduzir a violência, a criminalidade e a insegurança”. A permanência da equipe ocorre mediante delimitação de um período específico, em casos isolados.

O MJSP enviou 100 agentes da Força Nacional ao local. Segundo a publicação, o contingente a ser disponibilizado obedece ao planejamento definido pela Coordenação-Geral de Planejamento e Operações da Força Nacional, atendendo a pedidos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

A publicação ocorreu dias após ataques no assentamento Jacy Rocha, na cidade de Prado. Segundo o Ministério da Agricultura, oito pessoas ficaram feridas em uma ação ocorrida na madrugada de 28 de agosto. Casas foram destruídas e mais dois lotes, um trator e uma moto foram incendiados. O caso está sob investigação da Polícia Federal.

De acordo com o Ministério, a portaria visa “impedir que novos ataques aconteçam”.

“A meta do governo federal é garantir aos assentados da reforma agrária a titulação da terra onde vivem e produzem sem prejuízo no acesso às ações e benefícios específicos da reforma agrária. Com a posse definitiva do lote, os beneficiários terão direito a acessar todas as políticas públicas destinadas aos pequenos produtores rurais”, informou o Mapa.

A criação do assentamento Jacy Rocha foi noticiada em 30 de abril de 2015, pelo governo da Bahia. O espaço nasceu após a abertura das porteiras da Fazenda Colatina, quando agricultores familiares de Prado tomaram posse de cerca de quatro mil hectares de terra, onde foram assentadas 227 famílias.

A propriedade havia sido ocupada em abril de 2010, de acordo com o MST. A Fazenda Colatina era um antigo latifúndio de eucalipto.

Segundo o governo da Bahia, o Jacy Rocha foi o primeiro assentamento surgido após uma negociação entre o poder executivo estadual, movimentos sociais, empresas de celulose e o Incra. À época, tratava-se da primeira etapa de um processo de aquisição de terra e emissão de posse para a criação de assentamentos.

Ao longo dos anos, o espaço ganhou uma escola e abriu um projeto de agroecologia.

A previsão era disponibilizar 30 mil hectares no estado, pertencentes a empresas de celulose que operaram no local, a Suzano Papel e Celulose e a Fibria S/A. As companhias haviam ofertado a Fazenda Colatina e mais outras duas fazendas, segundo o governo da Bahia. De acordo com o MST, as companhias detinham, na época, 1 milhão de hectares.

No entanto, Jacy Rocha é hoje um dos nove assentamentos ameaçados nos dois municípios, cinco deles no Prado. Segundo o MST, apesar de os assentamentos terem avançado na legalização, ainda falta um documento que o Incra precisa ceder: o Contrato de Concessão de Uso (CCU), registro cedido às famílias que residem na área de reforma agrária, contendo cláusulas com direitos e obrigações.

O Incra diz que criou uma força-tarefa para acelerar o processo de titulação nos assentamentos desses dois municípios, mas o MST conta uma versão diferente. Segundo um integrante do MST da Bahia, que não quis se identificar, o Incra tem atuado para desmobilizar os acordos firmados com os assentamentos.

“O Incra, juntamente com as oligarquias da região, tem feito o contrário. Tem entrado nos assentamentos e falado que o título mudou, que eles vão conceder agora o TD, que é o Título Definitivo, que inclusive dá ao assentado o direito de vender a terra. Só que agora o Incra lançou um vídeo em suas plataformas falando que o título que eles estão dando é o de concessão de uso. Então, a gente percebe que eles estão criando um caos político dentro do assentamento”, afirmou. “Eles querem retomar o domínio político dos assentamentos.”

Em vídeo publicado nas redes sociais, o MST afirma que o governo do presidente Jair Bolsonaro tem utilizado a estrutura do Incra para intimidar assentamentos da reforma agrária.

O movimento também diz que há uma “quadrilha especializada” na Bahia que atua nesses espaços, possuindo informações e documentos que somente o Incra e o governo detêm. Os principais alvos seriam os assentamentos dos municípios de Prado, Mucuri, Iramaia e Vitória da Conquista, diz a organização.

Segundo o MST, essa quadrilha chega às áreas dos assentamentos e diz que todos têm direito a vender as terras. A intenção seria de, junto ao Incra, causar “desordem” entre as famílias.

“Ela [a quadrilha] está sendo financiada pelas oligarquias e pelos grandes fazendeiros”, diz vídeo publicado pelo MST na internet. “Em contrapartida, o Incra, que é o órgão que deveria zelar pelas áreas de reforma agrária, tem entrado nos assentamentos sem identificação, escoltados pela força policial pesada e sem qualquer diálogo com algum representante legal.”

(Com informações da Agência Brasil)

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