Justiça

Cármen Lúcia muda o voto e STF confirma: Moro é suspeito

‘Juiz que é favorável a um é desfavorável a outro’, declarou a ministra; ela ressaltou que a decisão se aplica apenas ao caso do triplex

O ex-presidente Lula e o ex-juiz Sergio Moro. Fotos: Ricardo Stuckert e Nelson Almeida/AFP
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A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal confirmou nesta terça-feira 23 a suspeição do ex-juiz Sergio Moro no caso do triplex do Guarujá. Por três votos a dois, o colegiado julgou procedente um habeas corpus apresentado pela defesa do ex-presidente Lula.

A análise do caso foi retomada após pedido de vista do ministro Kassio Nunes Marques, que se manifestou nesta terça contra o reconhecimento da suspeição, seguindo naquele momento os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia. Gilmar Mendes, presidente da Turma, e Ricardo Lewandowski já haviam votado no dia 9 de março a favor do HC.

Ao votar nesta terça em defesa de Moro, Kassio Nunes construiu maioria pela rejeição da suspeição. A reviravolta, entretanto, se deu graças à ministra Cármen Lúcia, que decidiu mudar o seu voto proferido em 2018, quando o julgamento foi iniciado. À época, antes de virem à tona os diálogos entre Moro e a força-tarefa da Lava Jato, a ministra rejeitou os argumentos pela suspeição do ex-juiz.  Após os votos de Cármen e Fachin em 2018, Gilmar pediu vista e adiou a conclusão da análise.

“O que se põe é algo que, para mim, é basilar: todo mundo tem direito a um julgamento justo, incluindo a imparcialidade do julgador”, disse Cármen Lúcia nesta terça ao justificar a mudança de posição. “Dados novos foram sendo introduzidos”, justificou.

A ministra ainda afirmou que “juiz que é favorável a um é desfavorável a outro” e ressaltou que seu entendimento se aplica apenas ao caso envolvendo o ex-presidente Lula e o triplex do Guarujá. “Estou levando em consideração algo que foi comprovado pelo impetrante. Essa peculiar e exclusiva situação desse paciente, Luiz Inácio Lula da Silva, faz com que me atenha à atuação do juiz processante no caso desse paciente”.

Embates

Ao votar contra o reconhecimento da suspeição de Moro, Kassio Nunes afirmou que “estranho seria que o juiz, num processo criminal, permanecesse completamente alheio e indiferente ao réu e, no final, tivesse de julgá-lo nesse estado de aponia intelectual e judicial”.

Na sequência, Gilmar Mendes, que já havia se manifestado pelo reconhecimento da suspeição, reforçou seus argumentos.

Ele se pronunciou logo após o voto de Kassio Nunes. Na reta final de seu discurso, o mais novo ministro da Corte disse que “todo magistrado tem a obrigação de ser garantista”.

Gilmar rebateu: “A juíza Fabiana Alves Rodrigues destaca o protagonismo das medidas de condução coercitiva que, pelo menos até antes das decisões do Supremo, eram utilizadas como programa de rotina para execração pública dos investigados ao arrepio da lei”, afirmou. “Isto, ministro Kássio, nada tem a ver com garantismo. Isto é uma indecência”.

“O uso recorrente da condução coercitiva, diz a juíza, para prestar depoimento sem prévia intimação tem por trás aparentemente a estratégia de constranger os investigados a prestar esclarecimentos”, completou Mendes.

Ricardo Lewandowski, que também já havia registrado seu voto na sessão anterior, reiterou sua posição nesta terça. “Assentei no meu voto que o habeas corpus é um remédio por excelência para reconhecer nulidades processuais. E a suspeição é uma nulidade absoluta, que não convalesce, e portanto não está sujeita à preclusão. Eu enfrentei esta questão apoiado em firme jurisprudência da Casa”, afirmou.

Outros votos

O primeiro ministro a votar no dia 9 de março foi Gilmar Mendes, que se manifestou pelo reconhecimento da suspeição de Moro, a quem se referiu como um “juiz acusador”.

Em seu voto, o presidente da Segunda Turma também criticou as “intenções espúrias da força-tarefa” da Lava Jato em Curitiba, comandada por Deltan Dallangol, e apontou um “conúbio vergonhoso que se estabeleceu entre a mídia e os procuradores e o juiz”. Para ele, a operação protagoniza “o maior escândalo judicial da história brasileira”.

O ministro lembrou que já apoiou a Lava Jato, porque “o combate à corrupção é digno de elogio, é fundamental”, mas ponderou “não se combate crime cometendo crime”.

“Infelizmente os órgãos de controle da magistratura nacional falharam em conter os primeiros arroubos de abusos do magistrado”, disse.

Mesmo com o pedido de vista de Kassio Nunes, Lewandowski decidiu proferir o seu voto, também a favor do reconhecimento da suspeição de Moro. Segundo ele, as mensagens trocadas entre procuradores da Lava Jato e obtidas pela Operação Spoofing são de “indiscutível utilidade para evidenciar ainda mais aquilo que já se mostrava óbvio, isto é, que o paciente [Lula] foi submetido não a um julgamento justo, segundo os cânones do devido processo legal, mas a um verdadeiro simulacro de ação penal, cuja nulidade salta aos olhos”.

Na avaliação de Lewandowski, houve uma “ilícita coordenação de esforços” para a produção conjunta de provas e estratégias processuais “desfavoráveis” ao ex-presidente.

A Segunda Turma iniciou a análise da suspeição de Moro em novembro de 2018. Naquela oportunidade, após os votos de Fachin e Cármen Lúcia contra o reconhecimento do HC, Gilmar Mendes pediu vista e adiou até este ano a sequência do julgamento.

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