Justiça

Mendonça interrompe julgamento de recursos nos inquéritos de Bolsonaro no STF, e Moraes divulga nota

Relator já havia votado para rejeitar todos os pedidos do presidente

Fotos: STF/Nelson Jr
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O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista e interrompeu o julgamento de 20 recursos apresentados contra quatro inquéritos que têm o presidente Jair Bolsonaro ou aliados como alvos. Antes dele, apenas o relator, o ministro Alexandre de Moraes, votou para negar todos os recursos, ou seja, para manter as investigações e outras decisões tomadas ao longo das apurações.

Assim, os quatro inquéritos — que apuram a participação do presidente no vazamento de dados sigilosos de uma investigação, uma “live” em que o presidente associou erroneamente a vacina da Covid-19 à aids, ataques ao STF, e a preparação dos atos do Sete de Setembro do ano passado — permanecem válidos. Não haverá, no entanto, por enquanto, a chancela dos demais ministros.

O julgamento ocorria no plenário virtual, em que os ministros votam pelo sistema eletrônico da Corte, sem se reunirem. Antes de sua interrupção, o prazo para a votação terminaria na sexta-feira da semana que vem. Não há previsão de retomada do julgamento, algo que depende agora de Mendonça.

Em nota divulgada depois dos pedidos de vista, Moraes divulgou a lista de todos os recursos, tanto nos inquéritos que são públicos, como nos sigilosos. O gabinete negou a informação de que tivesse pautado para julgamento “qualquer recurso contra decisão que determinou a análise e elaboração de relatório de material obtido a partir de determinação de quebra de sigilo telemático”.

Vazamento de dados

Um dos inquéritos foi aberto para apurar a participação do presidente no vazamento de informações sigilosas de uma outra investigação sobre um ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Embora essa apuração tenha concluído que as urnas eletrônicas não foram afetadas, Bolsonaro usou o episódio para tentar desacreditar o sistema de votação usado no Brasil.

Bolsonaro apresentou um recurso contra a abertura do inquérito que investiga o vazamento. O presidente também era contra o fato de a investigação ser tocada por Moraes, ministro com quem ele já teve vários atritos. Em geral, processos no STF têm seus relatores sorteados de forma eletrônica. Nesse caso, porém, o inquérito foi para Moraes, por ele ser o relator do chamado “inquérito das fake news”, que apura ataques à Corte.

“Não havendo dúvidas, portanto, de que a divulgação de dados de inquérito sigiloso da Polícia Federal pelo Presidente da República, através de perfis verificados nas redes sociais, teria o objetivo de expandir a narrativa fraudulenta que se estabelece contra o processo eleitoral brasileiro, com objetivo de tumultuá-lo, dificultá-lo, frustrá-lo ou impedi-lo, atribuindo-lhe, sem quaisquer provas ou indícios, caráter duvidoso acerca de sua lisura, revela-se imprescindível a adoção de medidas que elucidem os fatos investigados, especialmente no que diz respeito à divulgação de inquérito sigiloso, que contribui para a disseminação das notícias fraudulentas sobre as condutas dos Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral e contra o sistema de votação no Brasil, o encerramento da investigação, por ausência de justa causa, se revela absolutamente prematuro”, diz trecho do voto de Moraes.

Ele também disse que o recurso de Bolsonaro “não traz qualquer argumento apto a alterar a decisão”. Refutou ainda o argumento de que o inquérito deveria ser anulado por ter sido aberto sem ouvir antes a Procuradoria-Geral da República (PGR). Moraes, porém, citou trecho de parecer da própria PGR, segundo a qual, “embora inexistente pedido prévio da Procuradoria-Geral da República para a instauração do inquérito, vindo os autos este órgão ministerial não se opôs à instauração, tendo, aliás, indicado diligências investigativas diversas das já deferidas pelo Ministro Relator”.

Live da aids

Bolsonaro também é alvo de inquérito aberto apurar as declarações dadas em “live” em 21 de outubro de 2021, quando ele apontou uma ligação entre a vacinação contra a Covid-19 e o desenvolvimento da Aids, o que não é verdade. Essa investigação tem origem na CPI da Covid, que funcionou no Senado no ano passado. A PGR então recorreu, alegando que o inquérito não poderia ter sido aberto a pedido à CPI, e dizendo que deveria ter sido sorteado o relator, em vez de o caso ter ido automaticamente para Moraes.

O voto de Moraes foi curto. Ele argumentou que a PGR “não apresentou qualquer argumento minimamente apto a desconstituir entendimento da decisão”. Destacou também que “este inquérito está tramitando regularmente, tendo o seu prazo sido prorrogado por mais 60 (sessenta) dias por meio de despacho de 9/6/2022, de modo que deve se aguardar o decorrer das investigações para a análise das questões incidentais trazidas pela Procuradoria-Geral da República”.

Havia ainda um recurso de uma pessoa que queria ingressar como interessado no inquérito da “live” da aids, o que tinha sido negado por Moraes. O ministro votou agora para negar mais uma vez o pedido. Nesse caso, não houve pedido de vista de André Mendonça.

Inquérito das “fake news”

Havia ainda dez recursos contra decisões tomadas no inquérito das fake news. Alguns deles foram apresentados por aliados de Bolsonaro, como o empresário Luciano Hang, contra o bloqueio de perfis em redes sociais, e a deputada Bia Kicis (PL-DF), que queria levantar o sigilo dos autos. Também havia pedidos do Twitter e do Facebook contra o bloqueio de perfis de usuários. Moraes votou para negar todos, mais depois houve pedido de vista de Menonça.

Sete de Setembro

Moraes também votou para rejeitar oito recursos aberto para investigar a preparação dos atos de Sete de Setembro do ano passado. Entre os alvos estão alguns bolsonaristas, como o deputado Otoni de Paula (MDB-RJ), o cantor e ex-deputado, Sérgio Reis, e Marcos Antônio Pereira Gomes, conhecido como “Zé Trovão”.

Dos oito recursos, sete eram do Facebook, Twitter e Google contra o bloqueio de perfis. O outro era de Otoni de Paula, que também queria reverter o bloqueio nas redes sociais. André Mendonça pediu vista em todos.

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