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“Trump cumpriu promessa de colocar Washington de cabeça para baixo”

Para biógrafa de Trump, em seis meses o presidente só conseguiu bagunçar o governo, mostrando incapacidade de concluir qualquer coisa

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Por Michael Knigge

Em 20 de janeiro de 2017, Donald Trump e suas promessas polêmicas chegaram à Casa Branca. Passados seis meses, engana-se quem acha que o presidente mudará de estilo, afirma Gwenda Blair, professora de Jornalismo da Universidade de Columbia e autora de dois livros sobre Trump – Trumps: Three generations that built an empire (Trumps: três gerações que construíram um império) e Donald Trump: Master Apprentice (Donald Trump: aprendiz-mestre).

A escritora alerta que o presidente americano continuará fiel a seu estilo de controverso homem de negócios, apesar de, segundo ela, “não ter conseguido concluir nada” em seu primeiro semestre no poder.

“A única coisa que cumpriu é aquilo que prometeu, que iria fazer uma grande bagunça em Washington e colocar tudo de cabeça para baixo”, ressalta, acrescentando que a base do presidente não parece infeliz.

Deutsche Welle: O presidente Donald Trump está no cargo há seis meses e é justo dizer que esse foi um semestre bastante turbulento. Como seu biógrafo, a senhora tem um conhecimento mais profundo de Trump do que o público em geral. A senhora esperava que as coisas acontecessem da maneira que aconteceram ou os primeiros seis meses de Trump na presidência foram uma surpresa?

Gwenda Blair: Em uma palavra: não. Eu não digo que tenho uma bola de cristal, mas não acho que alguém precisava de uma. O tipo de proposta que ele fez foi que levaria sua experiência empresarial para a Casa Branca. E as pessoas pensavam que isso significava que ele iria usar isso em nome do país.

Acredito que ele tenha trazido sua experiência empresarial para a Casa Branca, mas ele a tem usado em seu nome. Ele tinha um negócio de construção de marca com fins lucrativos e agora fez da Casa Branca uma operação de construção de marca com fins lucrativos. E, desse modo, não acho que seja surpreendente.

DW: Uma característica marcante da presidência de Trump até agora é a confiança que ele deposita nos membros da família para conduzir a Casa Branca, de modo parecido com o que eles ajudaram a levar adiante a campanha do republicano. Seus laços estreitos com os membros da família têm causado problemas políticos e legais para Trump, mais recentemente quando foi revelado que seu filho se encontrou com uma advogada russa durante a campanha. Mas Trump até agora sempre defendeu a família. A senhora vê alguma coisa que possa fazer com que se distancie de seus familiares?

GB: Eu acho que essa poderia ser a única crise verdadeira para ele que venha a surgir em sua presidência. Ele achava que poderia administrar a Casa Branca e o país como um negócio. Em que você diz às pessoas para fazer as coisas, e elas fazem. Mas acontece que ele está enfrentando um Congresso com 535 pessoas que têm suas bases de poder próprias. Eu acho que isso foi e continua sendo um choque para ele.

Mas, considerando jogar alguém chamado Trump ou alguém casado com alguém chamado Trump para baixo de um ônibus – isso poderia ser uma verdadeira crise. Mas, até agora, eu não acho que, no que diz respeito a ele, tem havido qualquer crise. Ele move as metas e redefine os objetivos constantemente, por exemplo, no que diz respeito ao sistema de saúde, e diz: “Isso é o que eu quis dizer. Por que isso não é um sucesso?”

DW: Outra característica do começo de seu mandato é uma aparente falta de fortes convicções políticas, mesmo em questões cruciais, como alterações climáticas, saúde ou relações transatlânticas e, em vez disso, um foco em fazer negócios, mesmo sem resultados claros em mente e correndo risco de alienar parceiros e membros do gabinete. A senhora pode explicar esta característica de Trump?

GB: Ele passou a vida inteira sendo extremamente competitivo e absolutamente focado em vencer. Tudo o que importa é ganhar ou perder, e ele sempre irá ganhar. E se você não pode vencer de uma maneira, você vence de outra.

Logo no início de sua carreira, em seu primeiro grande projeto com seu nome, quando ele vendia condomínios na Trump Tower, em Nova York, ele ficou muito infeliz com o fato de que um modelo em escala do prédio da General Motors ao lado era mais alto do que a Trump Tower.

Então, ele queria fazer a Trump Tower mais alta no modelo em escala, mas a mulher responsável pelas vendas disse: “O senhor não tem permissão para fazer isso.” Então, o que ele fez foi tornar a outra construção mais baixa. Ele não podia fazer seu edifício mais alto, mas a outra construção mais baixa. Ele teve permissão para fazer isso. O que resume bem a forma como tudo é feito.

DW: Alguns de seus defensores argumentaram que Trump é um novato político e precisa de tempo para se adaptar a seu novo papel como presidente. Com Trump no cargo há seis meses, a senhora espera que ele mude de comportamento?

GB: Nem um pouco, nem um pouco. Um novato político? Ele tem 71 anos e tem sido um cidadão deste país por, creio eu, todos seus 71 anos. Todos nós aprendemos em aulas de educação cívica que há três ramos do governo, freios e contrapesos, e que você tem que tentar fazer acordos.

Mas isso não é o que ele fez nos seus negócios. Nos negócios, ele iria receber a pessoa na sala, obter o máximo que pudesse e deixar para ela o mínimo possível. Então, por que ele mudaria? Eu não vejo isso acontecendo.

Ele também tem uma base suficientemente grande e a única coisa que cumpriu é aquilo que prometeu, que iria fazer uma grande bagunça em Washington e colocar tudo de cabeça para baixo. A base dele não parece infeliz.

DW: Já que a senhora diz que devemos nos preparar, porque as coisas vão continuar da maneira que têm sido, qual o seu conselho sobre como lidar com o presidente Trump?

GB: Eu acho que a mídia e o país precisam manter duas coisas em mente. Sigam seus tuítes e suas distrações, porque eles têm que ser seguidos para serem respondidos, mas nunca tirem os olhos do restante que está acontecendo no Congresso, em outras partes do Executivo, e nunca percam o controle sobre estes. Ele não está chegando a lugar algum legislativamente, mas uma enorme quantidade de coisas está acontecendo em todo o resto do governo federal, que é muito grande.

DW: E, finalmente, se a senhora tivesse que nomear os três incidentes mais significativos durante os primeiros seis meses de Trump no cargo, quais seriam eles?

GB: No momento, algumas coisas que poderiam ser itens para um livro de história são a demissão de [James] Comey [ex-diretor do FBI], algo muito, muito impactante, e seu apoio insistente a figuras autocráticas, incluindo [o presidente russo, Vladimir] Putin principalmente, mas não apenas ele, além de sua incapacidade de concluir qualquer coisa.

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