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República Tcheca tem só 12 refugiados, mas medo de migrante domina eleição

Partidos populistas dominam o cenário político e a islamofobia é tema relevante na campanha legislativa

O partido do bilionário Andrej Babis é favorito nas eleições legislativas
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Imigrantes agridem uma aposentada tcheca e correm para um centro de assistência social. Assim começa um vídeo do partido Bloco Contra a Islamização, de extrema-direita, uma das siglas em disputa nas eleições legislativas da República Tcheca nesta sexta-feira 20 e sábado (21).

O vídeo termina dizendo: “Você escolhe: dar o dinheiro para nossos filhos e aposentados, ou para muçulmanos e africanos?”.

Dos 31 partidos que se apresentam, o Bloco Contra a Islamização não é o único que faz campanha sobre o tema. Do mesmo modo que a Frente Nacional na França, o AfD na Alemanha, o Partido da Liberdade na Áustria, ou Geert Wilders na Holanda, várias legendas tchecas usam o medo provocado pelas chegadas em massa de imigrantes à Europa.

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A imigração se tornou o assunto-chave da campanha tcheca apesar da quase ausência de imigrantes e de refugiados no país, que preferem ir para Alemanha, ou Suécia.

Com um presidente declaradamente antimuçulmano, a República Tcheca acolheu apenas 12 refugiados até agora, embora a União Europeia lhe tenha pedido que aceitasse cerca de 1,6 mil, de acordo com o sistema de cotas para distribuição dos migrantes.

Nada contra chineses

Para conquistar eleitores, muitos partidos usam em suas campanhas o medo do terrorismo, a ameaça islamista e o temor de perder a prosperidade econômica.

republica tcheca.jpg Protesto contra o presidente Milos Zeman em Praga, na terça-feira 17

“Isso não tem muito a ver com a realidade, porque, realmente, não há muitos imigrantes aqui”, diz o analista Jiri Pehe, entrevistado pela AFP.

De acordo com uma pesquisa feita em abril pelo instituto CVVM, da Academia Tcheca de Ciências, 60% dos tchecos são hostis à acolhida de migrantes. Apenas 3% são favoráveis.

“Precisamos de uma barreira contra a ideologia de ódio do islã”, afirma Tomas Erlich, um eleitor de Praga decidido a votar no partido anti-imigrantes “Liberdade e Democracia Direta” (SPD), do empresário Tomio Okamura, nascido em Tóquio. O Islã “é incompatível com a democracia, com a legislação e com os valores europeus. A experiência do Ocidente demonstra isso claramente”, insiste.

Tomas nega, porém, ser xenófobo, já que “não tem nada contra os chineses e os vietnamitas, inteligentes e que trabalham incrivelmente duro”.

O SPD teria 7,3% dos votos, segundo o CVVM, superando o limite de 5% para entrar na Câmara baixa, de 200 cadeiras.

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Conhecido na imprensa como o “Trump tcheco”, o magnata Andrej Babis, cujo movimento populista ANO seria o ganhador das legislativas – com 30,9% dos votos, de acordo com o CVVM –, também não esconde sua hostilidade em relação aos imigrantes.

Comércio do medo

“Quase não há imigrantes aqui, o país está atravessando um bom período do ponto de vista econômico e, apesar disso, as pessoas estão insatisfeitas, inclusive com raiva”, constata o analista Josef Mlejnek, da Universidade Carolina de Praga, ao ser questionado pela AFP.

“Eu me pergunto quais são as razões. Acho que é uma mistura de frustrações pessoais e de um problema geral”, sugere. “Por exemplo, Babis insiste em que a corrupção está por toda parte, e as pessoas começam a levar isso a sério”, completa.

O índice de desemprego na República Tcheca foi de 3,8% em setembro, seu nível mais baixo desde 1998. E o Banco Central prevê crescimento de 3,6% ao fim do exercício de 2017. “O cenário político tcheco degenerou, porém, no comércio do medo”, alerta Pehe.

*Leia mais na AFP

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