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Munique 1972: há 40 anos, a tragédia que transformou o mundo

Atentado inaugurou era do terrorismo em grandes eventos e arrastou a paranóia da segurança para o esporte

Foto: AFP
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Na madrugada de 5 de setembro de 1972, oito jovens palestinos vestidos como atletas  escalaram a cerca de um dos portões da Vila Olímpica de Munique. Foram vistos, mas não despertaram suspeitas. Acabaram confundidos com atletas voltando de alguma festa na cidade alemã, mesmo que trouxessem em suas mochilas esportivas granadas e rifles Kalashnikovs. Alguns minutos depois, fariam uma dezena de atletas israelenses reféns.

O barulho no corredor do apartamento acordou o árbrito de luta romana Yosef Gutfreund, que, ao perceber algo errado, tentou bloquear a porta. Foi tempo o bastante para o levantador de pesos Tuvia Sokolsky escapar por uma janela antes que o quarto fosse invadido. Neste momento, o técnico de luta romana Moshe Weinberg tentou se defender, mas foi baleado.

Os jovens palestinos foram a outros apartamentos e reuniram 12 reféns. Por volta das 5h da manhã, Weinberg, o levantador de pesos Yossi Romano e o lutador Gad Tsabari tentaram escapar. Apenas o último conseguiu. Os outros dois foram mortos pelos terroristas do grupo Setembro Negro, ligado à Organização para a Libertação da Palestina (OLP). A entidade defensora do Estado palestino havia aderido ao terrorismo, principalmente, após Israel vencer a Guerra dos Seis Dias (1967) e anexar ao seu território a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.

 

 

Iniciava-se ali, há exatos 40 anos, uma nova era para os Jogos Olímpicos modernos. A celebração do esporte passaria a dividir espaço com a preocupação com a segurança. O terrorismo havia encontrado o cenário ideal para atentados: um evento que reunia milhares de pessoas e despertava a atenção do mundo. “Munique inaugurou o uso de grandes eventos para o terrorismo, com um efeito potencializado em escala muito maior do que teria ocorrido se a ação fosse em Tel Aviv”, destaca Guilherme Casarões, professor de Relações Internacionais das Faculdades Integradas Rio Branco e da Fundação Getúlio Vargas. “A ação do Setembro Negro atingiu caráter universal, na medida em que um atentado contra os jogos colocou a causa palestina em evidência.”

Ironicamente, os organizadores daquels jogos pretendiam realizar um evento amigável, sem um policiamento ostensivo. No Parque Olímpico e no alojamento dos atletas, os seguranças portavam apenas rádios, megafones e lanternas, nada de armas. Algo impensável atualmente. “Nas Olimpíadas de Londres deste ano, ficou evidente a obsessão pela segurança, pois Munique é vista como o precedente que levou todos a se preocuparem com o problema”, diz Heloisa Helena Baldy dos Reis, especialista em segurança em eventos esportivos da Unicamp e enviada à capital britânica para pesquisar o tema. “Nestes 40 anos, o terrorismo se intensificou e evoluiu. Por isso, o serviço de inteligência trabalhou muito.”

Os mecanismos de controle também se tornaram rígidos a ponto de impedirem a entrada de atletas sem identificação na Vila Olímpica, como foi o caso do alemão Robert Harting, ouro no lançamento de disco em Londres. O atleta precisou dormir em uma estação de trem após ter sua credencial roubada por um fã depois de sagrar-se campeão olímpico. “Turistas reclamaram dos detectores de metal e raios X na vila e nas instalações londrinas”, relata Reis.

Um sistema que pareceria surreal no contexto preparatório de Munique. Aquela edição dos Jogos tinha ares de grandeza com investimentos de 800 milhões de dólares de uma Alemanha pós-guerra em busca de afirmação. O governo não poupou para criar instalações modernas e inovadoras, como um estádio com cobertura de plástico, uma Vila Olímpica com espaço para 12 mil pessoas e um centro de imprensa para 4 mil jornalistas.

Foi justamente a Vila que roubou a cena. Após os primeiros disparos contra os atletas isralenses, não demorou para que milhares de policiais cercassem os alojamentos e darem início às negociações. O Setembro Negro queria a libertação de 200 árabes presos em Israel e dos alemães Ulrike Meinhof e Andreas Baader, integrantes da Facção do Exército Vermelho detidos no país. Caso as exigências não fossem cumpridas até às 9h da manhã, os reféns morreriam.

O governo israelense da primeira-ministra Golda Meir se recusou a conversar com os palestinos e a negociação se estendeu até a noite. Os militantes pediram um avião para o Cairo, levando consigo os reféns. Foram atentidos pelos negociadores, que transportaram o grupo e os atletas em dois helicópteros para a base militar de Fürstenfeldbruck, a oeste de Munique. Lá, os terroristas deveriam ser rendidos pelas autoridades.

Os palestinos haviam terminado de inspecionar o avião que os levaria ao Egito quando a polícia alemã abriu fogo, mas não conseguiu imobilizar os oito militantes do Setembro Negro. Os oficiais estavam pouco preparados e não sabiam exatamente o número de pessoas armadas no grupo. Além disso, os helicópetos pousaram fora do local combinado, prejudicando a visão dos franco-atiradores.

Em meio à troca de tiros e com a chegada de reforços das forças alemãs, os palestinos lançaram uma granada em um dos helicópteros e abriram fogo contra o outro. Todos os nove reféns morreram, assim como o piloto de um dos equipamentos e um policial.

Os jogos ficaram suspensos por 34 horas e a delegação israelense se retirou em 7 de setembro com os corpos dos atletas mortos. Os jogos, contudo, continuaram após a insistência do então presidente do Comitê Olímpico Internacional Avery Brundage. Apesar da tragédia, o evento contou com a participação de mais de sete mil atletas de 122 países entre 26 de agosto e 11 de setembro. Entre eles, o nadador norte-americano Mark Spitz, vencedor de sete ouros em Munique. O recorde de maior número de vítorias em uma única edição das Olimpíadas foi superado apenas por Michael Phelps em Pequim 2008.

Negligência alemã?

A revista alemã Der Spiegel divulgou na última semana documentos oficiais a apontar que as autoridades do país ignoraram avisos explícitos sobre um ataque terrorista nos Jogos, além de tentarem encobrir o resultado e os erros dos envolvidos.

Segundo a publicação, em 14 de agosto de 1972 um oficial da embaixada alemã em Beirute, no Líbano, ouviu que “um incidente” causado por palestinos ocorreria nos jogos. Quatro dias depois, o Ministério das Relações Exteriores alertou a agência de inteligência da Bavária, estado onde fica Munique, recomendando a adoção de todas as medidas de segurança possíveis contra o eventual ataque. As agências de segurança, no entanto, nem sequer registraram os avisos publicados na imprensa internacional.

 

 

Em 7 de setembro, um dia após a cerimonia em memória das vítimas no estádio olímpico, ficou decidido que o governo da Alemanha Ocidental e o da Bavária não se acusariam ou realizariam uma autocritica de seus atos. Os governos adotaram também a descrição falsa de que os terroristas teriam agido com precisão, apesar de serem tão mal preparados que tiveram dificuldades em localizar os quartos dos alvos. Chegaram, inclusive, a errar o andar dos apartamentos.

Esses detalhes não foram mencionados ao público, assim como uma investigação de procuradores do estado da Bavária contra o chefe da polícia Manfred Schreiber e o chefe de operação por suspeita de negligência e homicídio culposo. “Os documentos mostram com clareza que o combate ao terrorismo sempre exigiu um tipo de preparo muito especifico que ninguém possui”, afirma Casarões.

A trama seria, no entato, ainda mais densa. Wolfgang Abramowski e Willi Pohl, dois neonazistas presos no final daquele ano, tinham uma carta com uma ameaça a um juiz responsável pelo caso dos três palestinos que sobreviveram ao ataque. O documento alertava o magistrado sobre possíveis retaliações do Setembro Negro caso ele continuasse a permitir agentes da inteligência de Israel a participar dos interrogatórios dos terroristas.

Um relatório da policia de Munique de julho de 1973 indica que as armas com as quais haviam sido detidos tinham as mesmas características das utilizadas pelos militantes. Mas eles estavam sob o radar das autoridades muito antes da prisão. Dois meses antes do ataque, a polícia de Dortmund enviou informações ao serviço de inteligência estrangeira alemã dizendo haver suposta atividade conspirativa por terroristas palestinos. O aviso discutia o relacionamento de Pohl e Mohammed Daoud, Abu Daoud, idealizador dos ataques, que se reuniu livremente com militantes em um hotel de Munique sem a interferência da polícia.

Pohl ajudou Daoud a comprar diversas Mercedes sedãs em Dortmund, apresentou o terrorista a um falsificador de passaportes (Abramowski) e levou o homem pela Alemanha para se encontrar com palestinos. Depois, ainda ficou em Beirute com Abramowski, que falsificou passaportes do Kwait e Líbano, mudou nomes de documentos americanos e franceses e trocou fotos de passaportes para o grupo. Esses documentos permitiram a entrada dos oito palestinos na Alemanha.

A essa altura, ambos alegaram não saber dos planos para os ataques, mas com a proximidade dos jogos foram consultados sobre a ação. Com a falha da ação, os chefes do grupo no Oriente Médio pretendiam se vingar da interferência alemã e chegaram a planejar o sequestro de políticos locais por todo o país, com a ajuda de Pohl e Abramowski. Planos que não se concretizaram devido à prisão da dupla.

Mesmo com tantos elementos os ligando ao Setembro Negro, foram condenados em 1974 apenas por porte ilegal de armas de fogo. Abramowski recebeu uma pena de oito meses de prisão e Pohl, um pouco mais de dois anos, embora tenha sido solto – sem explicações – quatro dias depois de condenado.

O grupo por trás do atentado nas Olimpíadas ainda conseguiu resgatar os três sobreviventes ao sequestrar um avião alemão da Lufthansa com destino a Frankfurt. Para obtê-lo de volta, o governo alemão não hesitou em enviar o trio à Líbia. “Há quem diga que o sequestro foi uma armação para a Alemanha se livrar do custoso peso político do processo contra os acusados, que a obrigaria a tomar partido de um dos lados envolvidos”, destaca o professor da FGV. Além disso, o país poderia se tornar alvo de novos ataques caso não cedesse. “A Alemanha se apressou em evitar isso, mandando o mais rápido possível esses militantes embora.”

A vingança 

Após a operação de resgate das autoridades alemãs ter resultado na morte dos 11 atletas, o governo israelene criou um grupo para investigar o caso e a premier Golda Meir ordenou uma vingança. O objetivo era eliminar os membros do Setembro Negro com relação direta e indireta ao atentado, além de suas lideranças principais em uma lista com dezenas de nomes.

Assassinos profissionais do Mossad, serviço de inteligência de Israel, comandaram a operação “Ira de Deus”, que em sete anos e cinco meses matou terroristas palestinos na Itália, França, Chipre, Grécia, Líbano e Noruega.

Em 22 de janeiro de 1981, a operaçào terminou com a morte de Ali Hasan Salameh, um dos mais importantes chefes do grupo. O governo nunca admitiu a sua existência, mas com o fim da ação um ex-agente do Mossad confirmou publicamente a realização dos assassinatos. O mentor do ataque, Abu Daoud, não foi morto. A saga da vingança israelense foi contada no filme Munique, de Steven Spielberg.

Na madrugada de 5 de setembro de 1972, oito jovens palestinos vestidos como atletas  escalaram a cerca de um dos portões da Vila Olímpica de Munique. Foram vistos, mas não despertaram suspeitas. Acabaram confundidos com atletas voltando de alguma festa na cidade alemã, mesmo que trouxessem em suas mochilas esportivas granadas e rifles Kalashnikovs. Alguns minutos depois, fariam uma dezena de atletas israelenses reféns.

O barulho no corredor do apartamento acordou o árbrito de luta romana Yosef Gutfreund, que, ao perceber algo errado, tentou bloquear a porta. Foi tempo o bastante para o levantador de pesos Tuvia Sokolsky escapar por uma janela antes que o quarto fosse invadido. Neste momento, o técnico de luta romana Moshe Weinberg tentou se defender, mas foi baleado.

Os jovens palestinos foram a outros apartamentos e reuniram 12 reféns. Por volta das 5h da manhã, Weinberg, o levantador de pesos Yossi Romano e o lutador Gad Tsabari tentaram escapar. Apenas o último conseguiu. Os outros dois foram mortos pelos terroristas do grupo Setembro Negro, ligado à Organização para a Libertação da Palestina (OLP). A entidade defensora do Estado palestino havia aderido ao terrorismo, principalmente, após Israel vencer a Guerra dos Seis Dias (1967) e anexar ao seu território a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.

 

 

Iniciava-se ali, há exatos 40 anos, uma nova era para os Jogos Olímpicos modernos. A celebração do esporte passaria a dividir espaço com a preocupação com a segurança. O terrorismo havia encontrado o cenário ideal para atentados: um evento que reunia milhares de pessoas e despertava a atenção do mundo. “Munique inaugurou o uso de grandes eventos para o terrorismo, com um efeito potencializado em escala muito maior do que teria ocorrido se a ação fosse em Tel Aviv”, destaca Guilherme Casarões, professor de Relações Internacionais das Faculdades Integradas Rio Branco e da Fundação Getúlio Vargas. “A ação do Setembro Negro atingiu caráter universal, na medida em que um atentado contra os jogos colocou a causa palestina em evidência.”

Ironicamente, os organizadores daquels jogos pretendiam realizar um evento amigável, sem um policiamento ostensivo. No Parque Olímpico e no alojamento dos atletas, os seguranças portavam apenas rádios, megafones e lanternas, nada de armas. Algo impensável atualmente. “Nas Olimpíadas de Londres deste ano, ficou evidente a obsessão pela segurança, pois Munique é vista como o precedente que levou todos a se preocuparem com o problema”, diz Heloisa Helena Baldy dos Reis, especialista em segurança em eventos esportivos da Unicamp e enviada à capital britânica para pesquisar o tema. “Nestes 40 anos, o terrorismo se intensificou e evoluiu. Por isso, o serviço de inteligência trabalhou muito.”

Os mecanismos de controle também se tornaram rígidos a ponto de impedirem a entrada de atletas sem identificação na Vila Olímpica, como foi o caso do alemão Robert Harting, ouro no lançamento de disco em Londres. O atleta precisou dormir em uma estação de trem após ter sua credencial roubada por um fã depois de sagrar-se campeão olímpico. “Turistas reclamaram dos detectores de metal e raios X na vila e nas instalações londrinas”, relata Reis.

Um sistema que pareceria surreal no contexto preparatório de Munique. Aquela edição dos Jogos tinha ares de grandeza com investimentos de 800 milhões de dólares de uma Alemanha pós-guerra em busca de afirmação. O governo não poupou para criar instalações modernas e inovadoras, como um estádio com cobertura de plástico, uma Vila Olímpica com espaço para 12 mil pessoas e um centro de imprensa para 4 mil jornalistas.

Foi justamente a Vila que roubou a cena. Após os primeiros disparos contra os atletas isralenses, não demorou para que milhares de policiais cercassem os alojamentos e darem início às negociações. O Setembro Negro queria a libertação de 200 árabes presos em Israel e dos alemães Ulrike Meinhof e Andreas Baader, integrantes da Facção do Exército Vermelho detidos no país. Caso as exigências não fossem cumpridas até às 9h da manhã, os reféns morreriam.

O governo israelense da primeira-ministra Golda Meir se recusou a conversar com os palestinos e a negociação se estendeu até a noite. Os militantes pediram um avião para o Cairo, levando consigo os reféns. Foram atentidos pelos negociadores, que transportaram o grupo e os atletas em dois helicópteros para a base militar de Fürstenfeldbruck, a oeste de Munique. Lá, os terroristas deveriam ser rendidos pelas autoridades.

Os palestinos haviam terminado de inspecionar o avião que os levaria ao Egito quando a polícia alemã abriu fogo, mas não conseguiu imobilizar os oito militantes do Setembro Negro. Os oficiais estavam pouco preparados e não sabiam exatamente o número de pessoas armadas no grupo. Além disso, os helicópetos pousaram fora do local combinado, prejudicando a visão dos franco-atiradores.

Em meio à troca de tiros e com a chegada de reforços das forças alemãs, os palestinos lançaram uma granada em um dos helicópteros e abriram fogo contra o outro. Todos os nove reféns morreram, assim como o piloto de um dos equipamentos e um policial.

Os jogos ficaram suspensos por 34 horas e a delegação israelense se retirou em 7 de setembro com os corpos dos atletas mortos. Os jogos, contudo, continuaram após a insistência do então presidente do Comitê Olímpico Internacional Avery Brundage. Apesar da tragédia, o evento contou com a participação de mais de sete mil atletas de 122 países entre 26 de agosto e 11 de setembro. Entre eles, o nadador norte-americano Mark Spitz, vencedor de sete ouros em Munique. O recorde de maior número de vítorias em uma única edição das Olimpíadas foi superado apenas por Michael Phelps em Pequim 2008.

Negligência alemã?

A revista alemã Der Spiegel divulgou na última semana documentos oficiais a apontar que as autoridades do país ignoraram avisos explícitos sobre um ataque terrorista nos Jogos, além de tentarem encobrir o resultado e os erros dos envolvidos.

Segundo a publicação, em 14 de agosto de 1972 um oficial da embaixada alemã em Beirute, no Líbano, ouviu que “um incidente” causado por palestinos ocorreria nos jogos. Quatro dias depois, o Ministério das Relações Exteriores alertou a agência de inteligência da Bavária, estado onde fica Munique, recomendando a adoção de todas as medidas de segurança possíveis contra o eventual ataque. As agências de segurança, no entanto, nem sequer registraram os avisos publicados na imprensa internacional.

 

 

Em 7 de setembro, um dia após a cerimonia em memória das vítimas no estádio olímpico, ficou decidido que o governo da Alemanha Ocidental e o da Bavária não se acusariam ou realizariam uma autocritica de seus atos. Os governos adotaram também a descrição falsa de que os terroristas teriam agido com precisão, apesar de serem tão mal preparados que tiveram dificuldades em localizar os quartos dos alvos. Chegaram, inclusive, a errar o andar dos apartamentos.

Esses detalhes não foram mencionados ao público, assim como uma investigação de procuradores do estado da Bavária contra o chefe da polícia Manfred Schreiber e o chefe de operação por suspeita de negligência e homicídio culposo. “Os documentos mostram com clareza que o combate ao terrorismo sempre exigiu um tipo de preparo muito especifico que ninguém possui”, afirma Casarões.

A trama seria, no entato, ainda mais densa. Wolfgang Abramowski e Willi Pohl, dois neonazistas presos no final daquele ano, tinham uma carta com uma ameaça a um juiz responsável pelo caso dos três palestinos que sobreviveram ao ataque. O documento alertava o magistrado sobre possíveis retaliações do Setembro Negro caso ele continuasse a permitir agentes da inteligência de Israel a participar dos interrogatórios dos terroristas.

Um relatório da policia de Munique de julho de 1973 indica que as armas com as quais haviam sido detidos tinham as mesmas características das utilizadas pelos militantes. Mas eles estavam sob o radar das autoridades muito antes da prisão. Dois meses antes do ataque, a polícia de Dortmund enviou informações ao serviço de inteligência estrangeira alemã dizendo haver suposta atividade conspirativa por terroristas palestinos. O aviso discutia o relacionamento de Pohl e Mohammed Daoud, Abu Daoud, idealizador dos ataques, que se reuniu livremente com militantes em um hotel de Munique sem a interferência da polícia.

Pohl ajudou Daoud a comprar diversas Mercedes sedãs em Dortmund, apresentou o terrorista a um falsificador de passaportes (Abramowski) e levou o homem pela Alemanha para se encontrar com palestinos. Depois, ainda ficou em Beirute com Abramowski, que falsificou passaportes do Kwait e Líbano, mudou nomes de documentos americanos e franceses e trocou fotos de passaportes para o grupo. Esses documentos permitiram a entrada dos oito palestinos na Alemanha.

A essa altura, ambos alegaram não saber dos planos para os ataques, mas com a proximidade dos jogos foram consultados sobre a ação. Com a falha da ação, os chefes do grupo no Oriente Médio pretendiam se vingar da interferência alemã e chegaram a planejar o sequestro de políticos locais por todo o país, com a ajuda de Pohl e Abramowski. Planos que não se concretizaram devido à prisão da dupla.

Mesmo com tantos elementos os ligando ao Setembro Negro, foram condenados em 1974 apenas por porte ilegal de armas de fogo. Abramowski recebeu uma pena de oito meses de prisão e Pohl, um pouco mais de dois anos, embora tenha sido solto – sem explicações – quatro dias depois de condenado.

O grupo por trás do atentado nas Olimpíadas ainda conseguiu resgatar os três sobreviventes ao sequestrar um avião alemão da Lufthansa com destino a Frankfurt. Para obtê-lo de volta, o governo alemão não hesitou em enviar o trio à Líbia. “Há quem diga que o sequestro foi uma armação para a Alemanha se livrar do custoso peso político do processo contra os acusados, que a obrigaria a tomar partido de um dos lados envolvidos”, destaca o professor da FGV. Além disso, o país poderia se tornar alvo de novos ataques caso não cedesse. “A Alemanha se apressou em evitar isso, mandando o mais rápido possível esses militantes embora.”

A vingança 

Após a operação de resgate das autoridades alemãs ter resultado na morte dos 11 atletas, o governo israelene criou um grupo para investigar o caso e a premier Golda Meir ordenou uma vingança. O objetivo era eliminar os membros do Setembro Negro com relação direta e indireta ao atentado, além de suas lideranças principais em uma lista com dezenas de nomes.

Assassinos profissionais do Mossad, serviço de inteligência de Israel, comandaram a operação “Ira de Deus”, que em sete anos e cinco meses matou terroristas palestinos na Itália, França, Chipre, Grécia, Líbano e Noruega.

Em 22 de janeiro de 1981, a operaçào terminou com a morte de Ali Hasan Salameh, um dos mais importantes chefes do grupo. O governo nunca admitiu a sua existência, mas com o fim da ação um ex-agente do Mossad confirmou publicamente a realização dos assassinatos. O mentor do ataque, Abu Daoud, não foi morto. A saga da vingança israelense foi contada no filme Munique, de Steven Spielberg.

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