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França freia a extrema-direita, mas suas ideias prosperam

Derrota de Le Pen contrariou as ambições dos nacionalistas de “virar a mesa” na Europa, mas extrema-direita está estabelecida na política continental.

Ruas de Paris respiraram aliviadas com resultado das eleições francesas. Mas a extrema-direita precisa vencer eleições? Não necessariamente.
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Depois da Áustria e da Holanda, a extrema-direita perdeu sua aposta nas eleições presidenciais francesas, aplacando os temores do auge dos partidos nacionalistas na Europa, sem, no entanto, frear a propagação de suas ideias.

A derrota de Marine Le Pen contrariou as ambições dos nacionalistas de “virar a mesa” na Europa, mas esta extrema-direita, travada nas urnas, está firmemente estabelecida na cena política continental.

Os partidos de extrema-direita europeus previam uma série de sucessos eleitorais em 2017, impulsionados pelo Brexit na Grã Bretanha e a eleição de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos. Mas a teoria do dominó – que deveria levar seus representantes ao poder na Áustria, depois na Holanda e na França – foi novamente desmentida no domingo à noite com o fracasso da Frente Nacional contra o centrista pró-europeu Emmanuel Macron.

O alívio era evidente na segunda-feira 8 na imprensa europeia. Até mesmo um maior otimismo, de acordo com o jornal britânico The Times, de que “o populismo atingiu o seu ponto mais alto” após o segundo lugar do Partido para a Liberdade (PVV) de Geert Wilders nas eleições legislativas holandesas em março e a derrota do candidato da extrema-direita do FPO à presidência austríaca, em dezembro.

O chanceler social-democrata austríaco Christian Kern saudou “uma vitória” na estratégia de reconquista dos pró-europeus contra as direitas radicais e anti-UE. O “fim” desta corrida de obstáculos eleitoral está prevista para as legislativas em 24 de setembro na Alemanha, onde os populistas da AfD, que cresceram consideravelmente nas pesquisas em 2016, têm registrado um declínio desde janeiro.

Mas a extrema-direita precisa vencer eleições? Não necessariamente, aponta o analista Carsten Nickel do grupo de reflexão Teneo em Bruxelas. “Eles não exercem a sua influência sobre o governo, mas colocam pressão sobre a margem de manobra dos partidos centristas e principalmente, de centro-direita”, diz ele.

“Muitas vezes, nos países europeus, a direita dedica mais espaço ao nacionalismo, de modo que os nacionalistas têm mais dificuldade para avançar”, indica o analista político francês Stéphane Rozès, presidente do conselho Cap. Ele conclui, a partir desta evolução, que o “nacionalismo e o populismo não estão, de maneira alguma, em declínio na Europa “.

Impregnação cultural

A FN obteve um terço a mais dos votos desde a última eleição presidencial, apesar do péssimo debate entre os dois turnos para Marine Le Pen”, lembra ele.

Geert Wilders conquistou cinco assentos a mais em relação às eleições anteriores em 2012. O candidato do FPO austríaco atraiu quase um a cada dois eleitores no segundo turno da eleição presidencial (46%), quando os partidos tradicionais social-democrata e conservador foram eliminados. “Você vai vencer da próxima vez – e eu também”, tuítou no domingo Wilders ao seu aliado.

Os 34% dos votos recolhidos por Marine Le Pen marcam “uma normalização da escolha da extrema-direita na sociedade francesa”, segundo o historiador Nicolas Lebourg, entrevistado pelo jornal francês Libération, que fala de uma “infiltração cultural”.

Em vez de uma ambição muitas vezes apresentada pelos partidos de extrema-direita de “virar a mesa” do jogo político tradicional, é uma “política de pequenos passos” que se desenha, segundo o analista Josef Janning do think tank europeu ECFR em Berlim.

“Em vez de um big bang que seria ver um partido de extrema-direita ganhar uma eleição, marcando o fim da Europa, o risco é de um declínio lento e regular das forças centristas se nenhuma resposta for dada” às expectativas dos eleitores, concorda Nickel.

A maioria dos editorialistas europeus enfatizam a responsabilidade que pesa sobre os ombros de Emmanuel Macron: “Macron tem cinco anos para limpar as ideias extremistas”, estima o jornal espanhol El Pais.

“Macron deve mostrar aos franceses, que é efetivamente a alternativa que eles esperavam. Se for incapaz, Le Pen, ela ou outra Le Pen, estará à espreita”, considera o Times.

Mas a pressão também é grande sobre a patrona da extrema-direita francesa, cujo partido “mostrou suas fraquezas”, afirma Lebourg, apontando para certa confusão ideológica e estratégica.

Isso explica, de acordo com Josef Janning, o anúncio por Marine Le Pen, na noite de domingo, de uma “profunda transformação” da Frente Nacional: “ela entendeu que não pode pagar outra grande derrota e procurará morder o espaço dos conservadores, porque se quer ser uma força política a longo prazo, deve sair do seu isolamento”.

 

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